terça-feira, 3 de junho de 2025

antes de morrer vou parir uma obra-prima

antes de morrer vou parir uma obra-prima 
ou uma obra-irmã ou uma obra-filha não
interessa antes de morrer vou parir uma obra de
arte talvez até pior do que todas as obras de
pedro malabares antes de morrer vou dar à luz à uma poesia iluminada que clareie as clareiras
que aqueça as lareiras vou dar à luz a um
poema mesmo sujo de pus ou ainda coberto de
placenta vou arrebentar a bolsa na calçada 
deixar cair o rebento do soneto órfão que veio
da escuridão estatelou-se no chão todos
passarão por cima como se estivessem a voar
sem asas todos ignorarão tudo que for expelido
por mim gravetos espinhos seixos pedras
pregos ciscos lixos imagens invisíveis sons
inaudíveis matérias decompostas rimas
assassinadas iguais aos povos pretos pobres
das periferias iguais aos povos originários
expulsos por nós de suas terras iguais aos
quilombolas banidos dos seus terreiros
terrenos onde eram seus quilombos antes de
morrer darei à luz a uma frase luminosa em
praça pública em pleno meio-dia que ofuscará o
sol essa frase ainda não foi pensada por
nenhum livre pensador muito menos por um
pensador livre essa frase deuses demônios
anjos entidades universais espaciais doutras
dimensionais entes doutros elementos entrarão
em conflitos aflitos pela autoria dessa frase
luminosa que direi um dia em praça pública em
pleno meio-dia antes de morrer em agonia

BH, 0230402025; Publicado: BH, 030602025.

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