terça-feira, 28 de junho de 2022

E chego ao final sem vitória.

E chego ao final sem vitória
E o certo é que todo mundo chega ao final
Com vitória mas como sou diferente e
Chego ao final sem vitória e sem história
E para que história se toda história é
Uma mentira? e para que vitória 
Se todo vencedor é um perdedor? e 
Chego ao final animal sem ideal 
E sem ideia e que não evoluiu e 
Nem revolucionou e nem modernizou
O universo e chego ao final conservador
E preconceituoso e misógino e
Homofóbico e reacionário e capitalista
E neoliberal e globalizado e imperialista
E nazista e direitista e anticomunista
E anti socialista e racista e religioso
Fundamentalista armamentista e nacionalista
E contra os sem tetos e contra os sem terras
E contra os índios e os indígenas e ambientalistas
E contra os quilombolas e patronal e 
Patriarcal e chego ao final irracional
A queimar mendigos debaixo das marquises
A exterminar população de rua e a 
Atropelar animais abandonados e a 
Ser conivente com a pedofilia e os 
Estupros e a violência contra as mulheres
E confinamento de favelados e
Suburbanos e discriminação dos mais
Pobres e chego ao final a pensar na meritocracia
De louros para mim e os meus maus 
Pensamentos e mandamentos e
Argumentos e desmandamentos
E mórbidos sentimentos e medonhos
Sentidos e macabras direções e bizarras
Realizações e bisonhas falações e monstruosos 
Comportamentos e chego ao final sobrenatural
Com minhas assombrações sem limitações.

BH, 02001102020; Publicado: BH, 0280602022.

(FIM DA APOSTILA DE ESTUDOS POÉTICOS E 
PROSAICOS NÃO TÃO POÉTICOS E NEM TÃO 
PROSAICOS ASSIM.)

nesta apostila de estudos poéticos

nesta apostila de estudos poéticos
e prosaicos não tão poéticos
e nem tão prosaicos assim não se aprende 
nada nem de poesia
e nem de prosa
e não passa dum passatempo dum
vagabundo sem tempo a vadiar na
vagabundagem
e dum vadio a vagabundear na vadiagem do tempo
e ainda mais agora que está a se 
provar cientificamente que o tempo
não existe
e queria ver quem vai passar o tempo
ou matar o tempo 
ou ter tempo para alguma coisa
e então tudo que se diz a respeito do 
tempo não foi dito
ou foi desdito
ou perdeu a valia
e a correria não tem mais serventia
e a hora
e o dia
e quem diria que um dia ia se dizer 
que o tempo não existia
e então quem inventará nova tese
ou nova teoria
ou nova ciência
ou nova filosofia
e nova psicologia
e nova psiquiatria para direcionar rumos 
aos novos loucos que surgirão nas alegorias
e quem terá tristeza
e quem terá alegria
e o que será do poema
e o que será da poesia
e da saudade
e da nostalgia as únicas coisas que me alimentam
e são o meu pão de cada dia
e vou seguir o sol
e de noite a lua lobisomem
é o que sei fazer nesta agonia de homem

BH, 0260602022; Publicado: BH, 0280602022.

segunda-feira, 27 de junho de 2022

sensação é para vivo

sensação é para vivo
morto sente é calafrio
na calada da noite
no arrepio no fundo da campa
num lugar arredio longe onde
se dane a gritar de frio
e o osso congelado esfarela
e o esqueleto se esgoela
e a caveira se esgueira
nas sombras dos muros
dos cemitérios a se disfarçar na
cal a aproveitar a se camuflar
com os ossos de marfim
e mesmo quando vem da lua a luz
ninguém repara passeia entre
os seres transparentes
a se fazer de gente
e não há quem comporta
sensação de morto é diferente
é se quedar quieto indigente
no quarto em travas gemente
a esfolar os cotovelos
a ralar os joelhos
a despelar os tornozelos
a ferir as cicatrizes
a raspar as tatuagens
a decifrar as estrias 
e os códigos genéticos
e secretos de mistérios afins
nas raízes dos jardins
nas pétalas dos jasmins
nos cálices das corolas
das floras das copas das árvores
doutrora no apogeu da aurora
e sensação é para vivo
quando chega a hora

BH, 0260602022; Publicado: BH, 0270602022.

