Literatura e política. COLABORE, PIX: (31)988624141
quarta-feira, 30 de novembro de 2011
Geraldo Pereira, Escurinho; BH, 03001102011.
O escurinho era um escuro direitinho
Que agora tá com essa mania de brigão
Parece praga de madrinha ou macumba
De alguma escurinha que lhe fez ingratidão
Saiu de cana ainda não faz uma semana
Já a mulher do Zé Pretinho carregou
Botou embaixo o tabuleiro da baiana
Porque pediu fiado e ela não fiou
Já foi no Morro da Formiga procurar intriga
Já foi no Morro do Macaco e lá bateu num bamba
Já foi no Morro dos Cabritos provocar conflitos
Já no foi no Morro do Pinto pra acabar com o samba
Elza Soares, O Neguinho e a Senhorita; BH, 03001102011.
Que nós tratamos de sinhá
Senhorita também gostou do Neguinho
Mas o Neguinho não tem dinheiro pra
Gastar
A Madame tem preconceito de cor
Não pôde evitar esse amor
Senhorita foi morar lá na Colina
Com o Neguinho que é compósito
Senhorita foi morar lá na Colina
Com o Neguinho que é compósito
O Neguinho gostou da filha da Madame
Que nós tratamos de sinhá
Senhorita também gostou do Neguinho
Mas o Neguinho não tem dinheiro pra
Gastar
A Madame tem preconceito de cor
Não pôde evitar esse amor
Senhorita foi morar lá na Colina
Com o Neguinho que é compósito
Senhorita foi morar lá na Colina
Com o Neguinho que é compósito
Senhorita ficou com nome na história
E agora é a rainha da escola
Gostou do samba e hoje vive muito
Bem
Ela devia nascer pobre também
Gostou do samba e hoje vive muito
Bem
Ela devia nascer pobre também
segunda-feira, 28 de novembro de 2011
Babilak Bah, Moinhos; BH, 02801102011.
Moinhos sobre dunas do palácio
Adentro, adentro azul - cerâmica em pulsação
Acordes, hálito de terra, acordam: sêmemurbanos.
Totens uníssono - inclusões em ouro
Intuição em ti, transpõe o sol azul
Moldurao gesto do barro - falácia das arejas
Chumbo sobre terra
Tijolo das ruínas - aspiral da criação
Simbiose zen mineral: Ouro (e) Preto
Adentro, adentro azul - cerâmica em pulsação
Acordes, hálito de terra, acordam: sêmemurbanos.
Totens uníssono - inclusões em ouro
Intuição em ti, transpõe o sol azul
Moldurao gesto do barro - falácia das arejas
Chumbo sobre terra
Tijolo das ruínas - aspiral da criação
Simbiose zen mineral: Ouro (e) Preto
Tomás Antônio Gonzaga, Lira XVI; BH, 02801102011.
Minha Marília,
Tu enfadada?
Que mão ousada
Perturbar pode
A paz sagrada
Do peito teu?
Porém que muito
Onde irado esteja
O teu semblante!
Também troveja
O claro Céu.
Eu sei, Marília,
Que outra Pastôra
A toda hora,
Em toda a parte
Cega namora
Ao teu Pastor.
Há sempre fumo
Aonde há fogo:
Assim, Marília,
Há zelos, logo
Que existe amor.
Olha, Marília,
Na fonte pura
A tua alvura,
A tua boca,
E a compostura
Das mais feições.
Quem tem teu rosto
Ah! não receia
Que terno amante
Solte a cadeia,
Quebre os grilhões.
Não anda Laura
Nestas campinas
Sem as boninas
No seu cabelo,
Sem peles finas
No seu jubão.
Porém que importa?
O rico asseio
Não dá, Marília,
Ao rosto feio
A perfeição.
Quando apareces
Na madrugada,
Mal embrulhada
Na larga roupa,
E desgrenhada
Sem fita, ou flor;
Ah! que então brilha
A natureza!
Então se mostra
Tua beleza
Inda maior.
O Céu formoso,
Quando alumia
O Sol de dia
Ou estrelado
Na noite fria,
Parece bem.
Também tem graça
Quando amanhece;
Até, Marília,
Quando anoitece
Também a tem.
Que tens, Marília,
Que ela suspire!
Que ela delire!
Que corra os vales!
Que os montes gire
Louca de amor!
Ela é que sente
Esta desdita,
E na repulsa
Mais se acredita
O teu Pastor.
Quando há, Marília,
Alguma festa
Lá na floresta,
(Fala a verdade)
Dança com esta
O bom Dirceu?
E se ela o busca,
Vendo buscar-se
Não se levanta,
Não vai sentar-se
Ao lado teu?
Quando um por outro
Na rua passa,
Se ela diz graça,
Ou muda o gesto,
Esta negaça
Faz-lhe impressão?
Se está fronteira,
E brandamente
Lhe fita os olhos,
Não põe prudente
O seus no chão?
Deixa o ciúme,
Que te desvela:
Marília bela,
Nunca receies
Dano daquela
Que igual não fôr.
Que mais desejas?
Tens lindo aspecto;
Dirceu se alenta
De puro afeto,
E pundonor.
Tu enfadada?
Que mão ousada
Perturbar pode
A paz sagrada
Do peito teu?
Porém que muito
Onde irado esteja
O teu semblante!
Também troveja
O claro Céu.
Eu sei, Marília,
Que outra Pastôra
A toda hora,
Em toda a parte
Cega namora
Ao teu Pastor.
Há sempre fumo
Aonde há fogo:
Assim, Marília,
Há zelos, logo
Que existe amor.
Olha, Marília,
Na fonte pura
A tua alvura,
A tua boca,
E a compostura
Das mais feições.
Quem tem teu rosto
Ah! não receia
Que terno amante
Solte a cadeia,
Quebre os grilhões.
Não anda Laura
Nestas campinas
Sem as boninas
No seu cabelo,
Sem peles finas
No seu jubão.
Porém que importa?
O rico asseio
Não dá, Marília,
Ao rosto feio
A perfeição.
Quando apareces
Na madrugada,
Mal embrulhada
Na larga roupa,
E desgrenhada
Sem fita, ou flor;
Ah! que então brilha
A natureza!
Então se mostra
Tua beleza
Inda maior.
O Céu formoso,
Quando alumia
O Sol de dia
Ou estrelado
Na noite fria,
Parece bem.
Também tem graça
Quando amanhece;
Até, Marília,
Quando anoitece
Também a tem.
Que tens, Marília,
Que ela suspire!
Que ela delire!
Que corra os vales!
Que os montes gire
Louca de amor!
Ela é que sente
Esta desdita,
E na repulsa
Mais se acredita
O teu Pastor.
Quando há, Marília,
Alguma festa
Lá na floresta,
(Fala a verdade)
Dança com esta
O bom Dirceu?
E se ela o busca,
Vendo buscar-se
Não se levanta,
Não vai sentar-se
Ao lado teu?
Quando um por outro
Na rua passa,
Se ela diz graça,
Ou muda o gesto,
Esta negaça
Faz-lhe impressão?
Se está fronteira,
E brandamente
Lhe fita os olhos,
Não põe prudente
O seus no chão?
Deixa o ciúme,
Que te desvela:
Marília bela,
Nunca receies
Dano daquela
Que igual não fôr.
Que mais desejas?
Tens lindo aspecto;
Dirceu se alenta
De puro afeto,
E pundonor.
Antônio Nobre, Certa Velhinha; BH, 02801102011.
Além, na tapada das Quatorze Cruzes,
Que triste velhinha que vai a passar!
Não leva candeia; hoje, o Céu não tem luzes...
Cautela, Velhina, não vais tropeçar!
Os Ventos entoam cantigas funestas,
Relâmpagos tingem de vermelho o Azul!
Aonde irá ela, numa noite destas,
Com Vento da Barra puxado do Sul?
Aonde irá ela, pastôres! boieras!
Aonde irá ela, numa noite assim?
Se fôr um Fantasma, fazei-lhe fogueiras,
Se fôr uma Bruxa, queimai-lhe alecrim!
Contava-me Aquela que a tumba já cerra,
Que Nossa Senhora, quando a chama alguém,
Escolhe estas noites pra descer à Terra,
Porque em noites destas não anda ninguém...
Além na tapada das Quatorze Cruzes,
Que linda velhinha que vem a passar!
E que olhos aqueles que parecem luzes!
Quais velas acesas que a vêm a guiar...
Que pobre capinha que leva de rastos,
Tão velha, tão rôta! que triste viuvez!
Mas se lhe dá vento, meu Deus! tantos astros!
É o Céu estrelado vestido do invés...
Seu alvo cabelo, molhado das chuvas,
Parece uma vinha de luar em flor:
Oh cabelos em cachos, como cachos de uvas!
Só no Céu há uvas com aquela cor.
A luz dos seus olhos é uma luz tamanha
Que ao redor espalha perfeito clarão!
Parece que chove luar na montanha...
Que noite de inverno que parece verão!
Além, na tapada das Quatorze Cruzes,
Velhinha tão alta que vem a chegar!
Parece uma Tôrre coada de luzes!
Ou antes a Tôrre de Marfim a andar!
Não! Não é uma Tôrre coada de luzes,
Nem antes a Tôrre de Marfim a andar,
Que pela tapada das Quatorze Cruzes,
Numa noite destas eu vejo passar.
Também não é, ouve, minha velha ama!
Como tu contavas, a Virgem da Luz:
Digo-te ao ouvido como ela se chama,
Mas gurda segredo , que é ...
- Jesus! Jesus!
2
Além, na tapada das Quatorze Cruzes,
Já não é a Velhinha que vai a passar:
Um grande cortejo cheiinho de luzes,
Aninhas da Eira que vai a enterrar.
Um Pastor fala:
"Aninhas da Eira! Aninhas da Eira!
Cantai, raparigas, cantai e chorai!
Morreu, coitadinha! sorrindo, trigueira,
Como um passarinho, sem soltar um ai.
Quando era pequeno, levava-me à escola,
E quando, mais tarde, cresci e medrei,
Oh danças na eira, ao som da viola!
Nas danças de roda, que beijos lhe dei!
Os anos vieram, os anos passaram,
Meu fardo arrastou-me, da aldeia saí:
Nunca mais meus olhos seus olhos tocaram,
Perdi-a de todo, nunca mais a vi.
E além, na tapada das Quatorze Cruzes,
Numa noite destas com vento a ventar,
Ó meu Deus! é ela que vai entre luzes!
Ó meu Deus! é a Aninhas que vai a enterrar!
Ola! bons senhores, vestidos de preto,
Deixai a defunta, que a levarei eu!
O suor alaga-vos, eu levo o carreto...
O caixão de Aninhas é também o meu!
Tenho os relâmpagos, deixai-me sem velas
A rezar por ela, sob o temporal!
Caí-me no peito, cravai-me, procelas!
Cruzes da tapada, em forma de punhal!
Mas os bons senhores, de preto vestidos,
Cigarros acesos, e velas na não,
Lá passam ao Vento, com sete sentidos,
Com medo que, às vezes, não sejam um ladrão...
Mãos das ventanias! mão das ventanias!
Tirai-lhes Aninhas e levai-a a Deus!
Com suas maozinhas, agora tão frias,
Irá na viagem a dizer-me adeus...
Ó Vento que passa! corcel de rajada!
Assenta-nos ambos no mesmo selim:
Quero ir mais ela na longa jornada...
Quero ir com Aninhas pelo Céu sem fim!
Ó Leste, que trazes as rolas às costas,
Quais rolas, leva-me aos pés do Senhor!
Quero ir com ela, assim de mãos postas...
Quero ir com Aninhas para onde ela fôr!
Ó Norte dos Marços! Ó Sol das procelas,
Levai-nos quais brigues, com asas, levai!
Levai-nos como águias, levai-nos quais velas...
Quero ir com Aninhas para onde ela vai!"
3
Além, na tapada das Quatorze Cruzes,
Que triste velhinha que vai a passar!
E que olhos aqueles que parecem luzes...
Aonde irá ela? Quem irá buscar?
(Paris, 1891.)
Que triste velhinha que vai a passar!
Não leva candeia; hoje, o Céu não tem luzes...
Cautela, Velhina, não vais tropeçar!
Os Ventos entoam cantigas funestas,
Relâmpagos tingem de vermelho o Azul!
Aonde irá ela, numa noite destas,
Com Vento da Barra puxado do Sul?
Aonde irá ela, pastôres! boieras!
Aonde irá ela, numa noite assim?
Se fôr um Fantasma, fazei-lhe fogueiras,
Se fôr uma Bruxa, queimai-lhe alecrim!
Contava-me Aquela que a tumba já cerra,
Que Nossa Senhora, quando a chama alguém,
Escolhe estas noites pra descer à Terra,
Porque em noites destas não anda ninguém...
Além na tapada das Quatorze Cruzes,
Que linda velhinha que vem a passar!
E que olhos aqueles que parecem luzes!
Quais velas acesas que a vêm a guiar...
Que pobre capinha que leva de rastos,
Tão velha, tão rôta! que triste viuvez!
Mas se lhe dá vento, meu Deus! tantos astros!
É o Céu estrelado vestido do invés...
Seu alvo cabelo, molhado das chuvas,
Parece uma vinha de luar em flor:
Oh cabelos em cachos, como cachos de uvas!
Só no Céu há uvas com aquela cor.
A luz dos seus olhos é uma luz tamanha
Que ao redor espalha perfeito clarão!
Parece que chove luar na montanha...
Que noite de inverno que parece verão!
Além, na tapada das Quatorze Cruzes,
Velhinha tão alta que vem a chegar!
Parece uma Tôrre coada de luzes!
Ou antes a Tôrre de Marfim a andar!
Não! Não é uma Tôrre coada de luzes,
Nem antes a Tôrre de Marfim a andar,
Que pela tapada das Quatorze Cruzes,
Numa noite destas eu vejo passar.
Também não é, ouve, minha velha ama!
Como tu contavas, a Virgem da Luz:
Digo-te ao ouvido como ela se chama,
Mas gurda segredo , que é ...
- Jesus! Jesus!
2
Além, na tapada das Quatorze Cruzes,
Já não é a Velhinha que vai a passar:
Um grande cortejo cheiinho de luzes,
Aninhas da Eira que vai a enterrar.
Um Pastor fala:
"Aninhas da Eira! Aninhas da Eira!
Cantai, raparigas, cantai e chorai!
Morreu, coitadinha! sorrindo, trigueira,
Como um passarinho, sem soltar um ai.
Quando era pequeno, levava-me à escola,
E quando, mais tarde, cresci e medrei,
Oh danças na eira, ao som da viola!
Nas danças de roda, que beijos lhe dei!
Os anos vieram, os anos passaram,
Meu fardo arrastou-me, da aldeia saí:
Nunca mais meus olhos seus olhos tocaram,
Perdi-a de todo, nunca mais a vi.
E além, na tapada das Quatorze Cruzes,
Numa noite destas com vento a ventar,
Ó meu Deus! é ela que vai entre luzes!
Ó meu Deus! é a Aninhas que vai a enterrar!
Ola! bons senhores, vestidos de preto,
Deixai a defunta, que a levarei eu!
