quinta-feira, 31 de outubro de 2024

OBRA-PRIMA DE ELTON MEDEIROS, MEU SAPATO JÁ FUROU:



Meu sapato já furou

Minha roupa já rasgouEu não tenho onde morar, onde morarMeu dinheiro acabouEu não sei pra onde vouComo é que eu vou ficar? Que eu vou ficar?Eu não sei nem mais sorrirMeu amor me abandonouSem motivo e sem razãoE pra melhorar minha situaçãoEu fiz promessa pra São Luís DurãoMeu sapato já furou
Quem me vê assimDeve até pensar que eu cheguei ao fimMas quando a minha vida melhorarEu vou zombar de quem sorriu de mimMeu sapato já furou

que queres tu meu jovem ancião

que queres tu meu jovem ancião
abobalhado de boca torta aberta
com essa caneta na mão que mais
parece uma varinha de condão? 
oh voz que clama no deserto que
virou o país oh voz rouca das ruas
enfumaçadas do brasil quero aqui
nesta folha de papel uma obra-prima
que caia do céu quero uma chuva
que mate o fogo que não mate o
povo que volte a fazer o país florir
que volte a fazer o brasil sorrir
olhemos através dos nossos olhos
vítreos a fauna exterminada a flora
dizimada o meio ambiente poluído
os mananciais contaminados oh
voz da musa divinal oh voz da
poesia celestial oh voz do poema
espiritual atendei a esse decrépito
septuagenário poeta decadente
sem dente sem mente demente 
só doente a implorar que a gente
pare de destruir o meio ambiente
neste poema cheio de dilema
amanhã será tarde demais não
teremos água amanhecerá deserto
não teremos ar não teremos mar
o que será de nós? oh voz feroz
ferina fina aquilina de morte azar
nos traga a sorte de sul a norte de
leste a oeste cabra da peste oh xente
tomara que o povo aguente esse
torrão quente esse tição na mão
povo do sertão indígena das florestas
oh vozes atendei a essa prece depressa

BH, 050902024; Publicado: BH, 03101002024.

terça-feira, 29 de outubro de 2024

quando for morrer quero morrer do jeito que morreu

quando for morrer quero morrer do jeito que morreu
federico garcia lorca a declamar bravamente um
poema ou uma poesia de minha autoria se for em
frente dum pelotão de fuzilamento também fará mais
sentido será mais simbólico morrer em vão quando
for morrer é o que não quero não avisa lá por favor
quero morrer em paz quero morrer com amor em luta
contra o terror contra o horror poeta não sente dor
toda dor do ser poeta é dor fingida sente dor quem
não é poeta sente dor quem não é poesia sente dor
quem não é poema soneto sou neto bisneto trisneto
tataraneto de preto brigão de negro confusão não de
pai joão não de pai velho cagão que enfia o rabo entre
as pernas não sabe dizer não sou capoeirista firmo
firmado no arado na foice na enxada no machado
foi-se o dia que ria para a cara feia do feitor do senhor
feudal do capataz medieval do capitão do mato
tradicional agora sou o mato a moita de espinho
cansãnção urtiga se me passar no cu vai coçar vai
queimar até sangrar grito não no primeiro açoite tomo
a chibata na mão não não não comigo não bastião
quieta lá aqui é trovão tempestade furacão coração
fraco cai por terra coração encouraçado aqui é mão de
pilão bate estaca espada de são jorge santo guerreiro
foi-se o tempo agora é foice com martelo bigorna
alavanca cravo bitelo marreta de ferreiro

BH, 050902024; Publicado: BH, 02901002024.

sábado, 26 de outubro de 2024

não quero mais amar ao próximo nem como a mim mesmo

não quero mais amar ao próximo nem como a mim mesmo
pois o próximo não está tão próximo nem quer ser amado
pois bem não quero amar a ninguém nem a alguém repito
quanto mais amar a mim mesmo que não presto também
quero mais é juntar dinheiro igual a um pastor interesseiro
para ver se diminui o meu desespero ou se fico parecido
com alguém da elite ou da burguesia para acabar com a
minha agonia então vou entrar para uma igreja seguir uma
religião para ser chamado de irmão porém sou preto filho
de negro não terei aceitação só vão me olhar por demagogia
só vão me ver por fisiologia a pedir por pedagogia
higienização só vão fazer apologia de que sou ladrão não
vão se importar se vou estudar não vão querer saber se
tenho um diploma na mão um currículo vitae na vida se
diplomei em educação vão me baixar o cacete me mandar
para o fim da fila se bobear me mandam para um caixão
apesar de tudo não quero morrer agora não mesmo se
fazem questão de me matar por inanição vou jogar futebol
então virar cantor de pagode virar cantor sertanejo não
querer saber de mais nenhum irmão tenho dinheiro no bolso
fechei com falsos políticos fascistas que se foda a história
que se foda a escravidão agora sou burguês agora sou da
elite mudei de situação sou assim feliz tenho aceitação

