era uma vez um velho poeta bode montanhês
que gostava de folhas de relvas
e queria ser bicho
e se retirava para os altos dos montes já a se
embaraçar nas velhas lãs que o impediam de
enxergar
e de comer
e de beber
e o prendiam nos espinheiros
e o bogodo sujo montês ermitão eremita
solitário na solidão de cárcere privado de
calabouço masmorra recorria às indefectíveis
palavras para amenizar a sua agonia
e a ansiedade que o sufocavam
e o velho peito a constranger um coração que
sempre foi cheio de defeito
e nunca deu jeito em nada
e nem no amor
e nem na paz
e nem berrar o bode berra mais
e só esperava na sua loca a senhora do destino
que ouvia falar desde cordeirinho quando era
sonho de menino campos cheios de florezinhas
e céus cheios de estrelinhas
e sem muito ser tosquiado quando aparecia no
meio dos normais ouvia escárnios vai querer
que cortemos tuas lãs velho bode?
vai querer que te demos um banho bode velho?
e a vontade era de mandar todos às putas que
os pariram mas era cheio de condescendências
com os mortais normais
e voltava às suas raízes
e relvas
e folhas de relvas
e ramos
e folhagens
e ramagens
e a ruminar como um bicho tumular
e a se esconder como uma sombra tubular
e nem assim deixavam o sujo montês no
desterro do seu cemitério
e rogavam aos céus
e esmolavam a deus coisas que o tal profano
nunca fez nem por engano justamente por ter
sido desde cedo abandonado ao léu
e assim era uma vez um velho poeta bode velho
sujo montês que cujas lãs não serviam para
fazer casacos granfinos para as madames das granfinagens
BH, 0270202022; Publicado: BH, 0301102022.
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