O suor alaga-vos, eu levo o carreto...
O caixão de Aninhas é também o meu!
Tenho os relâmpagos, deixai-me sem velas
A rezar por ela, sob o temporal!
Caí-me no peito, cravai-me, procelas!
Cruzes da tapada, em forma de punhal!
Mas os bons senhores, de preto vestidos,
Cigarros acesos, e velas na não,
Lá passam ao Vento, com sete sentidos,
Com medo que, às vezes, não sejam um ladrão...
Mãos das ventanias! mão das ventanias!
Tirai-lhes Aninhas e levai-a a Deus!
Com suas maozinhas, agora tão frias,
Irá na viagem a dizer-me adeus...
Ó Vento que passa! corcel de rajada!
Assenta-nos ambos no mesmo selim:
Quero ir mais ela na longa jornada...
Quero ir com Aninhas pelo Céu sem fim!
Ó Leste, que trazes as rolas às costas,
Quais rolas, leva-me aos pés do Senhor!
Quero ir com ela, assim de mãos postas...
Quero ir com Aninhas para onde ela fôr!
Ó Norte dos Marços! Ó Sol das procelas,
Levai-nos quais brigues, com asas, levai!
Levai-nos como águias, levai-nos quais velas...
Quero ir com Aninhas para onde ela vai!"
3
Além, na tapada das Quatorze Cruzes,
Que triste velhinha que vai a passar!
E que olhos aqueles que parecem luzes...
Aonde irá ela? Quem irá buscar?
(Paris, 1891.)
Mário Quintana, (IX) Da Inquieta Esperança; BH, 02801102011.
Bem sabes Tu, Senhor, que o bem melhor é aquele
Que não passa, talvez, de um desejo ilusório.
Nunca me dês o Céu... quero é sonhar com ele
Na inquietação feliz do Purgatório.
Que não passa, talvez, de um desejo ilusório.
Nunca me dês o Céu... quero é sonhar com ele
Na inquietação feliz do Purgatório.
quinta-feira, 24 de novembro de 2011
JOSÉ IGNÁCIO PEREIRA, O POETA DO CÉU AZUL, Errante; BH, 02401102011.
A Cruz e Souza
Ei-lo que traz na face a dor do mundo.
Os olhos revelando a solidão.
No abismo do seu ser, no mais profundo,
Traz a agonia atroz do coração.
Vem de enfermas paragens, da nação
Por onde o amor é o termo moribundo.
Não pede nada, nem suplica o pão,
E arrasta-se na terra, lá no fundo.
É o pária assinalado pelo horror.
Na garganta morreu o seu amor.
Mas nada o vence assim - é triunfante,
Quando, rompendo a condição humana,
Faz da fraqueza a força soberana
E diz ao Deus do abismo que o levante.
Céu Azul, 7/10/2011 - 4h.
Ei-lo que traz na face a dor do mundo.
Os olhos revelando a solidão.
No abismo do seu ser, no mais profundo,
Traz a agonia atroz do coração.
Vem de enfermas paragens, da nação
Por onde o amor é o termo moribundo.
Não pede nada, nem suplica o pão,
E arrasta-se na terra, lá no fundo.
É o pária assinalado pelo horror.
Na garganta morreu o seu amor.
Mas nada o vence assim - é triunfante,
Quando, rompendo a condição humana,
Faz da fraqueza a força soberana
E diz ao Deus do abismo que o levante.
Céu Azul, 7/10/2011 - 4h.
paopoesiaazia.blogspot.com.br; Profissão desacato; BH, 02401102011.
Eis nós cá estamos!
Vestimos suas roupas para enganá-los.
Falamos sua língua para desvendá-los.
(...) esperamos derrubá-los.
De nem tão longe nem tão perto viemos,
Estamos
Em todo lugar.
Abaixo do véu de suas mentiras,
Sua fumaça,
Não nos entope a vista.
Se enganaram com o que esperavam!
Não nos dobraremos aos seus reis de plástico
Não sentiremos seu amor de venda
Não seremos mero decorativo
Ao saber de seus sábios falsos.
Já estamos fartos de novelas,
Seus papos tortos não serão nosso ópio;
Temos certeza em ser seu monstro.
Nosso orgulho é ser sua escória
A fim de mostrar-lhe, tal qual espelho,
A tua verdadeira face.
Propomos o que temos
E ser é ter a si mesmo.
É uma guerra;
Vai para a linha de frente sabendo o que quer dela.
Garoto, carregue a mochila com molotov!
Não aceite seu preconceito,
Faça-se grande em conhecimento.
Não semeie o grão que lhe venderam -
Não diminua como arma -
E não se cale frente ao desrespeito.
Não viva a vida que te deram,
Dê a eles o que quis dela!
Construa seu castelo.
Aqui jaz aquele que pensava
Que devia viver em termo alheio.
Aqui jaz quem não sabia
O valor do seu tempo.
Vestimos suas roupas para enganá-los.
Falamos sua língua para desvendá-los.
(...) esperamos derrubá-los.
De nem tão longe nem tão perto viemos,
Estamos
Em todo lugar.
Abaixo do véu de suas mentiras,
Sua fumaça,
Não nos entope a vista.
Se enganaram com o que esperavam!
Não nos dobraremos aos seus reis de plástico
Não sentiremos seu amor de venda
Não seremos mero decorativo
Ao saber de seus sábios falsos.
Já estamos fartos de novelas,
Seus papos tortos não serão nosso ópio;
Temos certeza em ser seu monstro.
Nosso orgulho é ser sua escória
A fim de mostrar-lhe, tal qual espelho,
A tua verdadeira face.
Propomos o que temos
E ser é ter a si mesmo.
É uma guerra;
Vai para a linha de frente sabendo o que quer dela.
Garoto, carregue a mochila com molotov!
Não aceite seu preconceito,
Faça-se grande em conhecimento.
Não semeie o grão que lhe venderam -
Não diminua como arma -
E não se cale frente ao desrespeito.
Não viva a vida que te deram,
Dê a eles o que quis dela!
Construa seu castelo.
Aqui jaz aquele que pensava
Que devia viver em termo alheio.
Aqui jaz quem não sabia
O valor do seu tempo.
Casimiro de Abreu, Sonhos de virgem; BH, 02401102011.
Que sonhas, virgem, nos sonhos
Que à minha mente te vêm risonhos
Na primavera inda em flor?
No celeste devaneio,
No doce bater do seio,
Que sonhas, virgem? - amor?
Que céuss, que jardins, que flores,
Que longos cantos de amores
Nos lindos sonhos te vêm?
E quando a mente delira,
E quando o peito suspira,
Supira o peito - por quem?
Sonhando mesmo acordada,
Pendida a fonte adorada,
Num cismar vago e sem fim;
Do olhar o fogo tão vivo,
A voz, o riso lascivo,
O pensamento é - p'ra mim?!
Quando tu dormes tranquila,
Cerrada a negra pupila
E o lábio doce a sorrir,
Então o sonho dourado
Nas dobras do cortinado
Vem esmaltar teu dormir!
Oh, sonha! - Feliz a idade
Das rosas da virgindade,
Dos sonhos do coração!
- Puro vergel de açucenas
Ou lago d'águas serenas
Que estremece à viração!
Feliz! Feliz quem pudera
Colher-te na primavera
De gala rica e louçã!
Feliz, ó flor dos amores,
Quem te beber os odores
Nos orvalhos da manhã!
Que à minha mente te vêm risonhos
Na primavera inda em flor?
No celeste devaneio,
No doce bater do seio,
Que sonhas, virgem? - amor?
Que céuss, que jardins, que flores,
Que longos cantos de amores
Nos lindos sonhos te vêm?
E quando a mente delira,
E quando o peito suspira,
Supira o peito - por quem?
Sonhando mesmo acordada,
Pendida a fonte adorada,
Num cismar vago e sem fim;
Do olhar o fogo tão vivo,
A voz, o riso lascivo,
O pensamento é - p'ra mim?!
Quando tu dormes tranquila,
Cerrada a negra pupila
E o lábio doce a sorrir,
Então o sonho dourado
Nas dobras do cortinado
Vem esmaltar teu dormir!
Oh, sonha! - Feliz a idade
Das rosas da virgindade,
Dos sonhos do coração!
- Puro vergel de açucenas
Ou lago d'águas serenas
Que estremece à viração!
Feliz! Feliz quem pudera
Colher-te na primavera
De gala rica e louçã!
Feliz, ó flor dos amores,
Quem te beber os odores
Nos orvalhos da manhã!
Manoel de Barros, O Vento; BH, 02401102011.
Queria transformar o vento.
Dar ao vento uma forma concreta e apta a foto.
Eu precisava pelo menos de enxergar uma parte física
Do vento: uma costela, o olho...
Mas a forma do vento me fugia que nem as formas
De uma voz.
Quando se disse que o vento empurrava a canoa
Do índio para o barranco
Imaginei um vento pintado de urucum a empurrar a
Canoa do índio para o barranco.
Mas essa imagem me pareceu imprecisa ainda.
Estava quase a desistir quando me lembrei do menino
Montado no cavalo do vento - que lera em
Shakespeare.
Imaginei as crinas soltas do vento a disparar pelos
Prados com o menino.
Fotografei aquele vento de crinas soltas.
Dar ao vento uma forma concreta e apta a foto.
Eu precisava pelo menos de enxergar uma parte física
Do vento: uma costela, o olho...
Mas a forma do vento me fugia que nem as formas
De uma voz.
Quando se disse que o vento empurrava a canoa
Do índio para o barranco
Imaginei um vento pintado de urucum a empurrar a
Canoa do índio para o barranco.
Mas essa imagem me pareceu imprecisa ainda.
Estava quase a desistir quando me lembrei do menino
Montado no cavalo do vento - que lera em
Shakespeare.
Imaginei as crinas soltas do vento a disparar pelos
Prados com o menino.
Fotografei aquele vento de crinas soltas.
Llewellyn Medina, Sobre uma frase de Tim Maia; BH, 02401102011.
"Não fumo, não bebo, não cheiro
Minto um pouquinho."
Minto quando as pessoas perguntam
Porque fumo
Porque bebo
Porque cheiro
Ou porque minto.
Por um lado tudo é questão de metafísica
Ou de mera versão
Pois o fato deixa de ser relevante
Quando dele emito juízo de valor
O fato passa a ser versão
E é a versão que sempre vale
Não é Alkimin?
Se não for metafísica
Será intromissão em minha solitária vida de pecador
Daí é que vem o interesse
(Pode ser)
Daí é que vem minha indignação.
Afinal
Porque perguntam tanto
Se da verdade ninguém quer saber?
Minto um pouquinho."
Minto quando as pessoas perguntam
Porque fumo
Porque bebo
Porque cheiro
Ou porque minto.
Por um lado tudo é questão de metafísica
Ou de mera versão
Pois o fato deixa de ser relevante
Quando dele emito juízo de valor
O fato passa a ser versão
E é a versão que sempre vale
Não é Alkimin?
Se não for metafísica
Será intromissão em minha solitária vida de pecador
Daí é que vem o interesse
(Pode ser)
Daí é que vem minha indignação.
Afinal
Porque perguntam tanto
Se da verdade ninguém quer saber?
Tito Júlio Fedro, Pardal com gana de conselheiro e a Lebre; BH, 02401102011.
Vamos demonstrar, em poucas palavras, quanto há de
Insensatez em não se acautelar e dar conselhos aos outros.
Um pardal criticava a lebre que, nas garras da águia, dava
Gemidos lancinantes.
Dizia:
"Onde está aquela conhecida rapidez (tua)?
Porque teus pés estão assim imóveis!?"
Enquanto falava, um gavião arrebata aquele desprevenido e
Mata bem a ele que se põe a lamentar em vão.
A lebre semi-morta (comenta):
"Eis o consolo de (minha) morte.
Até há pouco, tu que, seguro, rias de meus males,
Estás (agora) a deplorar teu destino com lamentos semelhantes."
Insensatez em não se acautelar e dar conselhos aos outros.
Um pardal criticava a lebre que, nas garras da águia, dava
Gemidos lancinantes.
Dizia:
"Onde está aquela conhecida rapidez (tua)?
Porque teus pés estão assim imóveis!?"
Enquanto falava, um gavião arrebata aquele desprevenido e
Mata bem a ele que se põe a lamentar em vão.
A lebre semi-morta (comenta):
"Eis o consolo de (minha) morte.
Até há pouco, tu que, seguro, rias de meus males,
Estás (agora) a deplorar teu destino com lamentos semelhantes."
Manuel Bandeira, A Minha Irmã; BH, 02401102011.
Depois que a dor, depois que a desventura
Caiu sobre o meu peito angustiado,
Sempre te vi, solícita, a meu lado,
Cheia de amor e cheia de ternura.
É que em teu coração ainda perdura,
Entre doces lembranças conservado,
Aquele afeto simples e sagrado
De nossa infância, ó meiga criatura.
Por isso aqui minh'alma te abençoa:
Tu foste a voz compadecida e boa
Que no meu desalento me susteve.
Por isso eu te amo, e, na miséria minha,
Suplico aos céus que a mão de Deus te leve
E te faça feliz, minha irmãzinha...
Clavadel, 1913
Caiu sobre o meu peito angustiado,
Sempre te vi, solícita, a meu lado,
Cheia de amor e cheia de ternura.
É que em teu coração ainda perdura,
Entre doces lembranças conservado,
Aquele afeto simples e sagrado
De nossa infância, ó meiga criatura.
Por isso aqui minh'alma te abençoa:
Tu foste a voz compadecida e boa
Que no meu desalento me susteve.
Por isso eu te amo, e, na miséria minha,
Suplico aos céus que a mão de Deus te leve
E te faça feliz, minha irmãzinha...
Clavadel, 1913
Mario Quintana, O Último Crime da Mala; BH, 02401102011.
Na mala que nem o Anjo da Guarda,
Nem o Delegado do Distrito,
Nem eu mesmo consigo encontrar,
Está a minha imagem única, fechada a chave
- E a chave caída no fundo do mar!
Não adianta chamar escafandros,
Nem homens-rãs,
Nem a sereia mais querida,
Nem os atenciosos hipocampos, - de que adianta?!
Não existem vestígios de mim...
Nem o Delegado do Distrito,
Nem eu mesmo consigo encontrar,
Está a minha imagem única, fechada a chave
- E a chave caída no fundo do mar!
Não adianta chamar escafandros,
Nem homens-rãs,
Nem a sereia mais querida,
Nem os atenciosos hipocampos, - de que adianta?!
Não existem vestígios de mim...
Paul Claudel, O tempo fugiu; BH, 02401102011.
O tempo fugiu
O verão partiu
A velhice chegou, moço não és
- Talvez pior, disse, melhor talvez!
O verão partiu
Veio o tempo frio
Quase não andas, quase nada vês...
- Talvez pior, disse, melhor talvez!
Foi-se amor, paixão!
Pobre e surdo ancião!
Festa, prazer findaram duma vez!
- Talvez pior, disse, melhor talvez!
A estrada é tão dura
A morte segura
A cada passo um perigo a teus pés.
- Talvez pior, disse, melhor talvez!
O tempo fugiu
E tudo sumiu
Só Deus ficou nesta nudez.