BH, 030902024; Publicado: BH, 02601002024.

quinta-feira, 24 de outubro de 2024

doente continuo doente incurável

doente continuo doente incurável
de doença crônica porém não
quero a cura desta doença pois a
cura desta doença seria justamente
o fim do opressor explorador
exterminador a cura seria com
alegria o fim da burguesia
o pôr abaixo a elite desigual
sugadora de sangue vampira
vendedora de armas de bombas
de tudo que causa destruição em
massa doente continuo doente
adoecido contaminado contagiado
pela extrema-direita extremista
preconceituosa controladora de
bancos igrejas empresa mercados
tudo que abastece inimigos
declarados do povo trabalhador brasileiro
da nação trabalhadora brasileira que
enfrentam pelegos vira-latas
pesudo sindicalistas pelegos que são
contra a emancipação do proletariado
nacional doente vou morrer doente
desta gana insana hidrofóbica
canina caninana venenosa sem
soro antiofídico sem vacina anti
rábica porém enterrarei comigo minha
pandemia minha peste minhas
pragas se não conseguir destruir o
poder dos que destroem o povo
trabalhador brasileiro dos que destroem
a nação trabalhadora brasileira sem poder
doente prestes a morrer em delirum tremens
porém a gritar abaixo os sistemas capitalistas
imperialistas nacional ou internacional

BH, 0300802024; Publicado: BH, 02401002024.

quarta-feira, 23 de outubro de 2024

CARTA DE DESPEDIDA DE ANTÔNIO CÍCERO:

 


ninguém gosta do que escreves

ninguém gosta do que escreves
lógico que não não escrevo
para agradar pai joão não sou
feitor nem capitão do mato 
sou preto agricultor sou negro
trabalhador só com outros olhos
quem me vê é o senhor que quer
ser feudal medieval imperial
a prolongar para sempre o meu mal
estás sempre com as mesmas arengas
do passado a rebater os mesmos assuntos
a desenterrar ossadas esqueletos caveiras
o mundo mudou o mundo é outro modernizou
porém o homem é o mesmo senhor
se deixar quer ser inquisidor torturador se
deixar quer ser explorador a escravizar de
novo sem se envergonhar a deixar morrer
de fome a deixar morrer de sede a destruir
a natureza a exterminar a fauna a pulverizar
a flora então bastião da direita então
baluarte da burguesia então altar
das elites símbolo da hipocrisia
continuarei a escrever para ver se
um dia tenha a mesma alegria que
terei a mesma felicidade igualdade
liberdade fraternidade irmandade
continuarei a te ferir com a minha poesia
continuarei a te machucar com o meu poema
continuarei a ser o teu dilema
serei a pedra na tua chuteira
o cisco no teu olho a coceira no teu cu
que não podes coçar a pensar que
sejas um público em local público

BH, 030902024; Publicado: BH, 023001002024.

alô alô brasil preciso duma obra-prima

alô alô brasil preciso duma obra-prima
para ganhar um prêmio nobel de literatura
ou duma obra de arte literária ou duma
bela arte escrita ou duma sétima arte
poética ou qualquer arte lírica musa
da poesia um soneto bem temperado 
um poema bem acabado uma ode da 
melodia ou até mesmo uma elegia ou
qualquer outra manifestação de antologia
anjos que descem dos céus em escadas de
ouro anjos que falem a linguagem dos
homens ou que até briguem com os
homens ou um anjo que queira me
aleijar para que vire um anjo torto
também cansei de ser anjo certinho
arrumadinho engomadinho agora 
quero agitação cânticos angelicais alô
alô serafins querubins arcanjos tronos
dominações virtudes poderes principados
vamos brigar entrais em ações aí aqui por
mim em qualquer lugar deixais uma marca
uma tatuagem uma cicatriz um hematoma
um aleijão todo mundo vai saber o que
aconteceu ao meu coração toda sístole
toda diástole transformarei em poemas
laureados em raios de pétalas de girassol
preces ao arrebol só tenho setenta anos
penso que ainda estou muito jovem muito
menino malino para ser transformado num
anjo torto quintana com as asas na bunda
mas teimo para que este seja meu destino

