sexta-feira, 23 de julho de 2021

Chega aqui amor; RJ/1977; Publicado: BH, 0230702021.

Chega aqui amor
Vem para junto de mim
Dá-me tua mão
Dá-me o teu braço
Vem-me abraçar
Chega aqui meu bem
Com o que é bom para mim
Dá-me tua boca
Vem-me beijar
Dá-me teu  amor
Vem-me amar
Não consigo mais suportar
Essa tua demora
Não tens relógio
Por isso esqueces da hora
E esqueces de mim
E essa ideia que tens
De te esquecer de mim
Não pressinto coisa normal
E fico até sentido
E acabrunhado se demoras
E não imploras o meu amor
Mas imploro o meu bocado
E és o meu bocado
Meu bocado de amor
Meu bocado de paz
Meu bocado de céu
Meu bocado de sol
E és o meu bocado
Meu bocado de tudo
E o meu bocado de nada
Chega aqui meu amor
Vem-me envolver
Vem-me conhecer
Farei o possível
E o impossível
Para não decepcionar
Sou ainda um amador
Faço amor
Mas não sei de tudo amor.

O cara quando é louco; RJ/1977; Publicado: BH, 0230702021.

O cara quando é louco
Escreve e diz coisas
Que nem sabe explicar
O que foi que escreveu
Ou o que foi que falou
E é o que está a acontecer
Comigo que escrevo e
Digo cada uma que só
Pode vir da minha mente
Louca ou minha mente
Insana e sem mente e
Semente que mente e
Não tenho mente pois
Sou um demente cuja
Demência gera o cara
Que quando é louco é
Como sou e vive só sós
Encurralado preso e
Amarrado e morto e
Vivo-morto e a escrever
Porcarias e loucuras a
Passar nas páginas do
Céu azul e a pôr pelas
Narinas o ar poluído e
Venoso e a expelir gazes
E líquidos e sebos e
Ceras e seborreias e
Urinas e fezes e catarros
À toda hora pois o cara
Quando é louco não 
Pensa e não penso e não
Vejo nada e nem sinto
Nada e o cara quando é
Louco é assim igual a
Mim é assim igual sou
Que é um cara quando
Louco ou com hidrofobia
E bicho hidrofobo com
Todo tipo de fobia e todo
Tipo de loucura e todo
Tipo de maluquice e todo
Tipo de doidisse e todo
Tipo de tudo e todo tipo de
Todo e todo tipo de quando 
O cara é louco mesmo só.

Amanhã é dia de festa; RJ/1977; Publicado: BH, 0230702021.

Amanhã é dia de festa
Dia de sonho de poeta
Pois é o dia
De teu aniversário
Amanhã é feriado municipal
Feriado estadual
E feriado nacional
E dia de graça mundial
Como um dia de natal
E um dia de benção universal
Amanhã é o dia do aniversário
De meu amor
Ninguém vai trabalhar
Ninguém vai fazer nada
Vai todo mundo
Bater palmas
Por quarenta e oito horas
E cantar parabéns
Em todas as línguas
E idiomas e dialetos
Conhecidos e desconhecidos
Amanhã é dia de festa
Dia de sonho de poeta
Amanhã é dia de confraternização
É o aniversário da minha mulher
Vou sair pela rua a fora
A avisar a todo mundo
Que amanhã é dia de alegria
Em todas as nações
É o aniversário da minha amada
A festa vai ser em meu coração
A entrada é franca
Não precisa convite
Não precisa nada
Vão ser servidos
Muito amor e paz
Regados a carinho
Com bolos de sorrisos
E coquetéis de alegrias
O traje pode ser sincero
Todo mundo está convidado
Pode chegar quem quiser
Amanhã é dia de festa
Dia de sonho de poeta
Dia de cantar e beber e amar
É o aniversário do meu amor
E está muito feliz
Imagina eu que sou o homem dela.

quinta-feira, 22 de julho de 2021

Meu amor onde estás; RJ/1977; Publicado: BH, 0229702021.

Meu amor onde estás
O que foi que aconteceu
Voltes para mim
E não me deixes mais
E não me deixes morrer não
Perdoes minhas faltas
E não escondas o rosto
Do meu rosto
Olhes para os meus olhos
Beijes minha boca
Segures minhas mãos
Estou para cair
E me ampares por favor
E me ajudes a viver
E me dês fôlego
E resistência espiritual
E me dês coragem
E disposição para pensar
E ânimo para enfrentar a vida sem ti
Meu amor
Onde estás agora
Porque te escondes
Tens medo de mim
Sou só um ser humano
Um homem comum
Acredito no amor
Acredito na paz
E na natureza
Meu amor
Tenhas pena de mim
E me dês nova chance
E um novo lance
Quero te alegrar
Quero te exaltar
Quero te adorar num altar
Dês me teu amor.

