que são todos os delitos
da humanidade
expiro todo dia
uma poesia de saudade
ou um poema de lembrança
ou um soneto
de sofredor preto
e não quero beleza
pois minha história
não é bela
é de senzala
é de favela
bebi o sangue
derramado no pelourinho
desprezei o suor
dos negros que me deram
a sobrevivência
apaguei as marcas dos ferros
as equimoses das chibatas
as pegadas nas pedras dos cais
e as cicatrizes dos relhos
joguei purpurina
e lancei confete
e serpentina
e fiz um samba na surdina
sem o canto do banto
sem o tom do tambor
sem o dengue nagô
e aonde vou não arrasto
as correntes dos porões
dos navios negreiros
e esqueço cada lágrima
que fugiu d'áfrica
e esqueço cada gota de sangue
que o continente jorrou
nessa histórica hemorragia infinita
para saciar o ocidente
suas realezas
suas burguesias
suas elites
e curvo com o peso
desses meus delitos
que são os meus conflitos
BH, 02201002021; Publicado: BH, 020902022.
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