Ensaio sobre o nada no dia no qual o sol se apagou
E tem gente que tem tudo e não
Bebe, e tem gente que não tem nada e bebe tudo;
E tem gente que tem tudo e bebe tudo, e tem
Gente que não tem nada, e não bebe nada;
E nenhuma mulher tem prazer em me dá,
Nunca conheci uma que queira me amar;
Vou morrer daqui a pouco, sem nenhuma mulher
Comer; pedi sabedoria, ganhei burrice; pedi
Inteligência, ganhei obtusidade; pedi o fim
Do medo e da covardia, ganhei, que absurdidade,
O teor da mentira; pedi, com fome, pão,
Ganhei cobras e serpentes; pedi água, ganhei
Vinagre; e o sofrimento é o de quem torce,
Para s Seleção treinada por Parreira, pois
Ainda não vi sofrimento maior; aqui não
Acontece nada, não passa uma mulher alucinada,
Danaide danada, que lugar miserável, sô,
Vejo hipocrisia e mediocridade e a poesia,
Não anda mais por aqui; a filosofia evaporou;
O mato cresceu; o mar secou; o sol apagou
Desde que o homem é homem, o amor já
Deixou de florescer; cadê os meninos e as meninas?
Cadê as floras e as faunas? cadê o universo? acabou,
O sol apagou; foi uma facada na garganta que
Lhe cortou o nó da corda vocal que o enforcava;
Frei Beto, estou a lembrar o nome de um
Livro de Roberto Drummond, onde a mulher mudava
De cor e uns personagens tinham nome de wisky; e
James Joyce, e João Guimarães Rosa; e a literatura
Fantástica de Saramago, nada de mistérios sombrios,
Pura luminosidade, escrita iluminada, para
Todo aquele que vive nas trevas, ter um pouco
Mais de alegria, ainda que hoje seja o dia,
No qual o sol se apagou; quem ensaia sobre
O nada, tem a ganhar, mesmo que não
Se saiba bem o quê; é investimento a longo
Prazo, no desconhecido e no tortuoso caminho
Da literatura universal e às vezes o lucro vem
Depois que o escritor já morreu, pois ele passou
Pela vida, não viveu, não cresceu e aí, entra a vez dela.
Nenhum comentário:
Postar um comentário