Boa-tarde tarde de verão; RJ/1977; Publicado: BH, 0220702021.

Boa-tarde tarde de verão
Quero ver a tarde chegar
Quero ver o céu se abrir
Quero ver o sol preguiçoso da tarde
Bela tarde linda de verão
A barriga cheia de farinha com feijão
Tomei água da cacimba
Que estava na moringa
E fui deitar à sombra da árvore
No fundo do quintal
Na maior safadeza
De barriga para cima
A fitar como se fosse um paxá
O azul do infinito
A querer me arrebatar
Mas é uma pena
Não poder pertencer
A tão anil azul azulão
Quero ver essa tarde sempre assim
A impressionar o meu coração
O que muito me faz bem
O que muito me deixa safado
E à toa na vida
Ainda mais à sombra duma árvore
É aí que a preguiça
Toma conta de mim
E me leva para longe
De qualquer afazer
E como é bom
E como é delicioso ócio
E estar sempre assim desligado
Das coisas do mundo
E de tudo de todos
E estar só ligado
Na tarde do céu
No sol do azul
No feijão com farinha
Na água fresca da cacimba
Servida na moringa
E estar só ligado
Na árvore que dá sombra
E na preguiça e na safadeza
No amor e na paz
E como é gostoso tudo isso
E como é gostosa esta vida.

Feliz Natal; RJ/1977; Publicado: BH, 0220702021.

Feliz Natal
E que bonito dizer
Com a voz do coração
E com o amor na língua
E com a paz no pensamento
Feliz Natal
Para todos nós
E demais pessoas
E aos amigos
E inimigos
E aos parentes
E semelhantes
E para quaisquer uns
Que desejo imenso
De sair a desejar
Feliz Natal
Ao mundo inteiro
A quem conheço
E a quem não conheço
E Feliz Natal mundo
Gentes e povos
Céus e naturezas
Mares e oceanos
Feliz Natal
Hoje é dia de Natal
É dia de compartilhar
A humanidade
A raça humana
O ser humano
Feliz Natal
Homens e mulheres
Feliz Natal e paz
E Feliz Ano Novo.

quarta-feira, 21 de julho de 2021

GABRIEL, O PENSADOR, PATRIOTA COMUNISTA.

 Tá ficando tarde

Acho que era nisso que eu pensava enquanto tentava dormir
Pra ver se pelo menos dormindo eu ainda sonhava e o sono não queria vir
Pra ver se pelo menos dormindo eu ainda conseguia respirar
Tô ficando sem ar
Acho que era nisso que eu pensava
Enquanto o meu sonho tentava chegar
Tentando desligar minha cabeça mas em alguma tela esse filme passava
Era um filme de sangue
Ou seriam as notícias?
Era um filme de gangue
Ou seria uma milícia?
Era um filme de época
Uma velha novela
O terror na favela e o hospital saturado
A criança espancada
Era um trans torturado
Eu fiquei transtornado
Eram cenas horríveis transcendendo níveis jamais tolerados
Já mais tolerados agora por seres humanos já mais insensíveis
Já mais insensíveis do que os alemães que tratavam os judeus como gado
Marcados com brasa e no Brasa 80 anos depois o enredo é igual
Medo e maniqueísmo e o ódio é normal
Preconceito é aceito e a morte é banal
Ou você é excomungado ou você é como os bois
Isso aqui sempre foi um curral
Uma bíblia, uma bunda, uma bola, uma pinga e uma sobra de feijão com arroz
O que mais poderíamos querer?
Uma arma pra cada
Uma bela piada zombando da cara de quem vai morrer?