- Talvez pior, disse, melhor talvez!
O verão partiu
A velhice chegou, moço não és
- Talvez pior, disse, melhor talvez!
O verão partiu
Veio o tempo frio
Quase não andas, quase nada vês...
- Talvez pior, disse, melhor talvez!
Foi-se amor, paixão!
Pobre e surdo ancião!
Festa, prazer findaram duma vez!
- Talvez pior, disse, melhor talvez!
A estrada é tão dura
A morte segura
A cada passo um perigo a teus pés.
- Talvez pior, disse, melhor talvez!
O tempo fugiu
E tudo sumiu
Só Deus ficou nesta nudez.
- Talvez pior, disse, melhor talvez!
quarta-feira, 23 de novembro de 2011
Com a dor crônica que carrego; BH, 0280502000; Publicado: BH, 02301102011.
Com a dor crônica que carrego
Dentro de mim antipirina não
Pode de maneira alguma dar
Fim o jeito é o medicamento ser
Empregado como antipirético
Análgico não pode evitar a dor
Que acaba de me matar todos os
Meus músculos antiperistálticos
São contrários aos movimentos
Peristálticos os antipódicos são
Os mesmos no antipodismo
Como o emprego dum caso
Gramatical por outro na antiptose
Que impede a deterioração da ideia
Num antipútrido providencial
Contra a putrefação do ideal
Impedir ao antissemita
Inimigo da raça semítica
Particularmente dos judeus
Pregar a paz ao não deixar
O sentimento antissemítico
Semear a guerra brutal quanto
Ao antirrevisionismo do
Antirrevisionista barrar essa
Corrente política infensa ao
Revisionismo do movimento
Que visa ao reexame duma
Situação ou especialmente que
Se bate pela revisão da Constituição
Dum país da sátira do governo
Vergonhoso que é com o desrespeito
Ao povo fazer do povo uma antissátira
Popular uma réplica popular
Com a banição do poder dos
Traidores do povão como os
Antíscios que habitam sob o
Mesmo meridiano mas de cada
Lado a igual distância do equador
De sorte que ao meio-dia as suas
Sombras são opostas como os antecos
segunda-feira, 21 de novembro de 2011
Euclides da Cunha, A rir; BH, 02101102011.
Eu já não creio mais... sombrio e calmo enfrento
- O lábio ermo da prece; o peito ermo da crença -
A estrela - rubra e imensa
De meu destino atroz, aspérrimo e sangrento!...
E embora sobre mim flamívoma suspensa
Em minh'alma os clarões fatais ela concentre
Eu suporto-lhe bem o flamejante baque
- Altivamente calmo - entricheirando-me entre
Uma canção de Byron
E um cálix de cognac...
- Não há dor que resista ao som de uma risada! --
Depois - se me exacerbo
E tremo e choro erguendo a prece à alma magoada
Mais me dói essa dor, mais esse mal é acerbo!
Assim - eu resolvi, indiferente e frio
Cheio de orgulho e spleen - como um banqueiro inglês!
Sepultar na ironia o pranto meu sombrio...
Por isso quando atroz na triste palidez
De minha fronte paira amarga ideia - eu rio!...
E quando pouco a pouco
Essa ideia me abate e vence-me alterosa
De amargores repleta - eu rio como um louco...
E se ela inda dói mais e forte e tenebrosa
Sói a último ideal de minh'alma aniquilar
E vencer-me de todo
Então - eu me ergo mais - e desvairando o olhar
- Divinamente doido -
Eu rio, rio muito e rio - até chorar!...
- O lábio ermo da prece; o peito ermo da crença -
A estrela - rubra e imensa
De meu destino atroz, aspérrimo e sangrento!...
E embora sobre mim flamívoma suspensa
Em minh'alma os clarões fatais ela concentre
Eu suporto-lhe bem o flamejante baque
- Altivamente calmo - entricheirando-me entre
Uma canção de Byron
E um cálix de cognac...
- Não há dor que resista ao som de uma risada! --
Depois - se me exacerbo
E tremo e choro erguendo a prece à alma magoada
Mais me dói essa dor, mais esse mal é acerbo!
Assim - eu resolvi, indiferente e frio
Cheio de orgulho e spleen - como um banqueiro inglês!
Sepultar na ironia o pranto meu sombrio...
Por isso quando atroz na triste palidez
De minha fronte paira amarga ideia - eu rio!...
E quando pouco a pouco
Essa ideia me abate e vence-me alterosa
De amargores repleta - eu rio como um louco...
E se ela inda dói mais e forte e tenebrosa
Sói a último ideal de minh'alma aniquilar
E vencer-me de todo
Então - eu me ergo mais - e desvairando o olhar
- Divinamente doido -
Eu rio, rio muito e rio - até chorar!...
Euclides da Cunha, Estâncias; BH, 02101102011.
Les beaux yeux sauvent beaux vers!...
V. Hugo
Meu pobre coração tão cedo aniquilado
Na ardência das paixões - ó pálida criança -
Revive à doce luz do teu olhar magoado
E cheio de ilusões, de crenças e esperança
Faz o castelo ideal das louras utopias
- Com os brilhos desse olhar e o ouro de tua trança! -
Quando sobre as sombrias
Ondas - vasto luar esplêndido se espalma
De todo o seu negror, arranca as ardentias
De teu olhos assim à luz divina e calma
Dimanam - cintilando - as ilusões e os versos
Das sombras de minh'alma...
E sonho e canto e rio e me deslumbro... imersos
- No místico luar que sobre mim derramas -
Fulguram como sóis meus ideais dispersos!...
Fulguram como sóis - entre sonoras flamas -
Partindo no meu peito a tétrica penumbra
E o silêncio fatal de dolorosos dramas...
E tudo hoje antes tem luz, tem voz - deslumbra -
Pois - tal como um ideal - uma canção ressumbra -
E em cada uma canção - o teu olhar cintila...
V. Hugo
Meu pobre coração tão cedo aniquilado
Na ardência das paixões - ó pálida criança -
Revive à doce luz do teu olhar magoado
E cheio de ilusões, de crenças e esperança
Faz o castelo ideal das louras utopias
- Com os brilhos desse olhar e o ouro de tua trança! -
Quando sobre as sombrias
Ondas - vasto luar esplêndido se espalma
De todo o seu negror, arranca as ardentias
De teu olhos assim à luz divina e calma
Dimanam - cintilando - as ilusões e os versos
Das sombras de minh'alma...
E sonho e canto e rio e me deslumbro... imersos
- No místico luar que sobre mim derramas -
Fulguram como sóis meus ideais dispersos!...
Fulguram como sóis - entre sonoras flamas -
Partindo no meu peito a tétrica penumbra
E o silêncio fatal de dolorosos dramas...
E tudo hoje antes tem luz, tem voz - deslumbra -
Pois - tal como um ideal - uma canção ressumbra -
E em cada uma canção - o teu olhar cintila...
Euclides da Cunha, Três dias esplêndidos; BH, 02101102011.
Nestes três dias esplêndidos
Em que o Prazer tudo arrasa
Desde o cristão ao ateu,
Quem se sente neurastênico
Faz como eu,
Fica em casa.
Em que o Prazer tudo arrasa
Desde o cristão ao ateu,
Quem se sente neurastênico
Faz como eu,
Fica em casa.
sábado, 19 de novembro de 2011
Álvaro de Campos/Fernando Pessoa, Saudação a Walt Whitman; BH, 01801102011.
I
Portugal-Infinito, onze de junho de mil novecentos e quinze...
Hé-lá-á-á-á-á-á-á!
De aqui, de Portugal, todas as épocas do meu cérebro,
Saúdo-te, Walt, saúdo-te, meu irmão em Universo,
Ó sempre moderno e eterno, cantor dos concretos absolutos,
Concubina fogosa do universo disperso,
Grande pederasta roçando-te contra a diversidade das coisas,
Sexualizado pelas pedras, pelas árvores, pelas pessoas, pelas profissões,
Cio das passagens, dos encontros casuais, das meras observações,
Meu entusiasta pelo conteúdo de tudo,
Meu grande herói entrando pela Morte dentro aos pinotes,
E aos urros, e aos guinchos, e aos berros saudando-te em Deus!
Cantor da fraternidade feroz e terna com tudo,
Grande democrata epidérmico, contíguo a tudo em corpo e alma,
Carnaval de todas as ações, bacanal de todos os propósitos,
Irmão gêmeo de todos os arrancos,
Jean-Jacques Rousseau do mundo que havia de produzir máquinas,
Homero do insaisissable do flutuante carnal,
Shakespeare da sensação que começa a andar a vapor,
Milton-Shelley do horizonte da Eletricidade futura!
Incubo de todos os gestos,
Espasmo pra dentro de todos os objetos de fora,
Souteneur de todo o Universo,
Rameiro de todos os sistemas solares, paneleiro de Deus!
Eu de monóculo e casaco exageradamente cintado,
Não sou indigno de ti, bem o sabes, Walt,
Não sou indigno de ti, basta saudar-te para o não ser...
Eu tão contíguo à inércia, tão facilmente cheio de tédio,
Sou dos teus, tu bem sabes, e compreendo-te e amo-te,
E embora te não conhecesse, nascido pelo ano em que morias,
Sei que me amaste também, que me conheceste, e estou contente.
Sei que me conheceste, que me contemplaste e me explicaste,
Sei que é isso que eu sou, quer em Brooklyn Ferry dez anos antes de eu nascer,
Quer pela rua do Ouro acima pensando em tudo que não é a rua do Ouro,
E conforme tu sentiste tudo, e cá estamos de mãos dadas,
De mãos dadas, Walt, de mãos dadas, dançando o universo na alma.
Quantas vezes eu beijo o teu retrato.
Lá onde estás agora (não sei onde é mais Deus)
Sentes isto, sei que o sentes, e os meus beijos são mais quentes (em gente)
E tu assim é que os queres, meu velho, e agradeces de lá,
Sei-o bem, qualquer coisa mo diz, um agrado no meu espírito,
Uma ereção abstrata e indireta no fundo da minha alma.
Nada do engageant em ti, mas ciclópico e musculoso,
Mas perante o universo a tua atitude era de mulher,
E cada erva, cada pedra, cada homem era para ti o Universo.
Meu velho Walt, meu grande Camarada, evohé!
Pertenço à tua orgia báquica de sensações-em-liberdade,
Sou dos teus, desde a sensação dos meus pés até à náusea em meus sonhos,
Sou dos teus, olha pra mim, de aí desde Deus vês-me ao contrário:
De dentro para fora...
Meu corpo é o que advinha, vês a minha alma -
Essa vês tu propriamente e através dos olhos dela o meu corpo -
Olha para mim: tu sabes que eu, Álvaro de Campos, engenheiro,
Poeta sensacionista,
Não sou teu discípulo, não sou teu amigo, não sou teu cantor,
Tu sabes que eu sou Tu e estás contente com isso!
Nunca posso ler os teus versos a fio...
Há ali sentir de mais...
Atravesso os teus versos como a uma multidão aos encontrões de mim,
E cheira-me a suor, a óleos, a atividade humana e mecânica
Nos teus versos, a certa altura não sei se leio ou se vivo,
Não sei se estou aqui, de pé sobre a terra natural,
Ou de cabeça pra baixo, pendurado numa espécie de estabelecimento,
No teto natural da tua inspiração de tropel,
No centro do teto da tua intensidade inacessível.
Abram-me todas as portas!
Por força que hei-de passar!
Minha senha?
Walt Whitman!
Mas não dou senha nenhuma...
Passo sem explicações...
Se for preciso meto dentro as portas...
Sim - eu franzino e civilizado, meto dentro as portas,
Porque neste momento não sou franzino nem civilizado,
SOU EU, um universo pensante de carne e osso, querendo passar,
E que há-de passar por força, porque quando quero passar sou Deus!
Tirem esse lixo da minha frente!
Metam-me em gavetas essas emoções!
Daqui pra fora, políticos, literatos,
Comerciantes pacatos, polícia, meretrizes, souteneurs,
Tudo isso é a letra que mata, não o espírito que dá a vida.
O espírito que dá a vida neste momento sou EU!
Que nenhum filho da puta se me atravesse no caminho!
O meu caminho é pelo infinito fora até chegar ao fim!
Se sou capaz de chegar ao fim ou não, não é contigo, deixa-me ir.
É comigo, com Deus, com o sentido-eu da palavra infinito...
Pra frente!
Meto esporas!
Sinto as esporas, sou o próprio cavalo em que monto,
Porque eu, por minha vontade de me consubstanciar com Deus,
Posso ser tudo, ou posso ser nada, ou qualquer coisa,
Conforme me der na gana...
Ninguém tem nada com isso...
Loucura furiosa!
Vontade de ganir, de saltar,
De urrar, zurrar, dar pulos, pinotes, gritos com o corpo,
De me cramponner às rodas dos veículos e meter por baixo,
De me meter adiante do giro do chicote que vai bater,
De ser o volante de todas as máquinas e a velocidade sem limite,
De ser o esmagado, o deixado, o deslocado, o acabado,
E tudo para de cantar, para te saudar,
Dança comigo, Walt, lá do outro mundo esta fúria,
Salta comigo neste batuque com os astros,
Cai comigo sem forças no chão,
Esbarra comigo tonto nas paredes,
Parte-te e esfrangalha-te comigo
Em tudo, por tudo, à roda de tudo, sem tudo,
Raiva abstrata do corpo fazendo maelstroms na alma...
Arre!
Vamos lá pra frente!
Se o próprio Deus impede, vamos lá pra frente...
Não faz diferença...
Vamos lá pra frente
Vamos lá pra frente sem ser para parte nenhuma...
Infinito!
Universo!
Meta sem meta!
Que importa?
Pum!pum!pum!pum!pum!
Agora, sim, partamos, vá lá pra frente, pum!
Pum
Pum
Heia... heia... heia... heia... heia...
Desencadeio-me como uma trovoada!!
Em pulos da alma a ti,
Com bundas militares à frente prolongo a saudar-te...
Com um grande cortejo e uma fúria de berras e saltos
Estardalhaço a gritar-te
E dou-te todos os vivas a mim e a ti e a Deus
E o universo anda à roda de nós como um carrossel com música dentro dos nossos crânios,
E tendo luzes essenciais na minha epiderme anterior
Eu, louco de musical ébrio das máquinas,
Tu a sensualidade ponto
Eu a sensualidade curiosamente nascente até da inteligência
Tu a inteligência
11/6/1915
II
Porta pra tudo!
Ponte pra tudo!
Estrada pra tudo!
Tua alma onívera,
Tua alma ave, peixe, fera, homem, mulher,
Tua alma os dois onde estão dois,
Tua alma o um que são dois quando dois são um,
Tua alma seta, raio, espaço,
Amplexo, nexo, sexo, Texas, Carolina, New York,
Brooklyn Ferry à tarde,
Brooklyn Ferry das idas e dos regressos,
Libertad!
Democracy!
Século vinte ao longe!
Pum! pum! pum! pum! pum!
PUM!
Tu, o que eras, tu o que vias, tu o que ouvias,
O sujeito e o objeto, o ativo e o passivo,
Aqui e ali, em toda a parte tu,
Círculo fechando todas as possibilidades de sentir,
Marco miliário de todas as coisas que podem ser,
Deus Termo de todos os objetos que se imaginem e és tu!