BH, 030902024; Publicado: BH, 02301002024.

terça-feira, 22 de outubro de 2024

alimento de sabedoria

alimento de sabedoria
de terra de ar de vento
de elemento de conhecimento
de discernimento só quero razão
pura depurada aplicada nas veias
nos labirintos para nunca mais
homem em nome da sabedoria
do progresso da ordem de deus
da religião da liberdade predador
exterminar natureza fauna
flora o que for alimento de
sabedoria toda noite todo dia 
para aprender a viver a fugir
da vida paliativa vegetativa  de
inteligência virtual artificial
ou superficial alimento de água
de molécula de átomo de
matéria-prima alimento
de rima de remo de rumo
de norte de sul alimento de 
firmamento de céu azul de sol de
nuvens de chuva de raios de
tempestades de trovões alimento
de furacões de vulcões para o
meu coração alimento de sangue
vampiro arterial pulsar quasar
andrômeda alimento de galáxia
constelação aglomerado de estrelas
alimento de universos diversos
de versos poesias poemas
alimento de alimento bom
ou mau elemento alimento o que sou

BH, 02101002024; Publicado: BH, 02201002024.

quinta-feira, 17 de outubro de 2024

como fazer poemas sem querer fazer poemas?

como fazer poemas sem querer fazer poemas?
como fazer poesias sem querer fazer poesias?
tantas gentes fazem tantas coisas mais importantes
fico inibido por fazer as mais insignificantes das coisas
de todas as coisas chamo tudo de todos os nomes
menos do nome certo mudo o roteiro a rota a órbita
que habita o universo não encontro resposta esperei
o vento esperei sozinho a sós só o sol não está no
meio da constelação não era um especialista no
assunto todos vodus me pensavam um defunto não
fala não ouve não vê o regente enfiou a batuta
noutro lugar o rei não sabia onde enfiar o cetro o
rei estava nu gritou alguém o espadachim longe
de mim o papel em branco o bêbado aos trancos
barrancos no espasmo na convulsão do epilético
na epilepsia nada acontecia nem de noite nem de
dia nem saúde nem alegria da ode o alegreto do
soneto bem feito sem defeito sem emenda sem pé
quebrado impossível continuar a viver sem um
poema de comer sem uma poesia de beber não sou
profissional meter sem tema um dilema um teorema 
só queria transpor aquela curva lá no azul do céu

BH, 01601002024; Publicado: BH, 01701002024.

domingo, 13 de outubro de 2024

ela me satisfaz dela me satisfaz nela me satisfaz

ela me satisfaz dela me satisfaz nela me satisfaz
minh'alma gozo ou paz que procurei tudo nela
encontrei para ela viverei ela me satisfaz dela me
satisfaz nela me satisfaz minh'alma estou feliz ao
lado dela ela está feliz ao meu lado nada mais
que precisamos tudo juntos executamos nós
nunca nos enganamos juntos nós levamos gozo
paz ou amor perdão nunca é preciso arrependimento
também não pois temos firmeza do coração vivemos
sem vacilação pois ela me dá a mão também dou
a mão a ela canto baixinho nos ouvidos dela esta
singela canção que só ela me satisfaz que só dela me
satisfaz que só nela me satisfaz minh'alma nunca me
vejo insatisfeito ela esconde meus defeitos realiza
meus desejos ela me satisfaz dela me satisfaz nela me
satisfaz minh'alma deita a cabeça no meu colo deito
a cabeça no colo dela o universo então para em
meditação ela está a sonhar ela está a gozar ela 
está feliz como quem diz ele me satisfaz dele me
satisfaz nele me satisfaz minh'alma gozo ou paz que
procurei tudo nele encontrei para ele viverei ele me
satisfaz dele me satisfaz nele me satisfaz minh'alma

BH, 01101002024; Publicado: BH, 01301002024.

