sentada no chão do quintal
e o canarinho-da-terra
pousado no pé de mãe
psiu menino quietinho
para não espantar o passarinho
e já a querer para mim o bichinho
vou te contar um segredo
dona vininha vai te dar um
é canário-da-terra-verdadeiro
e nada entendia de criação
e numa gaiola de bambu-taquara
condenei o canoro cidadão
e sem água
e painço
e alpiste
ou ração
e o sentenciado à morte
sem reclamar nem da solidão
ou apelação
e antes não tivesse tido a ambição
de querer
ver as obras-primas de deus
mortas
na prisão mas era menino
e sem coração
e pior do que
o saci-pererê
e não só derrubava
ninhos de beija-flores
e abria os ovinhos só por maldição
e deus não perdoa quem destrói
as obras de suas mãos
e principalmente quem é criança
e não sabe fazer uma oração
a pedir a deus perdão
e para abençoar as aves a voar
e os peixes a nadar
e as galinhas a ciscar
e os galos a cantar
e os passarinhos a gorjeiar
e hoje fico triste
nos meus dias sem alegrias
só por ter matado tanta poesia
mas era moleque desgarrado
malino levado
que não sabia
mas fui castigado
por todos os meus pecados
e destinado a escrever meus prantos
até o dia no qual morrer
BH, 0160202023; Publicado: BH, 0280202023.