negro chegou à senzala da casa grande no útero da mãe escrava

negro chegou à senzala da casa grande no útero da mãe escrava
cativa estuprada que trabalhou toda as idades
infantil adulta idosa a labutar sem parar
negro a viu cair morta no terreiro
e nem pode acompanhar o que se chamou de enterro
e o capataz disse que tinha muita coisa para se
fazer
e de longe viu o corpo roto da mãe ser jogado numa
vala rasa que mais parecia um esgoto mas com alguns
punhados de terra por cima
e não podia parar de trabalhar
e ali serviu desde menino aos serviçais da senzala
e aos capatazes da fazenda
e aos senhores de engenhos da casa grande até
à idade avançada também já anoso alquebrado
e o capataz chefe o chamou 
negro fostes vendido para uma fazenda na bahia
de trabalho mais leve aqui não aguentas a fazer quase nada
e lá pelo menos vais ganhar para pagares o que comes
pois o senhor patrão não vai te manter aqui só a comer
e a beber
e a dormir
e sem fazeres nada
negro mas senhor chefe capataz cheguei aqui
na barriga da mãe
e vivi
e trabalhei em todos os quintais
e terreiros
e terrenos
e colheitas
e tenho pouco tempo de vida
e me deixa morrer aqui
e deus te ajuda
o senhor me joga na mesma valeta junto de mãe
e de jeito nenhum
e amanhã teus novos donos vêm te buscar
e naquela noite negro não dormiu
e fez mumunhas
e sussurrou
e chorou em zumbidos mandingas
e soluçou rezas
e suspirou cantos
e cantigas
e ladainhas baixinhas
e lundus
e ramerrames
e amargamente não sonhou
e de manhã quando vieram buscá-lo
empacou
e fez birra
e pirraçou pois queria despedir
e agradecer o patrão senhor que relutou em
comparecer à presença do negro mas foi
negro disse patrão aqui vivi os meus dias bons
e maus
e como não sirvo mais fui vendido
e perto do rosto do senhor assoprou
e o patrão sentiu um bafo de bafio
negro partiu
naquela noite o patrão não dormiu
e tossiu
e espirrou
e escarrou
e suou
e sentiu dor a noite toda
e de manhã ao lavar o rosto sentiu uma espinha
na face que em poucos dias se tornou uma cratera
e que expôs a caveira que o matou em algums
meses sem nada curar
e do negro nunca mais se ouviu falar

BH, 01901102020; Publicado: BH, 0270602022.

no escuro corredor da morte não há luz no início

no escuro corredor da morte não há luz no início
nem no meio
e nem no fim
e no vão da escada sem corrimão
só o abismo do espaço aberto
e uma alma pendida na corda bamba
oscila entre a fenda
e o lance seguinte sem reguinte de cabeça contra a parede
que resistiu ao tempo sentado no meio do corredor
como se fosse sem querer saber de nada
e o autista ignora a si mesmo
e despreza tudo que se pensa que não se deve
desprezar
e não sente nem o sofrimento que causa aos
outros
e doente sem cura
com secura bebe pouca água
e respira pouco
e soluça muito
e debate sempre como se tivesse
um motor de vento em popa de bonecos de
animações em portas de lojas de varejos
e miudezas
e sem gostos
sem sentimentos
e sem sentidos
e sem falas
e sem dores
e na solidão desconhece o amor
e a paz
e a amizade
e vontade
e poder
e potência
e até estas letras
e estas palavras ficarão ignoradas pelo varão
que nunca teve uma varoa
e é casto como um catão
ou o vento
e é límpido
e transparente como uma lágrima pura de
diamante raro
e é poeta morto
e é uma elegia
e agita os braços brancos de neve de cordilheira dos andes
e resiste com os ossos nobres feitos dos
mármores selecionados das montanhas
e é filho de titãs de elfos de ninfas de duendes de libélulas de polifemos ciclopes que habitam
o ventre sacro da terra

BH, 01901102020; Publicado: BH, 0270602022.

e quem quer saber de denotação conotação

e quem quer saber de denotação conotação
se para se comer não tem nem pão
e se me impuseram a língua portuguesa com
tanta língua nativa
e ativa por aqui
e porque não me deram o tupi-guarani?
ou a linguagem dos lagartos linguarudos
ou os cacoetes de comunicação dos
calangos os muros
e dos sábias
e dos bem-te-vi?
mas não me ensinaram uma língua d'alem-mar
e idioma de trás dos montes
e não uma fala de fonte 
ou um canto de regato
ou uma canção de córrego
ou um riso de rio
ou um gorjeio de pássaro
e com tantos discursos
e conotações
e denotacoes na natureza viva
e me dão de presente uma morta
com tantas ondas do mar a badalar aos meus ouvidos
e ventos bentos a soprar os meus alentos
e desalentos
tormentos
e me fazem chorar em prantos de biomas
doutros universos
e em latim tradicionado ora-pro-nobis
fica sem função
e o ninho da rolinha fica sem passarinho
o meu coração em desalinho
e não choro mais chorão em chorinho
e nem oro mais em oração
ou em prece em devoção
ou em reza forte contra assombração
igual todo menino fazia pra cair bicho em alçapão
rezava à ave maria todo dia quando a noite chegava
meter medo na molecada mas sempre tinha um
mais destemido
e as meninas admiravam
e levantavam as saias
e mostravam o verdadeiro admirável mundo novo
e os segredos
e os regos
e valas
e veios
e minas dos tesouros donde os afoitos tiravam vantagens sobre os outros.