Tu Hora,
Tu minuto,
Tu Segundo!
Tu intercalado, liberto, desfraldado, ido,
Intercalamento, libertação, ida, desfraldamento,
Intercalador, libertador, desfraldador, remetente,
Carimbo em todas as cartas,
Nome em todos os endereços,
Mercadoria, entregue, devolvida, seguindo...
Comboio de sensações a alma-quilômetros à hora,
À hora, ao minuto, ao segundo.
PUM!
E todos estes ruídos naturais, humanos, de máquinas
Todos eles vão juntos, tumulto completo de tudo,
Cheios de mim até ti, saudar-te
Cheios de mim até ti,
Vão gritos humanos, vão choros de terra,
Vão volumes dos montes,
Vão os rumores de águas,
Vão os barulhos da guerra,
Vão os estrondos,
Vão os ruídos dos povos em lágrimas,
Vão os sons débeis dos ais no escuro
E vão mais cerca da vida, rodeando-me,
Prêmio melhor do meu saudar-te
Os ruídos, cicios, assobios dos comboios
Os ruídos modernos e das fábricas,
Som regular,
Rodas,
Volantes,
Hélices
Pumn...
III
Hé-la que eu vou chamar
Ao privilégio ruidoso e ensurdecedor de saudar-te
Todo o formilhamento humano do Universo,
Todos os modos de todas as emoções,
Todos os feitios de todos pensamentos,
Todas as rodas, todos os volantes, todos os êmbolos da alma.
Heia que eu grito
E nem cortejo de Mim até ti estardalhaçam
Com uma algaravia metafísica e real,
Com um chinfrim de coisas passado por dentro sem nexo.
Ave, salve, viva, ó grande bastardo de Apolo,
Amante impotente e fogoso das nove musas e das graças,
Funicular do Olimpo até nós e de nós ao Olimpo,
Fúria do moderno concretado em mim,
Espasmo translúcido de ser,
Flor de agirem os outros,
Festa porque há a Vida,
Loucura porque não há vida bastante em um p'ra ser todos
Porque ser é ser bastardo e só Deus nos servia.
Ah, tu que cantaste rudo, deixaste tudo por cantar.
Quem pode vibrar mais que o seu corpo em seu corpo,
Quem tem mais sensações que as sensações por ter?
Quem é bastante quando nada basta?
Quem fica completo quando um só vinco de erva
Fica com a raiz fora, do seu coração?
IV
Por isso é a ti que endereço
Meus versos saltos, meus versos pulos, meus versos espasmos,
Os meus versos-ataques-histéricos,
Os meus versos que arrastam o carro dos meus nervos.
Aos trambolhões me inspiro,
Mal podendo respirar, ter-me-de-pé me-exalto,
E os meus versos são eu não poder estoirar de viver.
Abram-me todas as janelas!
Arranquem-me todas as portas!
Puxem a casa toda para cima de mim!
Quero viver em liberdade no ar,
Quero ter gestos fora do meu corpo,
Quero correr como a chuva pelas paredes abaixo,
Quero ser pisado nas estradas largas como as pedras,
Quero ir, como as coisas pesadas, para o fundo dos mares,
Como uma voluptuosidade que já está longe de mim!
Não quero fechos nas portas!
Não quero fechaduras nos cofres!
Quero intercalar-me, imiscuir-me, ser levado,
Quero que me façam pertença doída de qualquer outro,
Que me despejem dos caixotes,
Que me atirem aos mares,
Que me vão buscar a casa com fins obscenos,
Só para não estar sempre aqui sentado e quieto,
Só para não estar simplesmente escrevendo estes versos!
Não quero intervalos no mundo!
Quero a contiguidade penetrada e material dos objetos!
Quero que os corpos físicos sejam uns dos outros como as almas
Não só dinamicamente, mas estaticamente também!
Quero voar e cair de muito alto!
Ser arremessado como uma granada!
Ir parar a...
Ser levado até...
Abstrato auge no fim de mim e de tudo!
Clímax e ferro e motores!
Escadaria pela velocidade acima, sem degraus!
Bomba hidráulica desancorando-me as entranhas sentidas!
Ponham-me grilhetas só para eu as partir!
Só para eu as partir com os dentes, e que os dentes sangrem
Gozo masoquista, espasmódico a sangue, da vida!
Os marinheiros levaram-me preso.
As mãos apertaram-me no escuro.
Morri temporariamente de senti-lo.
Seguiu-se a minh'alma a lamber o chão do cárcere privado,
E a cega-rega das impossibilidades contornando o meu acinte.
Pula, salta, toma o freio nos dentes,
Pégaso-ferro-em-brasa das minhas ânsias inquietas,
Paradeiro indeciso do meu destino a motores!
Salta, pula, embandeira-te,
Deixa a sangue o rasto na imensidade noturna,
A sangue quente, mesmo de longe,
A sangue fresco mesmo de longe,
A sangue vivo e frio no ar dinâmico a mim!
Salta, galga, pula,
Ergue-te, vai saltando
V
Numa grande marche aux flambeaux-todas-as-cidades-da-Europa,
Numa grande marcha guerreira a indústria e comércio e ócio,
Numa grande corrida, numa grande subida, numa grande descida
Estrondeando, pulando, e tudo pulando comigo,
Salto a saudar-te,
Berro a saudar-te,
Desencadeio-me a saudar-te, aos pinotes, aos pinos, aos guinos!
Hé-la
Ave, salve, viva!...
Arregimento!
Comigo, coisas!
Sigam-me, gentes!
Máquinas, artes, letras, números - comigo!
Vós, que ele tanto amou, coisas que são a terra:
Árvores sem sentido salvo verde,
Flores com a cor na alma.
Escura brancura das águas,
Rios fora dos rios,
Paz dos campos porque não são as cidades
Seiva lenta ao emergir da avareza das crostas.
VI
Onde não sou o primeiro, prefiro não ser nada, não estar lá,
Onde não posso agir o primeiro, prefiro só ver agir os outros.
Onde não posso mandar, antes quero nem obedecer.
Excessivo na ânsia de tudo, tão excessivo que nem falho,
E não falho, porque não tento.
"Ou Tudo ou Nada" tem um sentido pessoal para mim.
Mas ser universal - não o posso, porque sou particular.
Não posso ser todos, porque sou Um, um só, só eu.
Não posso ser o primeiro em qualquer coisa, porque não há o primeiro
Prefiro por isso o nada de ser apenas esse ser nada.
Quando é que parte o último comboio, Walt?
Quero deixar esta cidade, a Terra,
Quero emigrar de vez deste país, Eu,
Deitar o mundo com o que se comprova falido,
Como um caixeiro-viajante que vende navios e habitantes do interior.
O fim a motores partidos!
Que foi todo o meu ser?
Uma grande ânsia inútil -
Estéril realização com um destino impossível -
Máquina de louco para realizar o moto-contínuo,
Teorema de absurdo para a quadratura do círculo,
Travessia a nado do Atlântico, falhando na margem de cá
Antes da entrada na água, só com olhos e o cálculo,
Atirar de pedras à lua
Ânsia absurda de encontro dos paralelos Deus-vida.
Megalomania dos nervos,
Ânsia de elasticidade do corpo duro,
Raiva de meu concreto de entusiasmo abstrato
O vácuo dinâmico do mundo!
Vamos-nos embora de Ser.
Larguemos de vez, definitivamente, a aldeia-Vida
O arrebalde-Mundo de Deus
E entremos na cidade à aventura, ao rasgo
Ao auge, loucamente ao ir...
Larguemos de vez.
Quando parte, Walt, o último comboio p'ra aí?
Que Deus fui para as minhas saudades serem estas ânsias?
Talvez partindo regresse.
Talvez acabando, chegue,
Quem sabe?
Qualquer hora é a hora.
Partamos,
Vamos!
A estrada tarda.
Partir é ter ido.
Partamos para onde se fique.
Ó estrada para não-haver-estradas!
Terminus no Não-Parar!
VII
Um comboio de criança movido a corda, puxado a cordel
Tem mais movimento real do que os nossos versos...
Os nossos versos que não têm rodas
Os nossos versos que não se deslocam
Os nossos versos que, nunca lidos, não saem para fora do papel.
(Estou farto - farto da vida, farto da arte -,
Farto de não ter coisas, a menos ou a medo -
Rabo-leva da minha respiração chegando a minha vida,
Fantoche absurdo de feira da minha ideia de mim.
Quando é que parte o último comboio?)
Sei que cantar-te não é cantar-te - mas que importa!
Sei que é cantar tudo, mas cantar tudo é cantar-te,
Sei que é cantar-me a mim - mas cantar-me a mim é cantar-te a ti
Sei que dizer que não posso cantar é cantar-te, Walt, ainda...
VIII
Heia?
Heia o quê e por quê?
Que valha pensar em heia!?
Decadentes, meu velho, decadentes é que nós somos...
No fundo de cada um de nós há um Bízâncio a arder,
E nem sinto as chamas e nem sinto Bizâncio
Mas o Império finda nas nossas veias aguadas
E a Poesia foi a nossa incompetência para agir...
Tu, cantador de profissões enérgicas, Tu o Poeta do Extremo, do Forte
Tu, músculo da inspiração, com musas masculinas por destaque,
Tu, afinal, inocente em viva histeria,
Afinal apenas "acariciador da vida",
Mole ocioso, paneleiro pelo menos na intenção,
- Bem... isso era contigo - mas onde é que aí está a Vida?
Eu, engenheiro como profissão, farto de tudo e de todos,
Eu, exageradamente supérfluo, guerreando as coisas
Eu, inútil, gasto, improfícuo, pretensioso e amoral,
Boias das minhas sensações desgarradas pelo temporal,
Âncora do meu navio já quebrada profundo
Eu feito cantor da Vida e da Força - acreditas?
Eu, como tu, enérgico, salutar, nos versos -
E afinal sincero como tu, ardendo com ter a Europa no cérebro,
No cérebro e sem diques,
Na inteligência mestra e dinâmica,
Na sensualidade carimbo, projetor, marca, cheque
Pra que diabos vivemos, e fazemos versos?
Raios partam a mandriice que nos faz poetas,
A degenerescência que nos engana artistas,
O tédio fundamental que nos pretende enérgicos e modernos,
Quando o que queremos é distrair-nos, dar-nos ideia da vida
Porque nada fazemos e nada somos, a vida corre-nos lenta nas veia.
Vejamos ao menos, Walt, as coisas com plena verdade...
Bebamos isto como um remédio amargo
E concordemos em mandar à merda o mundo e a vida
Por quebranto no olhar, e não por desprezo ou aversão
Isto afinal é saudar-te?
Seja o que for, é saudar-te,
Seja o que valha, é amar-te,
Seja o que calhe, é concordar contigo...
Seja o que for é isto.
E tu compreendes, tu gostas,
Tu, a chorar no meu ombro, concordas, meu velho, comigo -
(Quando parte o último comboio? -
Vilegiatura em Deus...)
Vamos, confiadamente, vamos...
Isto tudo deve ter um outro sentido
Melhor que viver e ter tudo...
Deve haver um ponto de consciência
Em que a paisagem se transforme
E comece a interessar-nos, a acudir-nos, a sacudir-nos...
Em que comece a haver fresco na alma
E sol e campo nos sentidos despertos recentemente.
Seja onde for a Estação, lá nos encontraremos...
Espera-me à porta, Walt, lá estarei...
Lá estarei sem o universo, sem a vida, sem eu-próprio, sem nada...
E relembraremos, a sós, silenciosos, com a nossa dor
O grande absurdo do mundo, a dura inépcia das coisas
E sentirei, o mistério sentirei tão longe, tão longe, tão longe,
Tão absoluta e abstratamente longe,
Definitivamente longe.
IX
Heia o quê?
Heia por quê?
Heia pra onde?
Heia até onde?
Heia pra onde, corcel suposto?
Heia pra onde comboio imaginário?
Heia pra onde, seta, pressa, velocidade
Todas só eu a penar por elas,
Todas só eu a não tê-las por todos os meus nervos fora..
Heia pra onde, se não há onde nem como?
Heia pra onde, se estou sempre onde estou e nunca adiante
Nunca adiante, nem sequer atrás,
Mas sempre fatalissimamente no lugar do meu corpo,
Humanissimamente no ponto-pensar da minha alma,
Sempre o mesmo átomo indivisível da personalidade divina?
Heia pra onde ó tristeza de não realizar o que quero?
Heia pra onde, pra quê, o quê, sem o quê?
Heia, heia, heia, mas ó minha incerteza, pra onde?
Não escrever versos, versos a respeito do ferro,
Mas ver, ter, ser o ferro e ser os meus versos,
Versos - ferro - versos, círculo material-psíquica-eu.
(Quando parte o último comboio?)
X
A expressão, aborto abandonado
Em qualquer vão-de-escada da realidade.
O que é a necessidade de escrever versos senão a vergonha de chorar?...
O que é o desejo de fazer arte senão o adultismo pra brinquedos?!
(Quando é que parte o último comboio, Walt,
Quando é que parte o último comboio?)
Bonecos de minha infância com quem eu imaginava melhor que hoje
A química por baixo do Aqui jaz...
A dor, febre que hoje é química só, lá longe na cavada encosta
À hora em que era costume ele vir pra casa
E o mesmo candeeiro hoje iluminado.
E apenas o silêncio já sem nos dizer que o fazem por se terem calado.
XI
Para saudar-te
Para saudar-te como se deve saudar-te
Preciso tornar os meus versos corcel,
Preciso tornar os meus versos comboio,
Preciso tornar os meus versos seta,
Preciso tornar os versos pressa,
Preciso tornar os versos nas coisas do mundo
Tudo cantavas, e em ti cantava tudo.
Tolerância magnífica e prostituída
A das tuas sensações de pernas abertas
Para os detalhes e os contornos do sistema do universo
XII
Abram falência à nossa vitalidade!
Escrevemos versos, cantamos as coisas-falências; não as vivemos,
Como poder viver todas as vidas e todas as épocas
E todas as formas da forma
E todos os gestos do gesto?
O que é fazer versos senão confessar que a vida não basta
O que é arte senão um esquecer de que é só isto
Adeus, Walt, adeus!
Adeus atá ao indefinido do para além do Fim.
Espera-me, se aí se pode esperar,
Quando parte o último comboio?
Quando parte?
(Quando partimos)
XIII
Choro como a criança a quem falta a lua perto,
Como o amante abandonado pela que não tem ainda,
Com o livro inexplícito do seu Reino por vir,
O que se julga em vão Motor,
Eixo do movimento dos espíritos,
Fulcro das ambições sombrias,
Auge dinâmico das tropas da ascensão,
Ou, mais claro e mais rápido,
Protoplasma do mundo matemático do futuro!
Quem sou eu, afinal, por que te saúdo?
Quem com nome e língua e sem voz?
A labuta prostituta do caldeamento
Nos altos fornos de mim!
XIV
Minha oração-cavalgada!
Minha saudação-arranco!
Quem como tu sentiu a vida individual de tudo?
