sexta-feira, 2 de maio de 2014

Ao meu pai que morreu sem o entender; BH, 0601202013; Publicado: BH, 020502014.

Ao meu pai que morreu sem o entender
Sem olhá-lo nos olhos
Um único dia
A decifrar seus mistérios
Nunca quis saber das suas raízes
Sua árvore genealógica
Donde veio
Quais seus anseios
Sonhos esperanças
Ao meu pai que morreu
Nunca soube nada de sua vida
Sei que era ferroviário
Mexia com telégrafo
Era comunista sofria de Chagas
Falava inglês
Era muito respeitado
Quando esteve preso pela ditadura
Olhava-me tristemente de dentro da prisão
Mas não podíamos conversar
Sofria como um boi calado
Nem sei a data de seu aniversário
Não passávamos o Natal juntos
Nem Dia dos Pais
Ou algum batizado na igreja
Ao meu pai com quem conversei pouco
Do pouco que falou-me
Não segui nada
De teimosia ou de estupidez
De ignorância ou não sei o que
Só sei que fui muito ingrato ao meu pai
Que lutou por dez filhos
Não é para qualquer um
Só de pensar
Fico arrepiado
Casa comida
Roupas remédios
Inda ser incompreendido
Inda querer lutar contra uma ditadura
A ponto de chegar a ser preso
Nunca mais nos encontraremos
Mas nestas linhas
Quero reabilitar-me
Perante ao meu pai que morreu sem o entender
Se possível for

Nenhum comentário:

Postar um comentário