BH, 01901102020; Publicado: BH, 0270602022.

domingo, 26 de junho de 2022

Sentimento sem sentido ou direção não convém ao coração.

Sentimento sem sentido ou direção não convém ao coração
E o ser que já é pequeno vira então um anão de espírito turvado
E turbado e abalável que a alma rasga igual velho papel de ente
Que fica doente e entidade que perde a felicidade e o corpo
A vida e a vida ganha a morte e o azar ganha da sorte sem sorteio
E o sonho vira pesadelo de quem caiu num despenhadeiro e foi
Coberto pelo desmoronamento duma falésia que descia duma
Pradaria ao vale que sorria à sombra duma duna manufaturada
Grão por grão à penumbra da assombração que se aboletou nas
Costas do ancião que com ânsia vergado sem vara e sem cajado
De joelhos ralados e os punhos esfolados e os couros das mãos
Calejados com marcas de cravos cravejados e costas cicatrizadas
De feridas crônicas feitas a ferro quente e equilibrava-se no
Vácuo Atlas com o mundo nos ombros e sobrenatural o
Olho do universo mostrou o resistente calango no alto do
Muro que foi todo cimentado a manter a geração e seguiu
Seu destino de lutas pois o outro nome da natureza é seguir
É continuar a vida e a mover o universo e mesmo que seja
A última coisa que se há de fazer para registrar uma
Fenomenologia fenomenal duma cadeia universal
Orgânica ou inorgânica e cíclica ou acíclica e fechada ou
Aberta e errada ou certa e o firmamento é quem indica a
Frequência a se seguir e desde que se diga para poder
Existir e brilhar enquanto a luz quer nos resguardar
Das trevas do caminho sem lâmpadas nos pés.

BH, 01801102020; Publicado: BH, 0260602022.

O cérebro projeta imagens já até provei comigo.

O cérebro projeta imagens já até provei comigo
Mesmo que o cérebro projeta imagens como
Um projetor de cinema ou um refletor de led
Transcendental e de olhos fechados ou bem vendados
Com libras de chumbo se enxerga pela glândula
Pineal como um olho universal de olhar dimensional
E o corpo fala sem linguagens e sem letras e sem
Palavras e sem sons e a perfeição restaura a alma
E refrigera o espírito e mata-se a sede com águas
Tranquilas e cristalinas de manaciais celestiais
E mata-se a fome com manás das matas e chora-se
A natureza que ama e que é destruída e não sabe
Chorar e cura-se as doenças com os curandeiros
Das tribos guerreiras e dos pajés velhos e dos xamãs
Doutras chamas e sacerdotes e sacerdotisas que
Adotam métodos divinos com poções e pós mágicos
E mandingas doutros continentes de planetas
Diferentes gestados em placentas de galáxias
Infinitamente infinitas e vem um sol atrás doutro
E cada um com uma gravidade duma gravidez
Duma grandeza divina de luz infernal que fura
O olho do mortal e vem uma estrela atrás doutra
E cada uma com uma gestação de universos inimagináveis
E para que servem essas coisas que não servem
Para nada? pergunta o vil que não é são ao ser vão
E esmagado pelos átomos das moléculas da matéria
E a matéria gera o caos e o caos o fogo e o fogo
O homem que não torna das cinzas.

BH, 01801102020; Publicado: BH, 0260602022.

sexta-feira, 24 de junho de 2022

Nunca mais se ouviu uma canção de ninar.