quinta-feira, 10 de outubro de 2024

insisto sempre no mais do mesmo por covardia

insisto sempre no mais do mesmo por covardia
ou por medo o certo é que insisto sempre no
mais do mesmo não combato a burguesia como
deveria combatê-la não destruo as elites como
deveria destruí-las não ponho abaixo o sistema
como deveria pô-lo sigo a reverenciar o
capitalismo que sufoca o trabalhismo sigo a
admirar o neoliberalismo que sataniza o
comunismo desqualifica o socialismo qual um
trabalhador pelego ou um operário vira-lata ou
um proletário adesista aos patrões justifico as
ações do estado ou da sociedade contra os
trabalhadores ou contra os trabalhistas aplaudo
tudo que é colocado contra a emancipação do
proletariado forças armadas polícia federal
força nacional polícia militar polícia civil
guarda municipal milícia paramilitar que
assassina covardemente negros pretos pobres
das periferias das favelas dos guetos com as
mesmas argumentações de sempre que é tudo
bandido inveterado então não ne envergonho de
mim nem das minhas ações reacionárias
preconceituosas conservadoras estou aqui
serventuário pseudo plenipotenciário peripatético
mau boçal a rir do meu mal a relativizar o
imperialismo o genocídio indígena hiena sigo a
comer carniças que o mercado oferece sigo a
consumir carcaças sucatas a beber venenos a
respirar fumaças enxofres a ouvir aberrações de
todas as espécies espécimes em nome de deus

BH, 030902024; Publicado: BH, 01001002024.

quarta-feira, 2 de outubro de 2024

SUBLIME PERGAMINHO, UNIDOS DE LUCAS, MARTINHO DA VILA:


Quando o navio negreiro

Transportava negros africanos

Para o rincão brasileiro

Iludidos

Com quinquilharias

Os negros não sabiam

Que era apenas sedução

Pra serem armazenados

E vendidos como escravos

Na mais cruel traição

Formavam irmandades

Em grande união

Daí nasceram festejos

Que alimentavam o desejo

De libertação

Era grande o suplício

Pagavam com sacrifício

A insubordinação

E de repente

Uma lei surgiu

E os filhos dos escravos

Não seriam mais escravos

No Brasil

Mais tarde raiou a liberdade

Pra aqueles que completassem

Sessenta anos de idade

Ó sublime pergaminho

Libertação geral

A princesa chorou ao receber

A rosa de ouro papal

Uma chuva de flores cobriu o salão

E o negro jornalista

De joelhos beijou a sua mão

Uma voz na varanda do paço ecoou:

Meu Deus, meu Deus!

Está extinta a escravidão

qualquer inspiração inorgânica

qualquer inspiração inorgânica
pode acalentar o meu coração já
que o cérebro de cérbero não
tem capacidade de atração ou de
atrair um único raio de sol
mesmo do que seja o mais frio
que o sol mandou em direção ao
universo qualquer inspiração
pode até ser um ponto que para
o bom entendedor um ponto é
letra ou pode até ser uma letra
que também para o bom
interpretador também pode
representar uma palavra que
forma um verso ser uma poesia
é que sinto falta de qualquer
coisa que nem sei o que é então
falo que é falta de inspiração
falta dum soneto irmão ou neto
duma mão amiga que não seja
fantasmagórica que segure uma
pena transforme em milagre o
sangue da hemorragia transforme
o mundo o homem o universo o
cosmos alguma coisa precisa
acontecer para que não morra em
vão detesto morrer em vão se for
para morrer em vão nem quero
morrer quero continuar a sofrer ou
a fingir que sofro que sou um
sofredor mas sou é um fingidor já
fui até chamado de fingidor
publicamente dos mais falsos já
conhecidos desde que a humanidade é
humanidade o ser humano é ser humano
a raça humana é raça humana

BH, 060802024; Publicado: BH, 0201002024.

terça-feira, 1 de outubro de 2024

a escrever freneticamente febrilmente

a escrever freneticamente febrilmente
com o universo a abrir-se à minha frente
vejo os organismos os intestinos as tripas
as estranhas entranhas as veias cósmicas
os vasos dos astros o sangue sideral o 
suco gástrico a bílis a seiva a geleia geral
a placenta com tudo que se pode imaginar
ao querer transcender plenitude dimensão
universal o pulsar dentro da cabeça de
cabaça quântica o quasar no buraco negro
a ser costurado com as linhas dos
horizontes dos alinhamentos interplanetários
trançadas com as linhas paralelas numa
agulha feita dum raio de sol o boneco do
astronauta ficou completo depois de
remendado voltou ao planeta extinto
não encontrou distinto o sistema abaixo
desfeito a espera duma explosão que
criará um novo caos sem caô com novas
dimensões nas realidades nas fantasias
nas fatalidades seus pensamentos ninguém
ainda aprendeu a falar o vento não ensinou
a resposta não assinou a teoria não abriu a 
mente para a luz que cega mais do que 
ilumina pois quando o ser não quer ver 
não há luz que o faça nascer pois morre ali
mesmo sem nem saber que morreu

BH, 02008002024; Publicado: BH, 01º01002024.