segunda-feira, 8 de julho de 2024

Vladimir Maiakovski, Conversa sobre poesia com o fiscal de vendas; Publicado: BH, 040502013.

Cidadão fiscal de rendas, desculpe a liberdade!

Obrigado... não se incomode...  estou à vontade! 
A matéria que me traz é algo extraordinária: 
O lugar do poeta na sociedade proletária.. 
Ao lado dos donos de terras e senhores industriais 
Estou eu também citado por débitos fiscais.
Nós somos proletários e motores da pena. 
A poesia é como a lavra do rádio 
- Um ano para cada grama.
Para extrair uma palavra, 
Milhões de toneladas de palavra-prima.
Porém, que flama de uma tal palavra emana 
Perto das brasas da palavra-bruta!
Tal palavra põe em luta milhões de corações 
Por milhares de anos.
Você conhece por certo o fenômeno rima.
Em linguagem de fisco
A rima é uma letra a termo fixo
Para desconto ao fim da linha
Sem mais prazos.
E sai-se à caça da minúcia de flexão ou sufixo
Na caixa escassa das conjugações e casos.
Tenta-se pôr uma palavra nessa linha,
Ela não cabe, força-se, e se esfarinha.
Cidadão fiscal de rendas, eu lhe juro,
As palavras custam ao poeta um duro juro.
Para nós, a rima é um barril.
De dinamite. 
O verso, um estopim.
A linha se incendeia e quando chega ao fim
 explode
E a cidade em estrofe voa em mil.
No questionário há um monte de quesitos: 
“O Sr. fez viagens?  Sim ou não?
Mas, como, se eu fiz vôos infinitos 
Em dezenas de pégasos nesses 15 anos ?
Cidadão, condescenda, as passagens são caras!
A poesia - toda ela - é uma viagem ao desconhecido..
A máquina da alma com os anos se trava,
E dizem: - ao arquivo, acabou-se, um de menos! 
O tempo em sua corrida minhas têmporas esmaga. 
E vem então a mais terrível das amortizações 
- A de almas e corações, última paga.
A minha dívida é uivar com o verso, 
Entre a névoa burguesa, boca brônzea de sirene. 
O poeta é o eterno devedor do universo, 
E paga em dor porcentagens de pena.
Estou em dívida com os lampiões da Broadway, 
Com o Exército Vermelho, 
Com vocês, céus de Bagdádi, 
Com as cerejeiras do Japão e toda a infinidade 
A que não pude dar a sobra de uma ode.
Mas, para que afinal essas molduras?
Para que fazer da rima, mira
E do ritmo, chibata?
A palavra do poeta é a tua ressurreição, 
A tua imortalidade, cidadão burocrata  .
Daqui a séculos, do papel mudo toma um verso
E o tempo ressuscita.
Cidadão fiscal de rendas, eu encerro. 
Pago 5 rublos e risco todos os zeros. 
Tudo o que quero é um palmo de terra ao lado 
Dos mais pobres camponeses e operários.
Porém, se vocês pensam que se trata apenas 
De copiar palavras a esmo,
Eis aqui, camaradas, minha pena:  
Podem escrever vocês mesmos!

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