Nunca mais se ouviu uma canção de ninar
E além desse nunca mais há ainda muitos
Outros nunca mais do passado no aquém
Que nunca mais se ouviu falar e nunca mais
Se olhou o firmamento azul do azul do céu
Azul e nunca mais se olhou a lua e nunca
Mais se seguiu o sol em suas viagens sem
Volta e nunca mais se falou em poesia e
Nunca mais se declamou um poema poente e
Nunca mais se observou uma flor nascente
Ou um pássaro numa haste ou numa árvore Contente ou um besouro num toco dum pau
Oco e nunca mais se impediu uma árvore de
Ser cortada ou queimada e nunca mais se
Plantou uma árvore no planeta e era um dos
Dez mandamentos da humanidade e nunca
Mais se foi humano da raça humana e nunca
Mais se brincou de mais nada e só se levou
Tudo a sério e a guerra a sério e a fome a
Sério até à última extremidade do extermínio
E se levou a sério campos de refugiados e de
Flagelados e nunca mais a humanidade
Voltou ao humanismo e o homem a ser
Humanista e nunca mais se fez uma criança
Feliz e pelo contrário quando não a matamos
Ao nascer a matamos com a violência do dia
A dia com o estupro e a pedofilia ou a
Exploração de qualquer espécie e nunca mais se 
Ouviu cantar coisas de amor numa cantiga.

BH, 01701102020; Publicado: BH, 0240602022.

Decepcionadamente com a República Federativa do Brasil Golpista.

Decepcionadamente com a República Federativa do Brasil Golpista
De iireita
E decepcionadamente também com o Partido dos Trabalhadores
E ainda decepcionadamente com o Clube de Regatas do Flamengo
E olho aqueles que querem reformas estruturais de base
E revoluções marxistas leninistas trotskistas
Sem combinar com o povo trabalhador brasileiro que
Tem se demonstrado conservador misógino racista
Fundamentalista religioso armamentista xfóbico
Apolítico omisso analfabeto político
E percebo os que ainda pensam adaptar o time do Flamengo
A um futebol objetivo moderno quando o próprio time
Não tem vontade de nada 
E sigo excepcionalmente comigo mesmo nas minhas
Tentativas infrutíferas de sonhar um país
E um partido
E um time de futebol referências no mundo moderno
E caio na utopia
E vem a realidade puxar o meu tapete a me
Lançar no pesadelo cotidiano que é a minha vida
E o meu país
E o meu partido
E o meu time de futebol
E a esperança de ser a nova ordem mundial
Morre na primeira esquina
E no próximo boteco diante duma garrafa de cerveja
E duma dose de pinga pura da boa
E forte
E quando me dou por mim lá estou arrastado
Por algum pé daiguma puta.

BH, 01701102020; Publicado: BH, 0240602022.

quinta-feira, 23 de junho de 2022

E não abri mais os olhos desde o dia no qual nasci.

E não abri mais os olhos desde o dia no qual nasci
E desci da esfera colossal para o mundo real
E o meu sonho acabou sem ser realizado
E não quebrei os pontos dos meus olhos costurados
E não rompi as barreiras dos meus ouvidos chumbados
E quem queria me dizer alguma coisa não me disse nada
E também não disse nada a ninguém pois a língua
Estava presa no fundo da garganta cada vez mais
Era engolida ao contrário pelo esôfago
E nunca pronunciou amor
E nunca teimou pela paz
E só propagou a guerra
E a mentira
E a violência
E o desamor
E desde então este meu coração
É só solidão é rocha de vulcão é resposta sem solução
É braço sem mão é baleia no arpão é boca sem pão
É cristão sem visão
E lábios que só dizem não é
Cérebro sem percepção é cabeça sem noção é
Mente sem razão
É pensamento sem dimensão é discernimento
Sem direção é sentido sem condição é escada
Sem vão é rampa sem corrimão é pião sem cordão
É criança sem irmão é Deus sem adoração é prece
Sem oração é garganta sem canção é alma sem
Iluminação é pântano sem drenação é edifício
Sem fundação é alicerce sem sustentação
E a cada dia é uma nova arruinação que até parece
Uma maldição que não tem fim de tanta estigmatização
Mas um dia a luz há de chegar com a acepção.

BH, 01201102020; Publicado: BH, 0230602022.

Nem sei que dia é hoje para que saber que dia é hoje.

Nem sei que dia é hoje para que saber que dia é hoje
Se morrerei amanhã de madrugada quando for no
Infinito de manhãzinha? e quando penso que sou o
Centro do universo e o universo puxa o meu tapete e
Embarco numa cápsula do tempo à velocidade
Da luz para a mais distante galáxia a zilhões de anos-luz
Desta e o infinito fica aí a sorrir de mim como se fosse
Um extraterrestre dum exoplaneta dum exo sistema-solar
Dum exo universo que engloba uma exo galáxia e 
Nunca será manhã em nenhuma manhã onde se
Esperava que fosse manhã dum dia bem iluminado
Onde pudesse enxergar o átomo e a molécula
E a matéria e a poeira e o pó e acordo coberto de
Pólen das flores do jardim da casa da minha mãe e a
Vejo a regar as flores e as plantas e as relvas e hoje
Está em outro jardim e é também uma flor e a mais
Preciosa de todas as flores preciosas que os astros
Já expuseram na abóbada do firmamento celestial
E os incautos tentam descobrir e os leigos explicar
E aquele brilho ali mas estático sei a fonte nascedora
Daquela luz especial que toda vez que tentam
Definir em algum aparelho de última geração
Se abriga espetacular no refúgio de criança do meu coração.