Quem como tu esgotou sentir-se - a vida - sentir-nos?
Quem como tu tem sempre o sobresselente por próprio
E transborda por norma da norma - forma da Vida?
A minha alegria é uma raiva,
O meu arranco um choque
(Pá!)
Em mim...
Saúdo-te em ti ó Mestre da minha doença de saúde,
O primeiro doente perfeito da universalite que tenho
O caso-nome do "mal de Whitman" que há dentro de mim!
Sr. Walt dos Delírios Ruidosos e a Raiva!
XV
Abram todas as portas!
Partam os vidros das janelas!
Omitam fechos na vida de fechar!
Omitam a vida de fechar da vida de fechar!
Que fechar seja estar aberto sem fechos que lembrem,
Que parar seja o nome alvar de prosseguir,
Que o fim seja sempre uma coisa abstrata e ligada
Fluida a todas as horas de passar por ele!
Eu quero respirar!
Dispam-me o peso do meu corpo!
Troquem a alma por asas abstratas, ligadas a nada!
Nem asas, mas a Asa enorme de Voar!
Nem Voar mas o que fica de veloz quando cessar é voar
E não há corpo que pese na alma de ir!
Seja eu o calor das coisas vivas, a febre
Das seivas, o ritmo das ondas,
Intervalo em Ser para deixar Ser ser...!
Fronteiras em nada!
Divisões em nada!
Só Eu.
XVI
Para cantar-te,
Para saudar-te
Era preciso escrever aquele poema supremo,
Onde, mais que em todos os outros poemas supremos,
Vivesse, numa síntese completa feita de uma análise sem esquecimentos
Todo o Universo de coisas, de vidas e de almas,
Todo o Universo de homens, mulheres, crianças,
Todo o Universo de gestos, de atos, de emoções, de pensamentos,
Todo o Universo das coisas que a humanidade faz,
Das coisas que acontecem à humanidade -
Profissões, leis, regimentos, medicinas, o Destino,
Escrito a entrecruzamentos, a intersecções constantes
No papel dinâmico dos Acontecimentos,
No papirus rápido das combinações sociais,
No palimpsesto das emoções renovadas constantemente.
XVII
O verdadeiro poema moderno é a vida sem poemas,
É o comboio real e não os versos que o cantam
É o ferro dos rails, dos rails quentes, é o ferro das rodas, é o giro real delas.
E não o meu poema falando de rails e de rodas sem eles.
XVIII
No meu verso canto comboios, canto automóveis, canto vapores,
Mas no meu verso, por mais que o ice, há só ritmos e ideias,
Não há ferro, aço, rodas, não há madeiras, nem cordas,
Não há a realidade da pedra mais nula da rua,
Da pedra que por acaso ninguém olha ao pisar
Mas que pode ser olhada, pegada na mão, pisada,
E os meus versos são como ideias que podem não ser compreendidas.
O que eu quero não é cantar o ferro: é o ferro.
O que eu penso é dar só a ideia do aço - e não o aço -
O que me enfurece em todas as emoções da inteligência
É não tocar no meu ritmo que imita a água cantante
Pelo frescor real da água tocando-me nas mãos,
Pelo som visível do rio onde posso entrar e molhar-me,
Que pode deixar o meu fato a escorrer,
Onde me posso afogar, se quiser,
Que tem a divindade natural de estar ali sem literatura.
Merda!
Mil vezes merda para tudo o que eu não posso fazer.
Que tudo, Walt - ouves? - que é tudo, tudo, tudo?
Todos os raios partam a falta que nos faz não ser Deus
Para ter poemas escritos a Universo e a Realidades por nossa carne
E ter ideias-coisas e o pensamento Infinito!
Para ter estrelas reais dentro do meu pensamento-ser
Nomes-números nos confins da minha emoção-a-Terra.
XIX
Futilidade, irrealidade, estática de toda a arte,
Condenação do artista a não viver!
Ó quem nos dera, Walt,
A terceira coisa, a média entra a arte e vida
A coisa que sentiste, e não seja estática nem dinâmica,
Nem real nem irreal
Nem nós nem os outros -
Mas como até imaginá-la?
Ou mesmo apreendê-la
Mesmo sem a esperança de não a ter nunca?
A dinâmica pura, a velocidade em si,
Aquilo que dê absolutamente as coisas,
Aquilo que chegue tactilmente aos sentidos,
Construamos comboios, Walt, e não os cantemos,
Cavemos e não cantemos, meu velho, o cavador e o campo,
Provemos e não escrevamos,
Amemos e não cantemos,
Metamos dois tiros de revólver na primeira cabeça com chapéu
E não façamos onomatopeias inúteis e vãs no nosso verso
No nosso verso escrito a frio, e depois à máquina e depois impresso.
Poema que esculpisse em Móvel e Eterno a escultura,
Poema que esculpisse palavras...
Que ritmo o canto, a dança...
Poema que fosse todos os poemas,
Que dispensasse bem outros poemas,
Poema que dispensasse a Vida.
Irra, faço o que quero, estorça o que estorça no meu ser central,
Force o que force em meus nervos industriados a tudo,
Maquine o que maquine no meu cérebro furor e lucidez,
Sempre me escapa a coisa em que eu penso,
Sempre me falta a coisa que eu vou ver se me falta,
Sempre me faltam, em cada cubo, seis faces,
Quatro lados em cada quadrado do que quis exprimir,
Três dimensões na solidez que procurei perpetuar...
Sempre um comboio de criança movido a corda, a cordel,
Terá mais movimento que os meus versos estáticos e lidos,
Sempre o mais verme dos vermes, a mais química célula viva
Terá mais vida, mais Deus, que toda a vida dos meus versos,
Nunca como os duma pedra todos os vermelhos que eu descreva,
Nunca como numa música todos os ritmos que eu sugira!
Eu nunca farei senão copiar um eco das coisas,
O reflexo das coisas reais no espelho aço de mim.
A morte de tudo na minha sensibilidade (que vibra tanto!)
A secura real eterna do rio lúcido da minha imaginação!
Quero cantar-te e não posso cantar-te, Walt!
Quero dar-te o canto que te convenha,
Mas nem a ti, nem a nada, - nem a mim, ai de mim! - dou um canto...
Sou um surdo-mudo berrando em voz alta os meus gestos,
Um cego fitando à roda do olhar um invisível-tudo.
Assim te canto, Walt, dizendo que posso cantar-te!
Meu velho comentador da multiplicidade das coisas,
Meu camarada em sentir nos nervos a dinâmica marcha
Da perfeita físico-química
Da energia fundamental da aparência das coisas para Deus,
Da abstrata forma de sujeito e objeto para além da vida
Andamos a jogar às escondidas com a nossa intenção...
Fazemos arte e o que queremos fazer afinal é a vida.
O que queremos fazer já está feito e não está em nós fazê-lo,
Ou fá-lo ou melhor do que nós, mais de perto,
Mais instintivamente.
Sim, se o que nos poemas é o que vibra e fala,
O mais casto gesto da vida é mais sensual que o mais sensual dos poemas,
Porque é feito por alguém que vive, porque é Vida.
XX
Paro, escuto, reconheço-me!
O som da minha voz caiu no ar sem vida.
Fiquei o mesmo, tu estás morto, tudo é insensível...
Saudar-te foi um modo de eu querer animar-me,
Para que te saudei sem que me julgue capaz
Da energia viva de mudar alguém!
Ó coração por sarar! quem me salva de ti?
Portugal-Infinito, onze de junho de mil novecentos e quinze...
Hé-lá-á-á-á-á-á-á!
De aqui, de Portugal, todas as épocas do meu cérebro,
Saúdo-te, Walt, saúdo-te, meu irmão em Universo,
Ó sempre moderno e eterno, cantor dos concretos absolutos,
Concubina fogosa do universo disperso,
Grande pederasta roçando-te contra a diversidade das coisas,
Sexualizado pelas pedras, pelas árvores, pelas pessoas, pelas profissões,
Cio das passagens, dos encontros casuais, das meras observações,
Meu entusiasta pelo conteúdo de tudo,
Meu grande herói entrando pela Morte dentro aos pinotes,
E aos urros, e aos guinchos, e aos berros saudando-te em Deus!
Cantor da fraternidade feroz e terna com tudo,
Grande democrata epidérmico, contíguo a tudo em corpo e alma,
Carnaval de todas as ações, bacanal de todos os propósitos,
Irmão gêmeo de todos os arrancos,
Jean-Jacques Rousseau do mundo que havia de produzir máquinas,
Homero do insaisissable do flutuante carnal,
Shakespeare da sensação que começa a andar a vapor,
Milton-Shelley do horizonte da Eletricidade futura!
Incubo de todos os gestos,
Espasmo pra dentro de todos os objetos de fora,
Souteneur de todo o Universo,
Rameiro de todos os sistemas solares, paneleiro de Deus!
Eu de monóculo e casaco exageradamente cintado,
Não sou indigno de ti, bem o sabes, Walt,
Não sou indigno de ti, basta saudar-te para o não ser...
Eu tão contíguo à inércia, tão facilmente cheio de tédio,
Sou dos teus, tu bem sabes, e compreendo-te e amo-te,
E embora te não conhecesse, nascido pelo ano em que morias,
Sei que me amaste também, que me conheceste, e estou contente.
Sei que me conheceste, que me contemplaste e me explicaste,
Sei que é isso que eu sou, quer em Brooklyn Ferry dez anos antes de eu nascer,
Quer pela rua do Ouro acima pensando em tudo que não é a rua do Ouro,
E conforme tu sentiste tudo, e cá estamos de mãos dadas,
De mãos dadas, Walt, de mãos dadas, dançando o universo na alma.
Quantas vezes eu beijo o teu retrato.
Lá onde estás agora (não sei onde é mais Deus)
Sentes isto, sei que o sentes, e os meus beijos são mais quentes (em gente)
E tu assim é que os queres, meu velho, e agradeces de lá,
Sei-o bem, qualquer coisa mo diz, um agrado no meu espírito,
Uma ereção abstrata e indireta no fundo da minha alma.
Nada do engageant em ti, mas ciclópico e musculoso,
Mas perante o universo a tua atitude era de mulher,
E cada erva, cada pedra, cada homem era para ti o Universo.
Meu velho Walt, meu grande Camarada, evohé!
Pertenço à tua orgia báquica de sensações-em-liberdade,
Sou dos teus, desde a sensação dos meus pés até à náusea em meus sonhos,
Sou dos teus, olha pra mim, de aí desde Deus vês-me ao contrário:
De dentro para fora...
Meu corpo é o que advinha, vês a minha alma -
Essa vês tu propriamente e através dos olhos dela o meu corpo -
Olha para mim: tu sabes que eu, Álvaro de Campos, engenheiro,
Poeta sensacionista,
Não sou teu discípulo, não sou teu amigo, não sou teu cantor,
Tu sabes que eu sou Tu e estás contente com isso!
Nunca posso ler os teus versos a fio...
Há ali sentir de mais...
Atravesso os teus versos como a uma multidão aos encontrões de mim,
E cheira-me a suor, a óleos, a atividade humana e mecânica
Nos teus versos, a certa altura não sei se leio ou se vivo,
Não sei se estou aqui, de pé sobre a terra natural,
Ou de cabeça pra baixo, pendurado numa espécie de estabelecimento,
No teto natural da tua inspiração de tropel,
No centro do teto da tua intensidade inacessível.
Abram-me todas as portas!
Por força que hei-de passar!
Minha senha?
Walt Whitman!
Mas não dou senha nenhuma...
Passo sem explicações...
Se for preciso meto dentro as portas...
Sim - eu franzino e civilizado, meto dentro as portas,
Porque neste momento não sou franzino nem civilizado,
SOU EU, um universo pensante de carne e osso, querendo passar,
E que há-de passar por força, porque quando quero passar sou Deus!
Tirem esse lixo da minha frente!
Metam-me em gavetas essas emoções!
Daqui pra fora, políticos, literatos,
Comerciantes pacatos, polícia, meretrizes, souteneurs,
Tudo isso é a letra que mata, não o espírito que dá a vida.
O espírito que dá a vida neste momento sou EU!
Que nenhum filho da puta se me atravesse no caminho!
O meu caminho é pelo infinito fora até chegar ao fim!
Se sou capaz de chegar ao fim ou não, não é contigo, deixa-me ir.
É comigo, com Deus, com o sentido-eu da palavra infinito...
Pra frente!
Meto esporas!
Sinto as esporas, sou o próprio cavalo em que monto,
Porque eu, por minha vontade de me consubstanciar com Deus,
Posso ser tudo, ou posso ser nada, ou qualquer coisa,
Conforme me der na gana...
Ninguém tem nada com isso...
Loucura furiosa!
Vontade de ganir, de saltar,
De urrar, zurrar, dar pulos, pinotes, gritos com o corpo,
De me cramponner às rodas dos veículos e meter por baixo,
De me meter adiante do giro do chicote que vai bater,
De ser o volante de todas as máquinas e a velocidade sem limite,
De ser o esmagado, o deixado, o deslocado, o acabado,
E tudo para de cantar, para te saudar,
Dança comigo, Walt, lá do outro mundo esta fúria,
Salta comigo neste batuque com os astros,
Cai comigo sem forças no chão,
Esbarra comigo tonto nas paredes,
Parte-te e esfrangalha-te comigo
Em tudo, por tudo, à roda de tudo, sem tudo,
Raiva abstrata do corpo fazendo maelstroms na alma...
Arre!
Vamos lá pra frente!
Se o próprio Deus impede, vamos lá pra frente...
Não faz diferença...
Vamos lá pra frente
Vamos lá pra frente sem ser para parte nenhuma...
Infinito!
Universo!
Meta sem meta!
Que importa?
Pum!pum!pum!pum!pum!
Agora, sim, partamos, vá lá pra frente, pum!
Pum
Pum
Heia... heia... heia... heia... heia...
Desencadeio-me como uma trovoada!!
Em pulos da alma a ti,
Com bundas militares à frente prolongo a saudar-te...
Com um grande cortejo e uma fúria de berras e saltos
Estardalhaço a gritar-te
E dou-te todos os vivas a mim e a ti e a Deus
E o universo anda à roda de nós como um carrossel com música dentro dos nossos crânios,
E tendo luzes essenciais na minha epiderme anterior
Eu, louco de musical ébrio das máquinas,
Tu a sensualidade ponto
Eu a sensualidade curiosamente nascente até da inteligência
Tu a inteligência
11/6/1915
II
Porta pra tudo!
Ponte pra tudo!
Estrada pra tudo!
Tua alma onívera,
Tua alma ave, peixe, fera, homem, mulher,
Tua alma os dois onde estão dois,
Tua alma o um que são dois quando dois são um,
Tua alma seta, raio, espaço,
Amplexo, nexo, sexo, Texas, Carolina, New York,
Brooklyn Ferry à tarde,
Brooklyn Ferry das idas e dos regressos,
Libertad!
Democracy!
Século vinte ao longe!
Pum! pum! pum! pum! pum!
PUM!
Tu, o que eras, tu o que vias, tu o que ouvias,
O sujeito e o objeto, o ativo e o passivo,
Aqui e ali, em toda a parte tu,
Círculo fechando todas as possibilidades de sentir,
Marco miliário de todas as coisas que podem ser,
Deus Termo de todos os objetos que se imaginem e és tu!
