segunda-feira, 10 de julho de 2017

Há muito tempo não se para ao pé dum rio; BH, 080702017; Publicado: BH, 0100702017.

Há muito tempo não se para ao pé dum rio
Todos os rios foram para os interiores
Onde um rio é mais sagrado para um menino
Do que uma igreja
Antigamente os rios corriam para os mares
Agora não
Correm nas faces dos anciãos
Feliz daquele que tem um rio na alma
Bem dentro de si
De preferência
Um rio reverência
D'águas tranquilas
Refrigeradas
Um rio de sereno
Um rio de orvalho
Um rio de brisa
Um rio de garoa
Era uma vez um menino que
Tinha um rio no fundo da casa
De manhã
Quando estava de férias
Chegava ao pé do rio
Via os peixinhos a nadar
A areia ainda assentada no fundo
A névoa sobre as águas
Ficava encantado
Imantado
Não queria mais sair do lugar
Precisava a mãe vir chamar para almoçar que
Nem fome tinha de tanto encantamento
Num momento
Pulou nas águas apaixonantes
Não mais voltou
Virou peixinho dourado
Virou peixinho colorido;
Virou peixinho encantado
A mãe sabia tanto que
Nem chorar chorou
Cantou uma canção de ninar
Um acalanto
De tardinha não ouvia-se pranto
Ouvia-se um riso
Um besouro a voar
Um calango a espreitar da areia
Uma aranha ligeira
Uma joaninha numa flor
Uma borboleta charmosa
A mãezinha voltava-se para a casa
Sentava-se no batente da porta
Conversava com o menino
Com as coisas que o menino gostava
As coisas eram o menino

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