BH, 01201102020; Publicado: BH, 0230602022.

Estaquei no meio do caminho do destino como uma pedra.

Estaquei no meio do caminho do destino como uma pedra
Ou como um burro que empaca numa estrada
Ou o boi que se recusa a marchar ao matadouro
Que até as minhas pegadas se petrificaram 
Como um tesouro fóssil
E não mais arredei a rocha
se transformou em diamante
E empacado ali com o universo nas costas
E as dimensões no cangote
E o infinito na cacunda
E a eternidade na corcova
E corcovado ancião vi o corvo a me devorar o
Fígado de naco em naco
E de bocado em bocado
E acorrentado ao pelourinho sou mais um prisioneiro
Desta caverna filosófica
E mais um protagonista dessa cadeia de
Cordilheiras de personagens coadjuvantes da
História universal
E quando acordei do sonambulismo o
Meu esqueleto continuou a dormir
E a minha caveira a sorrir pois nunca vi uma
Caveira triste mesmo quando era guardião do
Ossuário da cidadezinha onde nasci
E conheço todos os ossos do manequim do mais profano
Ao mais sacro
E enchi o saco com os ossos em cacos
E faço tubos tubulares
E flautas doces
E clarinetas com os inteiriços
E nobres arfins
E do mais puro marfim
E a morte viu que era pouca
E que era pequena diante de mim
E a minha sepultura foram todos os montes montanhas
E picos cordilheiras
E nunca monumento de mausoléu
E restos de planetas irreconhecíveis
E rochosos perdidos pelos universos estranhos
E milênios depois quando abriram a tampa do sarcófago
Na campa do meu sepulcro sepultura
Só encontraram esta folha de lápide a lápis.

BH, 0601102020; Publicado: BH, 0230602022.

pai colocou dvd de beth carvalho no celular para assistir

pai colocou dvd de beth carvalho no celular para assistir
está aqui à minha frente como sempre infinitamente
a rabiscar reminiscências numa folha branca de papel
com isso aqui em calmaria saí do surto
e só bato umas palminhas não umas punhetinhas
de vez em quando
e estou a gostar dos sambas que a beth está a cantar
e pai levanta as vistas nossos olhares se encontram
e percebo a satisfação de pai que percebe a minha
e mãe saiu
e a irmã foi dar aula
e por incrível que pareça a casa está em paz pax peace
e o lar home sweet lar home é aparentemente doce
e estou realmente entretido com o celular
e cheguei até a pensar que pai é um cara legal
e só pensei
e não falei nada pois não nasci para falar nada nunca
não de elogiar de tecer loas a alguém
e o telefone tocou
e pai levantou
e sem identificar de quem era a ligação
a dispensou só para não me atrapalhar
e ficou muito abatido porque perdi o benefício
que o governo me dava
e nem pai nem mãe podem trabalhar mais
e a despesa comigo
e com a casa são grandes
e estamos por passar um aperreio danado mas
ninguém tem nada com isso
e o nosso povo votou mesmo foi para isso para piorar
e foder com as nossas vidas coisas do destino

BH, 0601102020; Publicado: BH, 0230602022.

E há os que tiram leite da rocha.

E há os que tiram leite da rocha
E água das pedras
E vida dos desertos
E faz aair maná dos céus
E eu não
E tiro letras das águas
E palavras do fogo
E poesias do ar
E poemas da terra
E sangue do éter
E apascento rebanho rebelde
Nos campos das vertentes mais verdes
E desfilo nos desfiladeiros pensamentos de 
Geleiras seculares
E canto odes infinitas nos
Paredões dos despenhadeiros
E mergulho eco nos abissais abismos
Imaginários das abscissas
E não me perco nos subterrâneos sem fundos
Dos mais longínquos universos paralelos
Para arrumar versos nunca dantes imaginados
E guio minha nau catarineta
E meu navio Argos com tripulação argonauta
E minha jangada de nióbio
Pelos oceanos das lágrimas
Dos negros africanos
E das mulheres sacrificadas
E das crianças violentadas
E não fico satisfeito pois são tantos defeitos
Que impedem minha perfeição
E latejo meu coração nas pontas
Das lanças de lajedos dos malfeitores
E não vou longe com os meus suores
E meu sangue é pouco
Para o sangue derramado da humanidade
E não faço um pacto pela raça humana
E não caso com um ser humano
E meu olhar de gelo congelou a paisagem
Numa cena cinzenta
Num cenário que tem o céu por moldura.