Tu Hora,
Tu minuto,
Tu Segundo!
Tu intercalado, liberto, desfraldado, ido,
Intercalamento, libertação, ida, desfraldamento,
Intercalador, libertador, desfraldador, remetente,
Carimbo em todas as cartas,
Nome em todos os endereços,
Mercadoria, entregue, devolvida, seguindo...
Comboio de sensações a alma-quilômetros à hora,
À hora, ao minuto, ao segundo.
PUM!
E todos estes ruídos naturais, humanos, de máquinas
Todos eles vão juntos, tumulto completo de tudo,
Cheios de mim até ti, saudar-te
Cheios de mim até ti,
Vão gritos humanos, vão choros de terra,
Vão volumes dos montes,
Vão os rumores de águas,
Vão os barulhos da guerra,
Vão os estrondos,
Vão os ruídos dos povos em lágrimas,
Vão os sons débeis dos ais no escuro
E vão mais cerca da vida, rodeando-me,
Prêmio melhor do meu saudar-te
Os ruídos, cicios, assobios dos comboios
Os ruídos modernos e das fábricas,
Som regular,
Rodas,
Volantes,
Hélices
Pumn...
III
Hé-la que eu vou chamar
Ao privilégio ruidoso e ensurdecedor de saudar-te
Todo o formilhamento humano do Universo,
Todos os modos de todas as emoções,
Todos os feitios de todos pensamentos,
Todas as rodas, todos os volantes, todos os êmbolos da alma.
Heia que eu grito
E nem cortejo de Mim até ti estardalhaçam
Com uma algaravia metafísica e real,
Com um chinfrim de coisas passado por dentro sem nexo.
Ave, salve, viva, ó grande bastardo de Apolo,
Amante impotente e fogoso das nove musas e das graças,
Funicular do Olimpo até nós e de nós ao Olimpo,
Fúria do moderno concretado em mim,
Espasmo translúcido de ser,
Flor de agirem os outros,
Festa porque há a Vida,
Loucura porque não há vida bastante em um p'ra ser todos
Porque ser é ser bastardo e só Deus nos servia.
Ah, tu que cantaste rudo, deixaste tudo por cantar.
Quem pode vibrar mais que o seu corpo em seu corpo,
Quem tem mais sensações que as sensações por ter?
Quem é bastante quando nada basta?
Quem fica completo quando um só vinco de erva
Fica com a raiz fora, do seu coração?
IV
Por isso é a ti que endereço
Meus versos saltos, meus versos pulos, meus versos espasmos,
Os meus versos-ataques-histéricos,
Os meus versos que arrastam o carro dos meus nervos.
Aos trambolhões me inspiro,
Mal podendo respirar, ter-me-de-pé me-exalto,
E os meus versos são eu não poder estoirar de viver.
Abram-me todas as janelas!
Arranquem-me todas as portas!
Puxem a casa toda para cima de mim!
Quero viver em liberdade no ar,
Quero ter gestos fora do meu corpo,
Quero correr como a chuva pelas paredes abaixo,
Quero ser pisado nas estradas largas como as pedras,
Quero ir, como as coisas pesadas, para o fundo dos mares,
Como uma voluptuosidade que já está longe de mim!
Não quero fechos nas portas!
Não quero fechaduras nos cofres!
Quero intercalar-me, imiscuir-me, ser levado,
Quero que me façam pertença doída de qualquer outro,
Que me despejem dos caixotes,
Que me atirem aos mares,
Que me vão buscar a casa com fins obscenos,
Só para não estar sempre aqui sentado e quieto,
Só para não estar simplesmente escrevendo estes versos!
Não quero intervalos no mundo!
Quero a contiguidade penetrada e material dos objetos!
Quero que os corpos físicos sejam uns dos outros como as almas
Não só dinamicamente, mas estaticamente também!
Quero voar e cair de muito alto!
Ser arremessado como uma granada!
Ir parar a...
Ser levado até...
Abstrato auge no fim de mim e de tudo!
Clímax e ferro e motores!
Escadaria pela velocidade acima, sem degraus!
Bomba hidráulica desancorando-me as entranhas sentidas!
Ponham-me grilhetas só para eu as partir!
Só para eu as partir com os dentes, e que os dentes sangrem
Gozo masoquista, espasmódico a sangue, da vida!
Os marinheiros levaram-me preso.
As mãos apertaram-me no escuro.
Morri temporariamente de senti-lo.
Seguiu-se a minh'alma a lamber o chão do cárcere privado,
E a cega-rega das impossibilidades contornando o meu acinte.
Pula, salta, toma o freio nos dentes,
Pégaso-ferro-em-brasa das minhas ânsias inquietas,
Paradeiro indeciso do meu destino a motores!
Salta, pula, embandeira-te,
Deixa a sangue o rasto na imensidade noturna,
A sangue quente, mesmo de longe,
A sangue fresco mesmo de longe,
A sangue vivo e frio no ar dinâmico a mim!
Salta, galga, pula,
Ergue-te, vai saltando
V
Numa grande marche aux flambeaux-todas-as-cidades-da-Europa,
Numa grande marcha guerreira a indústria e comércio e ócio,
Numa grande corrida, numa grande subida, numa grande descida
Estrondeando, pulando, e tudo pulando comigo,
Salto a saudar-te,
Berro a saudar-te,
Desencadeio-me a saudar-te, aos pinotes, aos pinos, aos guinos!
Hé-la
Ave, salve, viva!...
Arregimento!
Comigo, coisas!
Sigam-me, gentes!
Máquinas, artes, letras, números - comigo!
Vós, que ele tanto amou, coisas que são a terra:
Árvores sem sentido salvo verde,
Flores com a cor na alma.
Escura brancura das águas,
Rios fora dos rios,
Paz dos campos porque não são as cidades
Seiva lenta ao emergir da avareza das crostas.
VI
Onde não sou o primeiro, prefiro não ser nada, não estar lá,
Onde não posso agir o primeiro, prefiro só ver agir os outros.
Onde não posso mandar, antes quero nem obedecer.
Excessivo na ânsia de tudo, tão excessivo que nem falho,
E não falho, porque não tento.
"Ou Tudo ou Nada" tem um sentido pessoal para mim.
Mas ser universal - não o posso, porque sou particular.
Não posso ser todos, porque sou Um, um só, só eu.
Não posso ser o primeiro em qualquer coisa, porque não há o primeiro
Prefiro por isso o nada de ser apenas esse ser nada.
Quando é que parte o último comboio, Walt?
Quero deixar esta cidade, a Terra,
Quero emigrar de vez deste país, Eu,
Deitar o mundo com o que se comprova falido,
Como um caixeiro-viajante que vende navios e habitantes do interior.
O fim a motores partidos!
Que foi todo o meu ser?
Uma grande ânsia inútil -
Estéril realização com um destino impossível -
Máquina de louco para realizar o moto-contínuo,
Teorema de absurdo para a quadratura do círculo,
Travessia a nado do Atlântico, falhando na margem de cá
Antes da entrada na água, só com olhos e o cálculo,
Atirar de pedras à lua
Ânsia absurda de encontro dos paralelos Deus-vida.
Megalomania dos nervos,
Ânsia de elasticidade do corpo duro,
Raiva de meu concreto de entusiasmo abstrato
O vácuo dinâmico do mundo!
Vamos-nos embora de Ser.
Larguemos de vez, definitivamente, a aldeia-Vida
O arrebalde-Mundo de Deus
E entremos na cidade à aventura, ao rasgo
Ao auge, loucamente ao ir...
Larguemos de vez.
Quando parte, Walt, o último comboio p'ra aí?
Que Deus fui para as minhas saudades serem estas ânsias?
Talvez partindo regresse.
Talvez acabando, chegue,
Quem sabe?
Qualquer hora é a hora.
Partamos,
Vamos!
A estrada tarda.
Partir é ter ido.
Partamos para onde se fique.
Ó estrada para não-haver-estradas!
Terminus no Não-Parar!
VII
Um comboio de criança movido a corda, puxado a cordel
Tem mais movimento real do que os nossos versos...
Os nossos versos que não têm rodas
Os nossos versos que não se deslocam
Os nossos versos que, nunca lidos, não saem para fora do papel.
(Estou farto - farto da vida, farto da arte -,
Farto de não ter coisas, a menos ou a medo -
Rabo-leva da minha respiração chegando a minha vida,
Fantoche absurdo de feira da minha ideia de mim.
Quando é que parte o último comboio?)
Sei que cantar-te não é cantar-te - mas que importa!
Sei que é cantar tudo, mas cantar tudo é cantar-te,
Sei que é cantar-me a mim - mas cantar-me a mim é cantar-te a ti
Sei que dizer que não posso cantar é cantar-te, Walt, ainda...
VIII
Heia?
Heia o quê e por quê?
Que valha pensar em heia!?
Decadentes, meu velho, decadentes é que nós somos...
No fundo de cada um de nós há um Bízâncio a arder,
E nem sinto as chamas e nem sinto Bizâncio
Mas o Império finda nas nossas veias aguadas
E a Poesia foi a nossa incompetência para agir...
Tu, cantador de profissões enérgicas, Tu o Poeta do Extremo, do Forte
Tu, músculo da inspiração, com musas masculinas por destaque,
Tu, afinal, inocente em viva histeria,
Afinal apenas "acariciador da vida",
Mole ocioso, paneleiro pelo menos na intenção,
- Bem... isso era contigo - mas onde é que aí está a Vida?
Eu, engenheiro como profissão, farto de tudo e de todos,
Eu, exageradamente supérfluo, guerreando as coisas
Eu, inútil, gasto, improfícuo, pretensioso e amoral,
Boias das minhas sensações desgarradas pelo temporal,
Âncora do meu navio já quebrada profundo
Eu feito cantor da Vida e da Força - acreditas?
Eu, como tu, enérgico, salutar, nos versos -
E afinal sincero como tu, ardendo com ter a Europa no cérebro,
No cérebro e sem diques,
Na inteligência mestra e dinâmica,
Na sensualidade carimbo, projetor, marca, cheque
Pra que diabos vivemos, e fazemos versos?
Raios partam a mandriice que nos faz poetas,
A degenerescência que nos engana artistas,
O tédio fundamental que nos pretende enérgicos e modernos,
Quando o que queremos é distrair-nos, dar-nos ideia da vida
Porque nada fazemos e nada somos, a vida corre-nos lenta nas veia.
Vejamos ao menos, Walt, as coisas com plena verdade...
Bebamos isto como um remédio amargo
E concordemos em mandar à merda o mundo e a vida
Por quebranto no olhar, e não por desprezo ou aversão
Isto afinal é saudar-te?
Seja o que for, é saudar-te,
Seja o que valha, é amar-te,
Seja o que calhe, é concordar contigo...
Seja o que for é isto.
E tu compreendes, tu gostas,
Tu, a chorar no meu ombro, concordas, meu velho, comigo -
(Quando parte o último comboio? -
Vilegiatura em Deus...)
Vamos, confiadamente, vamos...
Isto tudo deve ter um outro sentido
Melhor que viver e ter tudo...
Deve haver um ponto de consciência
Em que a paisagem se transforme
E comece a interessar-nos, a acudir-nos, a sacudir-nos...
Em que comece a haver fresco na alma
E sol e campo nos sentidos despertos recentemente.
Seja onde for a Estação, lá nos encontraremos...
Espera-me à porta, Walt, lá estarei...
Lá estarei sem o universo, sem a vida, sem eu-próprio, sem nada...
E relembraremos, a sós, silenciosos, com a nossa dor
O grande absurdo do mundo, a dura inépcia das coisas
E sentirei, o mistério sentirei tão longe, tão longe, tão longe,
Tão absoluta e abstratamente longe,
Definitivamente longe.
IX
Heia o quê?
Heia por quê?
Heia pra onde?
Heia até onde?
Heia pra onde, corcel suposto?
Heia pra onde comboio imaginário?
Heia pra onde, seta, pressa, velocidade
Todas só eu a penar por elas,
Todas só eu a não tê-las por todos os meus nervos fora..
Heia pra onde, se não há onde nem como?
Heia pra onde, se estou sempre onde estou e nunca adiante
Nunca adiante, nem sequer atrás,
Mas sempre fatalissimamente no lugar do meu corpo,
Humanissimamente no ponto-pensar da minha alma,
Sempre o mesmo átomo indivisível da personalidade divina?
Heia pra onde ó tristeza de não realizar o que quero?
Heia pra onde, pra quê, o quê, sem o quê?
Heia, heia, heia, mas ó minha incerteza, pra onde?
Não escrever versos, versos a respeito do ferro,
Mas ver, ter, ser o ferro e ser os meus versos,
Versos - ferro - versos, círculo material-psíquica-eu.
(Quando parte o último comboio?)
X
A expressão, aborto abandonado
Em qualquer vão-de-escada da realidade.
O que é a necessidade de escrever versos senão a vergonha de chorar?...
O que é o desejo de fazer arte senão o adultismo pra brinquedos?!
(Quando é que parte o último comboio, Walt,
Quando é que parte o último comboio?)
Bonecos de minha infância com quem eu imaginava melhor que hoje
A química por baixo do Aqui jaz...
A dor, febre que hoje é química só, lá longe na cavada encosta
À hora em que era costume ele vir pra casa
E o mesmo candeeiro hoje iluminado.
E apenas o silêncio já sem nos dizer que o fazem por se terem calado.
XI
Para saudar-te
Para saudar-te como se deve saudar-te
Preciso tornar os meus versos corcel,
Preciso tornar os meus versos comboio,
Preciso tornar os meus versos seta,
Preciso tornar os versos pressa,
Preciso tornar os versos nas coisas do mundo
Tudo cantavas, e em ti cantava tudo.
Tolerância magnífica e prostituída
A das tuas sensações de pernas abertas
Para os detalhes e os contornos do sistema do universo
XII
Abram falência à nossa vitalidade!
Escrevemos versos, cantamos as coisas-falências; não as vivemos,
Como poder viver todas as vidas e todas as épocas
E todas as formas da forma
E todos os gestos do gesto?
O que é fazer versos senão confessar que a vida não basta
O que é arte senão um esquecer de que é só isto
Adeus, Walt, adeus!
Adeus atá ao indefinido do para além do Fim.
Espera-me, se aí se pode esperar,
Quando parte o último comboio?
Quando parte?
(Quando partimos)
XIII
Choro como a criança a quem falta a lua perto,
Como o amante abandonado pela que não tem ainda,
Com o livro inexplícito do seu Reino por vir,
O que se julga em vão Motor,
Eixo do movimento dos espíritos,
Fulcro das ambições sombrias,
Auge dinâmico das tropas da ascensão,
Ou, mais claro e mais rápido,
Protoplasma do mundo matemático do futuro!
Quem sou eu, afinal, por que te saúdo?
Quem com nome e língua e sem voz?
A labuta prostituta do caldeamento
Nos altos fornos de mim!
XIV
Minha oração-cavalgada!
Minha saudação-arranco!
Quem como tu sentiu a vida individual de tudo?
Quem como tu esgotou sentir-se - a vida - sentir-nos?
