Se tivesse de me acontecer a minha escrita universal
Já teria acontecido e pelo tempo de vida vívido
Não precisaria passar os meus últimos dias de vivência
A esperar que a escritura universal venha me encontrar
E não pararei de sonhar pois não posso morrer
Sem concluir meu epitáfio e sem compor o meu réquiem
Ou sem lavrar o meu testamento e inventário
E não posso ser encomendado de mãos vazias
E não deixar nada para que falem de mim no velório
E algo preciso deixar como um fidalgo e
Pelo menos um escrito e nem que seja uma linha
Numa língua estranha ou de anjo ou extinta
Ou um verso ou uma estrofe de deboche
E qualquer coisa serve para encher as bocas
Das carpideiras e dos foxiqueiros e dos fofoqueiros
Que dão em qualquer enterro e com urgência
E mesmo sem ter me aperfeiçoado e sem deixar
De ser um abestado quero lavrar meu atestado
Com todas as causas mortis para que sejam
Motivos de ladainhas e de rezas e de preces e orações
E choros pelos cantos e já nem tenho mais certezas
E só dúvidas e desilusões e o final do filme
É sempre assim uma decadência melancólica
E sem elegância e é uma bancarrota escrota de roto
E esfarrapado e coberto de andrajos na
Única certeza que resta ao resto mortal.
BH, 090402020; Publicado: BH, 0270502022.
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