BH, 060110220; Publicado: BH, 0230602022.

quarta-feira, 22 de junho de 2022

Meus santos nenhuns foram beatificados.

Meus santos nenhuns foram beatificados
Ou canonizados
Ou santificados pelo papa
E o contrário foram relhados nos pelourinhos
E todos são santíssimos designados por
Instituições de entidades onde o papa não
Passaria dum espírito anão
E meus espíritos todos são espíritos
Concebidos pelas luzes dos soles das maiores
Grandezas
E todos os meus entes são de moradias eternas
E de casas de poetas
E de portos de bardos
E cais de embarcações universais
E me elevaram além de mim em estaturas de
Firmamento
E dito em testamentos as lições recebidas
E consagro em escrituras as palavras citadas
Que guardo em santuário de coração cada
Estátua de letra de pingo de sangue
E cada provérbio em versículo
E em verso de hemorragia
E me deixo crescer sem agonia
E amadurecer-me sem angústia
E me absorver sem ansiedade
E já aprendi a viver
E não ficar mais doente de depressão da minha
Esquizofrenia de esquisito
E também já aprendi não morrer
E sigo eterno nesta composição com certeza da
Condição de ser inabalável fundido em núcleos
De vulcões siderais
E curado fundamental
E sarado
E são a desprezar o vão com suas coisas vãs
E este grito de aedo que acordou cedo antes
Do tempo moderno registo nesta ata de acha
O que ouço do vento
E são finos argumentos
De confrarias superiores
E vai tu
E tuas moradas
E teus moradores pelas estradas
Que ligam macrocosmos
E resgatai as mensagens esquecidas nos
Portais das dimensões
E trazei de volta a alegria
E a felicidade
E o amor aos vossos corações mortais
E nunca mais voltai às trevas das escuridões
Abissais para não morrerdes nunca mais.

BH, 0501102020; Publicado: BH, 0220602022.

terça-feira, 21 de junho de 2022

Reverencio reverendo este abençoado universo.

Reverencio reverendo este abençoado universo
E saúdo saudável com saudade esta
Bem-aventurada Via-láctea
E rrespeito respeitosamente a este venerável
Sistema Solar onde peço a minha benção a este
Glorioso planeta Terra azul água ar fogo
E todos os elementos entram em jogo nesta
Composição poética sem goética de redação
Antológica de antologia de escrita guiada pelos 
Deuses que nos permitiram fazer parte de
Tamanha imensidão inexplicável de grandeza
nigualável apesar de sermos seres tão
Insignificantes que há pouco andávamos de
Quatro patas que teimamos em nos mostrar
Gigantes mas acabamos tombados por esses
Tempos infinitos oh blocos de rochas
Desconhecidas que vagam por essas distâncias
Insondáveis levados por forças estranhas oh
Longínquas pradarias falésias plataformas planícies planaltos aonde não se aportam nem
Através dos pensamentos nobres oh ventos
Dançadores movedores de moinhos milenares
E açoitadores de vendavais de tempestades
Furacões ciclones de planetas de galáxias de
Aglomerações de constelações oh fenecidas
Imagens que olhos normais jamais verão nem
Em sonhos oh letras de ouro que cravejam
Palavras de diamantes raros lapidados
Em choques inter universais de fundições inter
Galáticas tingidos pelo sangue que jorra das
Pontas dos meus dedos nesta epopeia lírica
Deste poeta funâmbulo.

BH, 0501102020; Publicado: BH, 0210602022.

Manuscrito de papiro transcrito de pergaminho encontrado no Mar Morto do meu coração.

Manuscrito de papiro transcrito de pergaminho encontrado no Mar Morto do meu coração
De cordeiro de Teócrito com cabeça de fauno no cepo a espera do golpe do cutelo do carrasco
Que a mando do sacerdote decepará a carne do cerne do pescoço para o corpo de cordeiro ser oferecido
Aos deuses desconhecidos e sem fiéis e o braço do algoz está suspenso apenas pendido pelo universo
E só à espera do sopro do vento que inflará a vela que levará o espírito à eternidade deste escrito sobrenatural
De letras de assombrações e palavras fenecidas de entidades e de seres perecidos nas rochas das ruínas milenares
Que o tempo transformará em areia de desertos de exoplanetas que escondem sombras nas penumbras
Habitadas por átomos de partículas de moléculas de matérias de esqueletos teimosos e caveiras rebeldes
Que se reverberam por reencarnações das mesmas carnações podres do pântano do lago morto onde navega
A embarcação do barqueiro que transporta as almas para o despenhadeiro onde ancorou o meu coração
E de repente o universo soltou o braço pendido do demente e o cutelo desceu pungente sedento de sangue
Para matar a sede do Mar Vermelho e se reuniram os sátrapas sacripantas e os sábios e os filósofos e
Disseram o cadáver vomitado na praia do Mar Mediterrâneo e nas junções das placas tectônicas de todos os mares e oceanos
Sagrados e onde os justos andavam em sagração sobre as águas e a justiça da liberdade era trazida pela maresia da brisa.