Quem como tu tem sempre o sobresselente por próprio
E transborda por norma da norma - forma da Vida?
A minha alegria é uma raiva,
O meu arranco um choque
(Pá!)
Em mim...
Saúdo-te em ti ó Mestre da minha doença de saúde,
O primeiro doente perfeito da universalite que tenho
O caso-nome do "mal de Whitman" que há dentro de mim!
Sr. Walt dos Delírios Ruidosos e a Raiva!
XV
Abram todas as portas!
Partam os vidros das janelas!
Omitam fechos na vida de fechar!
Omitam a vida de fechar da vida de fechar!
Que fechar seja estar aberto sem fechos que lembrem,
Que parar seja o nome alvar de prosseguir,
Que o fim seja sempre uma coisa abstrata e ligada
Fluida a todas as horas de passar por ele!
Eu quero respirar!
Dispam-me o peso do meu corpo!
Troquem a alma por asas abstratas, ligadas a nada!
Nem asas, mas a Asa enorme de Voar!
Nem Voar mas o que fica de veloz quando cessar é voar
E não há corpo que pese na alma de ir!
Seja eu o calor das coisas vivas, a febre
Das seivas, o ritmo das ondas,
Intervalo em Ser para deixar Ser ser...!
Fronteiras em nada!
Divisões em nada!
Só Eu.
XVI
Para cantar-te,
Para saudar-te
Era preciso escrever aquele poema supremo,
Onde, mais que em todos os outros poemas supremos,
Vivesse, numa síntese completa feita de uma análise sem esquecimentos
Todo o Universo de coisas, de vidas e de almas,
Todo o Universo de homens, mulheres, crianças,
Todo o Universo de gestos, de atos, de emoções, de pensamentos,
Todo o Universo das coisas que a humanidade faz,
Das coisas que acontecem à humanidade -
Profissões, leis, regimentos, medicinas, o Destino,
Escrito a entrecruzamentos, a intersecções constantes
No papel dinâmico dos Acontecimentos,
No papirus rápido das combinações sociais,
No palimpsesto das emoções renovadas constantemente.
XVII
O verdadeiro poema moderno é a vida sem poemas,
É o comboio real e não os versos que o cantam
É o ferro dos rails, dos rails quentes, é o ferro das rodas, é o giro real delas.
E não o meu poema falando de rails e de rodas sem eles.
XVIII
No meu verso canto comboios, canto automóveis, canto vapores,
Mas no meu verso, por mais que o ice, há só ritmos e ideias,
Não há ferro, aço, rodas, não há madeiras, nem cordas,
Não há a realidade da pedra mais nula da rua,
Da pedra que por acaso ninguém olha ao pisar
Mas que pode ser olhada, pegada na mão, pisada,
E os meus versos são como ideias que podem não ser compreendidas.
O que eu quero não é cantar o ferro: é o ferro.
O que eu penso é dar só a ideia do aço - e não o aço -
O que me enfurece em todas as emoções da inteligência
É não tocar no meu ritmo que imita a água cantante
Pelo frescor real da água tocando-me nas mãos,
Pelo som visível do rio onde posso entrar e molhar-me,
Que pode deixar o meu fato a escorrer,
Onde me posso afogar, se quiser,
Que tem a divindade natural de estar ali sem literatura.
Merda!
Mil vezes merda para tudo o que eu não posso fazer.
Que tudo, Walt - ouves? - que é tudo, tudo, tudo?
Todos os raios partam a falta que nos faz não ser Deus
Para ter poemas escritos a Universo e a Realidades por nossa carne
E ter ideias-coisas e o pensamento Infinito!
Para ter estrelas reais dentro do meu pensamento-ser
Nomes-números nos confins da minha emoção-a-Terra.
XIX
Futilidade, irrealidade, estática de toda a arte,
Condenação do artista a não viver!
Ó quem nos dera, Walt,
A terceira coisa, a média entra a arte e vida
A coisa que sentiste, e não seja estática nem dinâmica,
Nem real nem irreal
Nem nós nem os outros -
Mas como até imaginá-la?
Ou mesmo apreendê-la
Mesmo sem a esperança de não a ter nunca?
A dinâmica pura, a velocidade em si,
Aquilo que dê absolutamente as coisas,
Aquilo que chegue tactilmente aos sentidos,
Construamos comboios, Walt, e não os cantemos,
Cavemos e não cantemos, meu velho, o cavador e o campo,
Provemos e não escrevamos,
Amemos e não cantemos,
Metamos dois tiros de revólver na primeira cabeça com chapéu
E não façamos onomatopeias inúteis e vãs no nosso verso
No nosso verso escrito a frio, e depois à máquina e depois impresso.
Poema que esculpisse em Móvel e Eterno a escultura,
Poema que esculpisse palavras...
Que ritmo o canto, a dança...
Poema que fosse todos os poemas,
Que dispensasse bem outros poemas,
Poema que dispensasse a Vida.
Irra, faço o que quero, estorça o que estorça no meu ser central,
Force o que force em meus nervos industriados a tudo,
Maquine o que maquine no meu cérebro furor e lucidez,
Sempre me escapa a coisa em que eu penso,
Sempre me falta a coisa que eu vou ver se me falta,
Sempre me faltam, em cada cubo, seis faces,
Quatro lados em cada quadrado do que quis exprimir,
Três dimensões na solidez que procurei perpetuar...
Sempre um comboio de criança movido a corda, a cordel,
Terá mais movimento que os meus versos estáticos e lidos,
Sempre o mais verme dos vermes, a mais química célula viva
Terá mais vida, mais Deus, que toda a vida dos meus versos,
Nunca como os duma pedra todos os vermelhos que eu descreva,
Nunca como numa música todos os ritmos que eu sugira!
Eu nunca farei senão copiar um eco das coisas,
O reflexo das coisas reais no espelho aço de mim.
A morte de tudo na minha sensibilidade (que vibra tanto!)
A secura real eterna do rio lúcido da minha imaginação!
Quero cantar-te e não posso cantar-te, Walt!
Quero dar-te o canto que te convenha,
Mas nem a ti, nem a nada, - nem a mim, ai de mim! - dou um canto...
Sou um surdo-mudo berrando em voz alta os meus gestos,
Um cego fitando à roda do olhar um invisível-tudo.
Assim te canto, Walt, dizendo que posso cantar-te!
Meu velho comentador da multiplicidade das coisas,
Meu camarada em sentir nos nervos a dinâmica marcha
Da perfeita físico-química
Da energia fundamental da aparência das coisas para Deus,
Da abstrata forma de sujeito e objeto para além da vida
Andamos a jogar às escondidas com a nossa intenção...
Fazemos arte e o que queremos fazer afinal é a vida.
O que queremos fazer já está feito e não está em nós fazê-lo,
Ou fá-lo ou melhor do que nós, mais de perto,
Mais instintivamente.
Sim, se o que nos poemas é o que vibra e fala,
O mais casto gesto da vida é mais sensual que o mais sensual dos poemas,
Porque é feito por alguém que vive, porque é Vida.
XX
Paro, escuto, reconheço-me!
O som da minha voz caiu no ar sem vida.
Fiquei o mesmo, tu estás morto, tudo é insensível...
Saudar-te foi um modo de eu querer animar-me,
Para que te saudei sem que me julgue capaz
Da energia viva de mudar alguém!
Ó coração por sarar! quem me salva de ti?
Nietzsche, Alienação Moral do Gênio; BH, 0181102011.
Pode-se observar numa certa categoria de grande espíritos
Um espetáculo penoso e às vezes assustador: seus momentos
Mais fecundos, seus voos para o alto e para longe não parecem
Estar conformes ao conjunto de sua constituição e com isso a
Ultrapassar de alguma forma ou de outra suas forças, de modo
Que sempre permanece uma deficiência e que dela resulta, com
O tempo, um defeito da máquina, o qual, por sua vez, se traduz,
Em naturezas de tão elevada intelectualidade, em todas as
Espécies de sintomas morais e intelectuais, muito mais regulamente
Do que em matérias físicas.
Esses aspectos incompreensíveis de sua natureza, o que têm de
Temeroso, de vaidoso, de odioso, de invejoso, de constrangido
E de constrangedor, e que se manifesta de repente neles, todo o
Lado excessivamente pessoal e de coação em naturezas como as
De Rousseau e de Shopenhauer, poderia muito bem ser a
Consequência de uma periódica doença do coração: esta,
Contudo, sendo consequência de uma doença nervosa e esta,
Por fim, consequência de...
Enquanto o gênio habita em nós, somos cheios de intrepidez,
Somos como loucos e pouco ligamos à saúde, à vida e à honra;
Atravessamos o dia com nosso voo mais livres que uma águia e,
Na escuridão, nos sentimos mais seguros que uma coruja.
Mas de repente o gênio nos abandona e logo um temor profundo
Nos invade: não nos compreendemos mais a nós mesmo, sofremos
Com tudo o que não vivemos, é como se estivéssemos no meio de
Rochedos nus diante da tempestade e ao mesmo tempo somos
Como lamentáveis almas de criança que se aterrorizam por qualquer
Ruído e sombra.
- Três quartos do mal cometidos na terra acontecem por covardia: e
Isso é, antes de tudo, um fenômeno fisiológico!
Um espetáculo penoso e às vezes assustador: seus momentos
Mais fecundos, seus voos para o alto e para longe não parecem
Estar conformes ao conjunto de sua constituição e com isso a
Ultrapassar de alguma forma ou de outra suas forças, de modo
Que sempre permanece uma deficiência e que dela resulta, com
O tempo, um defeito da máquina, o qual, por sua vez, se traduz,
Em naturezas de tão elevada intelectualidade, em todas as
Espécies de sintomas morais e intelectuais, muito mais regulamente
Do que em matérias físicas.
Esses aspectos incompreensíveis de sua natureza, o que têm de
Temeroso, de vaidoso, de odioso, de invejoso, de constrangido
E de constrangedor, e que se manifesta de repente neles, todo o
Lado excessivamente pessoal e de coação em naturezas como as
De Rousseau e de Shopenhauer, poderia muito bem ser a
Consequência de uma periódica doença do coração: esta,
Contudo, sendo consequência de uma doença nervosa e esta,
Por fim, consequência de...
Enquanto o gênio habita em nós, somos cheios de intrepidez,
Somos como loucos e pouco ligamos à saúde, à vida e à honra;
Atravessamos o dia com nosso voo mais livres que uma águia e,
Na escuridão, nos sentimos mais seguros que uma coruja.
Mas de repente o gênio nos abandona e logo um temor profundo
Nos invade: não nos compreendemos mais a nós mesmo, sofremos
Com tudo o que não vivemos, é como se estivéssemos no meio de
Rochedos nus diante da tempestade e ao mesmo tempo somos
Como lamentáveis almas de criança que se aterrorizam por qualquer
Ruído e sombra.
- Três quartos do mal cometidos na terra acontecem por covardia: e
Isso é, antes de tudo, um fenômeno fisiológico!
sexta-feira, 18 de novembro de 2011
Nietzsche, Para toda espécie; BH, 0181102011.
Para toda espécie de ferimento e de dano,
A alma inferior e grosseira é melhor
Constituída que a alma nobre: os perigos
Que esse corre são, portanto, forçosamente
Maiores, a probabilidade de seu fracasso e
De sua perda é realmente muito maior, por
Causa da diversidade de suas condições de
Existência.
- Na lagartixa, um dedo perdido cresce
Novamente, mas isso não acontece no
Homem.
A alma inferior e grosseira é melhor
Constituída que a alma nobre: os perigos
Que esse corre são, portanto, forçosamente
Maiores, a probabilidade de seu fracasso e
De sua perda é realmente muito maior, por
Causa da diversidade de suas condições de
Existência.
- Na lagartixa, um dedo perdido cresce
Novamente, mas isso não acontece no
Homem.
Estou vivo ainda por enquanto; BH, 0250502000; Publicado: BH, 01801102011.
Estou vivo ainda por enquanto
Por isso sofro de antofobia fobia às flores
Se inda fosse um defunto um morto um
Cadáver recém amaria o antófito espécime
De plantas vasculares superiores que têm
Flores o mesmo que fanerogano
Um vivo não pode ser um antófilo um
Amigo amante das flores botânico
A folha que entra na constituição
Do cálice ou da corola pisei
Nas flores perdi a dedicação
A amizade que as flores tinham a
Mim perdi a antofilia natural
O estado de antófago não mais
Como a minha flor predileta
Não sou mais o elemento
De composição vocabular
Com ideia de flor no anto
Do grego anthos sou contrário
À fermentação dum antizímico
Antivariólico aplicável contra a
Varíola sou a varíola floral
Averso ao dogma da trindade
O antitrinitário órfão três vezes
A figura que representa outra
No anti-tipo que sou
Que contém antítese desde
Que nasceu e antitético
Desde que morreu na antomia
Da eminência da mão desde o
Pulso ao dedo mínimo ou
Mesmo hipotênar o antitênar
Antistrumático ou o antitenar
Oposto às escrófulas a
Segunda parte da ode antiga
A inversão da ordem natural
Das palavras correlatar na
Anti-estrofe desinfetante
O antisseptificado perdão
Dos compostos do antimônio; BH, 0280502000; Publicado: BH, 01801102011.
Dos compostos de antimônio
Em que essa figura como trivalente
Meu coração antimonioso
Traz o sangue da denominação genérica
Dos mineiros minérios de antimônio
Na forma de óxidos de antimonióxido
Mas derrubo tudo que é moral
Luto contra o luto da moral
Por trazer o antimoral encarcerado
Nas masmorras dos meus calabouços
o meu jardim não encontro
O antinefrítico eficaz ou aplicável
Contra a nefrite favorável
Meu jardim não é antino
Contém dores não contém flores
Só mortas em tudo que reluto
É a minha antimonia
Meu ego contraditório
O meu oposto de mim
O antinômico antinupcial
Infenso ao casamento
À formação da família
Contrário ao lar
Ao pregar o fim do papa
Na jurisdição do antipapa
O final do tempo do seu pontificado
Que determina ser antipapado
Antipapista sectário como o
Que prega a morte ao papa
Das duas setas em relação
Aos lados dum ângulo
Quando uma delas forma
Com um lado do ângulo
O mesmo ângulo que a outra forma
Com o outro lado das anti-paralelas
Sinto-me a figura do réu
Com que se demonstra que
O réu acusado seria digno
De louvor na antiparátase
Se praticasse o ato de que o acusam
Pois ao ser a pátria da burguesia
Da elite ao ser a pátria dos políticos
Sou um apátrida antipatriota
Sou um galo de briga de rinha; RJ, 0290701981; Publicado: BH, 01801102011.
Sou um galo de briga de rinha
Um galo bom com garra bicudo
De crista sou um galo de raça
Com esporão quando entro na
Luta posso perder os dois olhos
As papas as papinhas mãos os
Pés que não desisto que não me
Entrego apanho me machuco
Mas não me abato não me
Acovardo sou um galo preto
Pode o adversário romper-me
O peito as entranhas o corpo
Pode dilacerar-me vai matar-me
Mas não vou ajoelhar-me
Se tiver de cair vou cair de pé
Esquartejado decepado mas
Vivo lúcido a lutar a brigar
Contra o luto até o final
Até à última gota de sangue
Até quando o último suspiro
Abandonar-me o peito
Sou duro de fibra ou um galo
Raro de raça pura da boa
Sou um galo de briga de rinha
Não tenho a disposição das flores; BH, 0250502000; Publicado: BH, 01801102011.
