e nem sei escrever mais nada
e era daquele que pensava que
sabia escrever alguma coisa
e toda vez que pegava a esferográfica
só deixava registos rupestres sobre
as paredes cavernosas dos escombros
e os caracteres não eram gerados pelo fogo
e logo eram apagados pelo tempo
e espalhados pelo vento
feitos cinzas de restos mortais
de antepassados
e de ancestrais
esquecidos em portais
das encruzilhadas da história
e então via nas metáforas imperfeitas
dos descendentes que nada sabia
e pior do que um sócrates piorado
envenenava-me com a cicuta ardente
nos bares dos baixos das ruas de cantos
e ruas de fundos
e becos imundos com os
seres mais baixos do submundo subterrâneo
da sociedade apodrecida
e tinha um alento
e ouvia a voz dos pingos da chuva nas folhas
das plantas
e ouvia a voz da aragem
a farfalhar a folhagem
e a sussurrar na ramagem
linguagens estranhas só entendidas
pelos poetas
e fazedores de poemas infinitos
e orações eternais
e poesias imortais
e tudo por mais sujo que seja
se cala diante duma chuva
numa inexplicável reverência
sem limites
e que é como se passasse diante
dum monte
e há de se elevar o semblante
além das paralelas numa visão de olhar pineal
e numa ausculta de sabedoria
engendrada no coração
e na força cardíaca intrínseca
que move a razão
BH, 0160402019; Publicado: BH, 02901102022.
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