BH, 02701002020; Publicado: BH, 0210602022.

conversei telepaticamente com pai

conversei telepaticamente com pai
só conseguimos falar por telepatia
sou espírito incorporado no corpo
dum menino branco
pai é espírito mas de carne e osso
que fica só a escrever pelos cantos da casa
está desempregado desesperado como sempre
mãe é um sofrimento só
ainda mais agora que passou dos setenta
perdeu o meu benefício
parece até que vai ter que devolver
uma quantia que
governo pensa que
pagou demais
mãe quer mudar para casa menor
aluguel mais em conta
pai bebe todo santo dia
chega à casa bêbado
perturba mãe
aborrece irmã
comigo não mexe
pois sabe que
dou porradas
não são poucas
morre de medo de mim
de me encher o saco
para não surtar
senão quebro a casa toda
a cara também
bato a cabeça na parede
dou socos nas paredes
enfio dedo nos olhos
um pandemônio danado
se ninguém ajudar mãe
nem sei o que vai fazer
nem quer falar com ninguém
que perdi benefício
no fundo fico com dó
mas que posso fazer?
pai parasse de beber já ajudava pouco
velho doido por cerveja
cachaça conhaque
não há nada que
o afasta do álcool
às vezes fala que
bebeu álcool puro
acredito

BH, 02301002020; Publicado: BH, 0210602022.

Se precisares pensar para escrever não escrevas.

Se precisares pensar para escrever não escrevas
E se quiseres torturar a mente em busca dalgo
Como um demente trêmulo tal um decrépito
Romper a normalidade para imortalizar uma poesia
Não o faças e nem fales o que fizeste ou o que
Deixaste de fazer pois a letra procura a palavra
E a palavra procura a frase e a frase a sentença
E a sentença o período e quando menos esperas
O teus fantasmas te deixam de legado uma obra-prima
E que ao final assinará como se fosse tua e até
Vangloriarás ufanamente que esquecerás dos teus
Fantasmas escondidos dentro de ti nos escombros
Das tuas masmorras e calabouços e prisões que usam
Por moradas e de versículo em versículo escreverás
Uma biblioteca e não ganharás o Prêmio Nobel de
Literatura e combaterás o capitalismo e derrotarás
A burguesia e aniquilarás a elite e destruirás a cleptocracia
E enterrarás a plutocracia e resgatarás a democracia
E devolverás ao povo o poder do povo e amarás ao
Teu próximo como a ti mesmo e viverás em paz sem
Cartões de créditos e débitos e não cometerás
Nenhum desmandamento e comerás teu arroz
Com feijão e farinha e beberás tua água fresca 
Do pote e amanhã de noite quando for no mar noite
Dormirás o sono dos justos na embarcação dos sonhos
E não acordarás sonâmbulo a andar por sobre as águas.

BH, 02301002020; Publicado: BH, 0210602022.

Meu coração não é meu pois é transplantado doutro peito ateu.

Meu coração não é meu pois é transplantado doutro peito ateu
E é um coração carregado de sangue venoso sufocado de
Ódio afogado de cólera de ira não irá muito longe
Neste destino incerto tropeçará nas pedras deste caminho
Estreito mas meu coração é um aleijão por dentro um
Capenga manco sem moleta para coxo de bengala se
Instala em qualquer valeta come em qualquer cocho
Pois é um coração de porco tem gosto por qualquer esgoto
E não há nada que dispara este comboio que descarrilhou
Na encruzilhada dos fantasmas das assombrações
Dos vagões dos porões dos sotãos soltaram minhas mãos
E me vi afundar num mar de bílis num oceano gástrico
E arrotei amargo com amargor depois que vomitei azedo de choco
E nada em mim era doce tudo era louco a mágoa só aumentou
E quando a morte viu a careta da minha cara de caveira de fóssil
De esqueleto chorou como chora uma criança desmamada
De criatura sem criador da minha caveira de cara risonha
Ria da morte bisonha eternamente enquanto cavalgava
O meu cavalo do tempo o meu coração dançava
Com o vento menino redemoinho me elevei ao
Firmamento que se abriu para me receber.