Não tenho a disposição das flores
O arranjo floral das plantas
Não tenho a antotaxia com que no
Antorismo até perco a
Substituição duma palavra
Por outra que se tem por mais
Enérgica ou mais exata
Sou mais a queda das flores
A antoptose primaveril
Em que há antonomásia
Do adjetivo antonomástico
Ai de mim, meu Santo Antônio
Valha-me meu antonino
Toda a dinastia dos Antônios
Que sucedeu a dos Césares
Na dúvida, tento ser um antologista
Um autor de antologia
Não passo dum antonídeo
Um espécime dos insetos dipteros
Que se assemelham às moscas
Mosquitos domésticos aí
Colocaram-me na camisa de força
Colocaram-me na solitária no seguro
Por ser um antomaníaco
Que manifesta antomania
Tenho amor em excesso às flores
Coisas que até os mortos têm
Quero no meu velório espicilégio,
Flores de todas as estações possíveis
Todo o antólogo possível conhecido
A coleção de hinos da Igreja Grega
O Tratado das Flores coleções
De trechos em prosa verso
O mesmo que o analecto da antologia o
Florilégio seleta crestomatia clássica
Quanto ao antojador ignorar ao
Antográfico que causará enjoos no morto
Antojadiço ao espírito a antografia
Ao enjoadiço à alma o amém na
Linguagem na descrição das flores
Levei quarenta e cinco anos; BH, 0250502000; Publicado: BH, 01801102011.
Levei quarenta e cinco anos
Para descobrir a minha esquizofrenia
Levarei mais quarenta e cinco anos
Para me curar do meu estado esquizofrênico
O instrumento químico destinado
A medir a quantidade de anidrido
Carbônico duma mistura gasosa
Esqueci antes do antracômetro
Nem cheguei a ser um antracomântico ou
Ter tudo relativo à antracomancia
Nem tento me adivinhar
Pelo exame do carvão incandescente
Pois sei que em mim
Nada vou encontrar
Só a minha alma qu
Infelizmente é semelhante ao carvão
Meu espírito semelhante ao antraz
Tudo escuro como a antracoide
O mais denso dos carvões fósseis
Negros de brilhos vítreos paupérrimo
Em substâncias voláteis de grande
Poder calórico empregado como
Combustível nos fornos da cal ou
Vidraria mas que não serve
A não ser para o antracite
Não traduz a luz necessária
Para clarear o antracífero que carrego
Nas entranhas perdidas do meu ser
Meu ego antraceno químico inorgânico
Hidrocarboneto policíclico de fórmula
C14H10 com três núcleos benzênicos
Obtidos de alcatrão de grande
Valor para a indústria de corantes
Este antozoário anônimo
Espécime da classe dos Celenterados
De pólipos com a cavidade
Gastrovascular dividida por septos
Morrerei com a esquizofrenia nos sapatos
Sonhei contigo; RJ, 0190701981; Publicado: BH, 01801102011.
Sonhei contigo
A me beijar a boca
A me tirar a roupa
A me fazer amor
Sonhei contigo
A me possuir todo
A me acariciar o corpo
A me fazer gozar
A ter orgasmos de prazer
Como só tu sabes fazer
Sonhei contigo
Era feliz
Eras feliz
Tínhamos paz
Tranquilidade serenidade
Tínhamos segurança
Confiança estabilidade
Sonhei contigo
Não foi com ninguém
Não foi com bichos
Nem foi com nada
Foi contigo
Sonhei contigo
Foi o que fiz
O sonho era bom
Era belo bonito
Éramos eu tu
Éramos tu eu
Ai acordei
Fiquei com pena
Com raiva
Com ódio
O sonho acabou
Entrei na realidade
Aa realidade é crua
É nua e triste
Não é um sonho
Sombrinha, Fogo de Saudade; BH, 01801102011.
introdução: C C E7 **Dentro do meu ser...arde uma paixão F G7 Fogo de saudade...que invade o coração E7 Am Foi sem perceber...que o amor chegou D7 G7/4 G7 Sem nem mais porque....a luz se apagou C Bm5-/7 E7 E sendo assim, a minha voz não vou calar Am D7 Gm C7 Desejo sim....que um novo sol venha brilhar F F#º C A7 Quem ama pra valer...no amor se fortalece D7 G7/4 G7 Não fiz por merecer...a dor que me entristece C Bm5-/7 E7 E sendo assim, a minha voz não vou calar Am D7 Gm C7 Desejo sim....que um novo sol venha brilhar F F#º C A7 Só quero meu lugar...nas asas dessa ilusão D7 G7 C Que tanto me fez chorar..
Não tenho o sinal do revisor; BH,0200502000; Publicado: BH, 01801102011.
Não tenho o sinal do revisor
Tipográfico para indicar
Separação de palavras que
Por erro estão juntas antífen
Perdido na errata na falha na
Falta da metáfora no pecado
Da existência mortal do estudo
Da geração dos homens de seus
Fenômenos suas reproduções
Conhecidos na antropogenia sem
Possuir o aspecto antropófobo
Daquele que aborrece ou teme os
Homens misantropo que não
Tenha horror aos homens sim
Amor que não tenha a misantropia
Sim a simpatia sem o efeito da
Antropofobia apesar de não ser
Antropocentrista nem sectário do
Antropocentrismo membro do
Sistema antropocêntrico sim da
Antropopagogia social tendente
A alargar a ação educativa para
Fora da escola da família essencial
Na preservação da humanidade
Onde os males de uretra podem ser
Medicados por espécie de vela ou
De sonda onde se medica também
Outros canais com antróforo o
Antrocele que é o acúmulo do líquido
No seio maxilar descendente do
Elemento de composição grego antron
Vocabular com ideia de cavidade seio
Gruta caverna nada com toda a
Infiltração de partículas de carvão no pulmão
Antracose tira o pulmão a vida continua
Euclides da Cunha, Viam-no sempre a divagar torvado; BH, 01801102011.
Viam-no sempre a divagar torvado
Pelas tabernas vos, - sempre seguido
De um velho cão famélico e ferido,
Bêbado - impuro, torpe e enlameado...
Veio afinal o inverno amaldiçoado!...
No negro quarto o homem enf'recido
E o cão vacilam ante empedernido,
Vil pedaço de pão - duro e gelado...
Ambos têm fome... torvo - lutulento
Ao pão gelado o miserável corre
E atira-o ao companheiro famulento
Do quarto os cantos a tatear percorre
Erguendo uma garrafa - esgota-a lento
E cambaleia e cai e arqueja e - morre!...
Pelas tabernas vos, - sempre seguido
De um velho cão famélico e ferido,
Bêbado - impuro, torpe e enlameado...
Veio afinal o inverno amaldiçoado!...
No negro quarto o homem enf'recido
E o cão vacilam ante empedernido,
Vil pedaço de pão - duro e gelado...
Ambos têm fome... torvo - lutulento
Ao pão gelado o miserável corre
E atira-o ao companheiro famulento
Do quarto os cantos a tatear percorre
Erguendo uma garrafa - esgota-a lento
E cambaleia e cai e arqueja e - morre!...
quinta-feira, 17 de novembro de 2011
Mulher; RJ, 0290701981; Publicado: BH, 01701102011.
Mulher
Seja o que Deus quiser
Entrego nas mãos de Deus
Deus mais nada
Tenhas fé paixão
Confiança segurança
No momento certo
Vai nos estender
A santa protetora mão
Não fiques desesperada
Nem entres em pânico
Tenhas calma
Não te deixes perder
Deus vem aí
Vai nos ajudar
Está perto da gente
Mulher amada
Não gosto de vê-la sofrer
Fico triste decepcionado
Confiaste em mim
Depositaste tua vida
Ao meu inteiro dispor
Entregaste-me teu amor
Nada posso fazer
É por isto que digo
Para esperares
A providência divina
Mesmo que venha a tardar
Nunca vai falhar
Então seremos felizes
Nossos problemas
Serão todos resolvidos
Tenhas fé mulher
Se ao não endeusar a elite; BH, 0280502000; Publicado,: BH, 01701102011.
Se ao não endeusar a elite
Se ao meter o pau na burguesia
Pregar morte à classe política é
Comportamento antipatriótico é
Contrário aos interesses da pátria
Sou assim só não sou como os
Políticos antipedagógicos
Contrários aos preceitos da pedagogia
Dos professores da educação do povo
Principalmente os políticos
Defensores do neoliberalismo do
Antissocial contrários à sociedade
Se há alguma coisa que sirva
Para combater a peste política
Algum fenômeno antipestoso
Até hoje não descobri
Sinto que por muito tempo
Essa classe nefasta continuará aí
Só uma boa antissepsia
Uma aplicação de desinfetante
Prevenção contra a fermentação pútrida
O desenvolvimento de germes
Será capaz de limpar
O putrefato político brasileiro
Ser antipático revulsivo de
Vida antíspase de revulsão
É assim que são os homens
Que dirigem regem o destino
Da nossa querida nação
Que da qual sou um antiquário
Um estudioso da vida
Colecionador comerciante das
Nossas antiguidades antigalhas
Espero um dia acabar
Por usar um antipsórico
Contra toda a sarna política
Que vendem entregam
Afundam o Brasil
Como gostaria dum dia; BH, 0280502000; Publicado: BH, 01701102011.
Como gostaria dum dia
Dar bom gosto à minha vida ferida
Dar paladar à minh'alma sem sabor
Apaladar infinitamente o meu espírito
Porém sou um plebeu um pobre
Não posso apalacianar minha mente
Tornar palaciana minha memória
Sou paupérrimo de cabeça
Como gostaria duma noite
Num quarto apalacionado
Ter a minha Sherazade
Com modos palacianos e de odalisca
Para me contar todas as histórias
Apalaçar meus sonhos
Guardar meu aspecto forma
No palácio do sono
Na gruta formosa
Sono apalaçado de rico
Onde possa apejar a realidade
Servir de pajem à verdade
Já que na vida real
Só sei adular a falsidade
Lisonjear a ilusão com
O mesmo pagiar à mentira
Não sei ser apaixonável ou
Capaz de apaixonar-me com fé
Ter um apaixonamento com força
Que me dê a esperança dum dia
Mudar toda a alegoria ao
Apaisanar-me sem roupas ao
Dar-me modos de trajes de paisano
Sair apaisanado nu
Pelado pelo meio das ruas
Porém como gostaria de
Meter em paiol o radicalismo
Arrecadar louros à felicidade
Armazenar alegrias para o porvir
Apaiolar no meu coração
Todos os princípios da razão
Abracei a lua; RJ, 0290701981; Publicado: BH, 01701102011.
Abracei a lua
Engoli o céu o
Sol e as estrelas
As nuvens o ar
Transformei-me
Num pássaro a voar
Bebi a chuva
A água do rio
A água do mar
Comi as flores vi
As borboletas nos
Passos pus o
Mel da abelha
Dentro do coração
Transformei meu sangue
Em melado de açúcar
Deixei o universo
Com um pulo no espaço
Ergui meu braço
Estendi no firmamento
Minh'alma azul
Cobri de areia
O meu peito
Lancei meu pensamento
No fundo do abismo
Purifiquei minha mente
Meu espírito meu ser
Não quis mais saber
De tudo que enterrei
Vomitei a sujeira
A podridão a doença
Curei-me sarei
Sorri para todos
Para a natureza bela
Fiquei feliz de novo
Transformei-me em criança
Fui viver minha infância
Procuro a Ciência que se ocupa; BH, 0280502000; Publicado: BH, 01701102011.
Procuro a Ciência que se ocupa
Da natureza moral do homem a
Antroposofia tudo mais que venha
Ser o estudo dos fenômenos químicos
Concernentes à vida humana na
Antropoquímica na doutrina segundo
Aqual os fenômenos sociológicos
Se assentam em base unicamente
Antropológica falo na antropossociologia
No efeito antropossociológico
Causado à raça humana se for
Necessário até a antropotomia
Vou autorizar o estudo da minha
Anatomia a dissecação do meu
Corpo para descobrir meus vis
Segredos sem a posse da esquizofrenia
O antropoteísmo a deificação
Da humanidade inteira procuro
Na antropossomatologia sim o
Estudo da estrutura do corpo
Humanos seu tesouro antroposomatologico
Também não transformar em deus
Não criar mito não criar um
Pensamento antropossófico o
Que pode o que não pode é
A adoração a anulabilidade
Divina a qualidade de Deus não
É anulável a atribuição de tais
Sentimentos humanos à divindade
Ou a animais ou objetos não
Devemos conceber a antropopatia
Ser concorde com o antropomorfismo
Que consente é anuente leva
Toda anualidade a confundir toda
A anuidade a enganar por não
Procurar conhecer não tentar
Entender que só o pó é o que nos espera
Esquizofrenia preciso descobrir urgente; BH, 029050200; Publicado: BH, 01701102011.
Esquizofrenia preciso descobrir urgente
A minha geografia humana levei
Quarenta e cinco anos para chegar à
Conclusão que sou um ser esquizofrênico
Só que espero não levar outros quarenta e
Cinco anos para me curar da esquizofrenia
Preciso logo duma antropogeografia
Toda a descrição do meu corpo humano
Descobrir na antropografia onde se esconde
A cura da esquizofrenia no ângulo
Antropogeográfico com o valor correto de
Minha solução o eureka antropográfico da
Resposta amar-me sem antropolatria me
Resolver sem ser antropólatra viver o teor
Antropolátrico não ser adorador de homem
Não ter adoração ao homem um anulador do
Positivismo avalidante do negativismo
Invalidante teoria do anulante tese do
Anulativo à espera do anunciador o
Anunciante da luz que anuncia a
Luminosidade que contém o anúncio da
Felicidade o anunciativo das boas novas
Que não deixa mudar o semblante apesar
Do avanço da doença ao escurecer o aspecto
Ensombrar o ar ao anuviar o firmamento
Ao chegar da noite onde todas as crianças
Se transformam em anjos em estrelas nos
Céus se transformam em pétalas de rosas
Com cheiro sabor de luar
Meu sorriso não morreu; RJ, 0290701989; Publicado: BH, 01701102011.
Meu sorriso não morreu
Meu canto não emudeceu
Nem meu grito não calou
Não se perdeu ecoou a
Natureza ouviu escutou
Meu povo falou
Mandou fazer
Quem não fizer
Vai levar um bolo
Foi assim
Que se formou
O grande motim
O povo mandou
Não fizeram
O povo revoltou-se
Botou abaixo
Incendiou destruiu
O povo ouviu
O clamor da Liberdade
Da Vitória da Esperança
Expulsou os corruptos
Os entreguistas aproveitadores
O povo lançou no poder
Quem foi escolhido
O político legítimo
Filho do povo
Vindo do povo
Com gosto do povo
Com cheiro de povo
Escancarei meu sorriso
Vi o fim
Desse regime ruim
Assinar:
Postagens (Atom)