Será que a minha amiga de Belo Horizonte pulou da janela do quinto
Sentindo essa angústia que eu sinto?
Por já não ver nada de belo ao buscar um horizonte e enxergar vários monstros brindando com cálices de vinho tinto e a carne mais cara no prato
A carne barata é a dos pretos, compartilham prantos
E prints das fotos dos corpos mas nos comentários o texto vem pronto
Se morreu no morro e é preto e fodido deve ser bandido então tudo bem
Se a Katlen não fosse mulher e gestante iam dizer que ela era traficante também
Se a família chora, o poder ignora e o diabo até ri
Agora o meu sono tá vindo e eu também tô sorrindo
Brincando com o menino Henry
Acabou chorare
No sonho eu componho com Moraes Moreira
Mas nem lá de cima ele esquece a vergonha
Lá vem o Brasil descendo a ladeira
E os novos baianos que chegam no céu foram executados
Por terem tentado furtar um pedaço de carne num supermercado
Então os seguranças pegaram em flagrante
Primeiro pediram dinheiro
Mas logo mandaram chamar os traficantes do bairro e mandaram entregar os ladrões de galinha pro coveiro
Chegaram no céu
E aí Gabriel, você por aqui?
Fiquei preocupado, será que eu morri?
Mas é só um sonho
Vou ver se aproveito pra dar um abraço em meu pai
Difícil encontrar
Chega gente demais
Numa fila que nunca termina
Vi uns anjos ali reclamando porque tinha país recusando vacina
Disfarcei minha nacionalidade
Eu acho que eu sou patriota
Mas no céu quem puser suas bandeiras acima de tudo
Deus dá cascudo e chama de idiota
Eu acho que eu sou humanista
Mas a humanidade tá punk
Eu peço um papel e uma caneta começo uma letra e encontro o Aldir Blanc
Me encanto com um conto do Rubem Fonseca e canto uma do Roupa Nova
Enquanto num canto Jesus me observa com cara de quem desaprova
Eu acho que eu sou comunista
Pois sempre chutei de canhota
Encontrei o Maradona gritando Argentina! Eu acho que ele é patriota

Sou patriota, sou comunista?
Ou só mais um morto vivendo no inferno
Só mais um sonho morrendo no céu
Mais uma nota no bolso do terno

Sou comunista, sou patriota?
Sou um cacique atacado na oca
Sou uma criança pedindo comida
Sou uma foca aplaudindo uma orca

Sou um cientista pedindo uma esmola
Sou um quilombola virando piada
Sou uma estudante estuprada na escola
Sou uma preguiça assistindo à queimada

Sou só mais um dos milhões de indivíduos
Tão divididos na morte e na vida
Somos devotos dos santos bandidos
Briga de votos parece torcida

Gritos de mito e de genocida
Almoço grátis com merda no prato
Toda verdade será distorcida
Todo poder pro Capitão do mato

Quando eu morrer
Não quero choro nem vela
Quero uma fita amarela
Gravada com o nome dela

Tá ficando estranho esse sonho
Mais um amigo chegando risonho Eduardo Galvão seu olhar ainda brilha
Mandando um recado pra filha
Querida, a vida é pra ser bem vivida não é uma corrida pro pódio
Amigo, ela sabe, eu também
E por isso também sobreponho o amor ao ódio
E sempre que posso ainda sonho
E tento inspirar tolerância
Se eu pude aprender com os meus erros não quero enterrar a esperança em que em tempos de tantos enterros o homem ainda enxergue a aberração da arrogância
E agarre esse chance de achar uma mudança de rumo atitude e conduta
Mas fica difícil encontrarmos caminhos mais justos se todos nós somos tão filhos da puta
Fazendo de tudo
Pra levar vantagem em tudo
Achando normal o absurdo
Pagando de louco de cego e de surdo apenas quando nos convém
Estamos doentes
O vereador e a mãe do menino, o governador e o ministro assassino que mata inocente no morro ou dispensa a vacina, de onde eles vêm?
Virou pesadelo esse sonho
Olhando pra gente eu até me envergonho
E eu acho que sou um cidadão de bem
Por isso me exponho e me cobro também
Se eu pude aprender pela voz dos poetas não posso aceitar a censura
Se os meus professores abriram minha mente a cura tá na educação e na cultura
Já tá uma tortura esse sonho
E falando em cultura olha quem aparece
Trazendo ironia e coragem
Me arranca um sorriso e alivia o estresse
No sonho ele vem com milhares de vítimas, 500 mil mortos ou mais
Acordo assustado e o sorriso do Paulo Gustavo na dor se desfaz
Só sinto o meu corpo gelado e do lado da cama uma frase dizendo aqui jaz
Esfrego os meus olhos e vejo que sou um escravo amarrado num tronco
E quando o chicote arrebenta minhas costas me sinto impotente mas olho pra trás
A lágrima lava o meu rosto e eu já consciente levanto pra sonhar de novo
E quebro as correntes quando reconheço o meu rosto na cara do meu capataz

Quando eu morrer
Não quero choro nem vela
Quero uma fita amarela
Gravada com o nome dela