BH, 01601002020; Publicado: BH, 0210602022.

Do vale é o lírio a estrela da manhã.

Do vale é o lírio a estrela da manhã
E o lírio é a estrela da manhã do vale e um
Complementa o outro e fica impossível de se
Imaginar o vale sem o lírio e o lírio sem o
Vale pois são vestidos de riquezas que não se
Pode comparar naturalmente e o lírio nem o
Tal do Salomão chegou perto e o vale é a
Morada preferida do vento quando vem em
Disparada das nuvens pelas paragens e
Veredas e sendas e encostas e torna subir às
Alturas e repentinamente despenca alado no
Ventre do vale a brincar com o lírio na haste
Tenra e forma-se um belo trio a se apreciar a
Qualquer momento da vida a quem tem um
Bom gosto a desfrutar e a ouvir as canções
Do vento a declamar poesias à estrela da
Manhã e o dia empresta toda alegria para
Não decepcionar e um é companheiro
Doutro e mesmo quando chega a noite e o
Vale está escuro e vem a lua a observar o
Prateado na relva que ajuda a clarear e até
As nuvens somem do céu nessa hora e o
Universo se aproxima tão densamente que
A pulsação é sentida no coração e na vida a
Natureza se ouve uma oração é a criança
A agradecer é o pastor a vigiar é a ovelhinha
A balir de contentamento e o vale é só o lírio
E o vento e a estrela da manhã e o firmamento.

BH, 02001102020; Publicado: BH, 0210602022.

Na rua da amargura a poesia não me procura.

Na rua da amargura a poesia não me procura
E na ansiedade mato o poema sem densidade
E no beco escuro do gueto não rimo num soneto
E na angústia abandono o universo não imortalizo
Um verso perco a eternidade entre os dedos
E deixo de mão a posteridade e meu coração é uma
Couraça de armadura medieval e meu cérebro
Nada eletrônico é um encouraçado Potenkin duma nave
Espacial e uma nau interplanetária cuja bateria
Já está arriada e nem a energia solar a recarrega mais
E abro as velas seculares das velhas caravelas
E os vendavais doutras dimensões não as inflam
E nem as impulsionam e não voo do mar Mediterrâneo
Aos Andes e nem navego dos Pireneus ao mar Egeu
E quando é nas Montanhas Rochosas manhã
Quero chocar letra por letra como uma galinha morta
E engravidar palavra por palavra como numa
Gravidez psicológica e não engendro pensamento
Com um sequer discernimento e olho as pradarias
Vazias e desço as falésias como um soldado universal
Às praias dos oceanos e mais distante está o horizonte
E lamento não ter nascido para mim que não
Nasci para ninguém e nem nasci para nada e muito menos
Para alguém e a poesia que imaginei amamentar
Um dia a mato de fome e de agonia ao fitar a natureza viva
Que me expõe às galerias como uma natureza morta.

BH, 01501601002020; Publicado: BH, 0210602022.

segunda-feira, 20 de junho de 2022

Novamente desempregado com sessenta e cinco.

Novamente desempregado com sessenta e cinco
Toneladas de janeiros e fevereiros e marços e abriles
E maios e junhos e julhos e agostos e setembros
E outubros e novembros e dezembros nas costas
E não conseguirei emprego e dos males o menor
Às duras penas consegui uma aposentadoria por idade
E recebo a bagatela mínima mas o banco mercantil
Do Brasil todo santo mês rouba 34 paus do benefício
E para complicar o especial daqui da casa foi cortado
E todos voltaram às duras penas e preocupações
Com aluguel e água e luz e telefone e comida
E remédios para dois anciões e um especial e o capitalismo
Só pode ter sido inventado mesmo pelo capeta
E deveria se chamar capetalismo e a humanidade
Não aprende e os trabalhadores do mundo não se unem
E para enriquecer um pequeno grupo de privilegiados
A desgraça e a miséria e a pobreza só aumentam
No mundo e a degradação é espalhada nos quatro 
Cantos do planeta e sem perspectivas de melhoras
E de justiça e melhorias e de felicidade para a raça humana
E sem respostas para o ser humano e sem soluções
Para as pessoas e de volta ao Brasil e à nação trabalhadora
Brasileira que insanamente conseguiu piorar a própria
Vida ao eleger em massa um inominável para
A presidência e não sabe o que fazer para sobreviver.

BH, 0201002020; Publicado: BH, 0200602022.