"Poemas Trágicos", É que sou assim; Publicado: BH, 0310702020.

É que sou assim

Foi isso aí que falei

E não volto atrás

E nem peço desculpas

E se não gostaste

Não tenho culpa

E se gostaste

Vem comigo

Vamos fazer alguma coisa

Vamos fazer amor

Estou cansado de ser enganado

Agora serei assim

Falarei assim

E quem quiser

Pode me criticar

E pode até dizer

Que não tenho classe

Que não tenho carácter

Que não sei dizer

Que não sei falar

E sou assim

E serei assim

E vou direto

Ao que interessa

E o que me interessa

É fazer amor

Todo dia

Toda hora

Ou pelo menos

Uma vez por dia

E se não fases amor

Sinto muito

Mas te deixarei

Para que quererei

Uma mulher

Que não seja para amar?

Mulher para mim

É só para amar

É só para o amor

É só para fazer amor.

"Poemas Trágicos", Está uma bagunça a minha vida; Publicado: BH, 0310702020.

Está uma bagunça a minha vida

Não sei aonde andam os meus pensamentos

Não sei aonde andam os meus sentimentos

E a minh'alma desorganizada não guarda

Nenhum pouco de amor

E está um desastre este meu conturbado espírito

E dá até vergonha de ver esta minha vida a ser

Assassinada pouco a pouco

E sem a reação deste meu ser inerte estirado no espaço

E levado daqui para ali

E levado de lá para cá sem destino certo

E sem alma certa

E está uma bagunça esta minha vida

E está uma bagunça

E estes meus olhos ardem

E meu dente dói

E minha cabeça também

E o meu peito vazio

E tudo atrapalhado

E tudo estragado

E toda mulher que chega em mim

Estraga-me um pouco mais

E não me ajuda a me reorganizar

E está uma bagunça a minha vida 

E tenho que pôr em dia as minhas ideias

E satisfazer os meus desejos

E realizar os meus ideais

E refrigerar minh'alma

E dar um pouco de vida ao meu ser inanimado

E acabar com esta vergonha

E com esta esculhambação

E com esta catástrofe

E acabar com esta desordem

E acabar com esta zona

E pôr tudo no seu devido lugar

E ter amor no coração

E paz para amenizar esta aflição corrosiva.

"Poemas Trágicos", Olha o sorriso dela; Publicado: BH, 0310702020.

Olha o sorriso dela

Quero ver aquela mulher sorrir

Olha só aquela boca

E aquela boca está a sorrir

Que beleza

Que graceza

Ver aquela mulher sorrir

Ver aquela boca sorrir

Deixa eu ver

Deixa eu beijar

Deixa eu beijar o sorriso daquela mulher

Deixa eu beijar o sorriso daquela boca

Olha o sorriso dela

Como é lindo

Como é puro

Ela ri a paz

Ela ri o amor

Se aquele sorriso lindo

Daquela boca maravilhosa

Daquela mulher

Fosse só para mim

Penso que seria um

Pouco melhor

E não seria tão ruim assim

Olha o sorriso dela

Ela está a sorrir

E o ar do dia

Entra naquela boca

E que beleza de novo

Se pudesse engolir

O ar do sorriso dela

Se pudesse transportar

Para o meu rosto

Para a minha máscara

O sorriso daquela mulher

Quero aquele sorriso

De qualquer jeito

Quero mastigar aquele sorriso

Olha o sorriso daquela mulher

Olha a boca daquela mulher

Olha o sorriso dela

A se exibir para mim.

"Poemas Trágicos", Pensei que fosse fácil falar contigo; Publicado: BH, 0310702020.

Pensei que fosse fácil falar contigo

E no princípio pensei que era só

Chegar falar mas na hora certa

Cadê a coragem a ousadia a

Audácia e cadê as palavras e

Perdi a voz e gaguejei e as minhas

Pernas tremeram e o meu corpo

Cambaleou e suava frio e uma

Dor na barriga me impediu a

Respiração e uma cadência mais

Acelerada tomou conta do meu

Coração e no final não falei

Nada contigo e fiquei parado em

Tua frente e a minha vista se

Escureceu e senti uma tonteira

Chegar e que veio não sei de

Onde e minha boca secou e

Minha garganta ficou tão

Apertada e a língua áspera

Que quando tentava falar

Parecia que estavam a bater

Ferros dentro de mim e até

Pensei que fosse fácil falar

Contigo e no princípio pensei

Mas me faltou tudo que nunca

Tive e não falei nada falei não.

"Poemas Trágicos", Quando um meu esperma; Publicado: BH, 0310702020.

Quando um meu esperma

For procurar o teu óvulo

Temos que ter cuidado

E noção do que vamos fazer

Para não fazermos errado

É tomarmos consciência e

Pedir auxílio à divina providência

Para que o novo ser gerado

Não seja poluído

E não seja um idiota

E não não seja um imbecil

Como somos

E vamos pedir também

Muita inteligência

Para que seja alguém

E que o que nos faltou

Nunca venha faltar

Como a justiça que não temos

A liberdade já que somos presos

E direitos para nós três

E vida longa ao rebento

Que nós já morremos

E paz e amor pois nós

Já vivemos em plena guerra

E pedir compreensão e sabedoria

E bem e bom e nada de mal

E que nossas ignorâncias

E que nossas doenças

Não venham espelhar nele

E nem venham um dia afligi-lo

E que a vida má não aconteça

Afinal de contas o ser novato

 Não tem nada a ver com isso

Com nossas doenças

Com nossas mortes

Com nossas infelicidades

Quando um meu esperma

Perdido dentro de ti

Encontrar o teu óvulo

Algo novo vai nascer

Tem que ser diferente de nós

Se for igual vai sofrer

Vai morrer antes de nascer

E isso não pode acontecer

De maneira nenhuma.

"Poemas Trágicos", Margarida do Colégio Capitão Lemos Cunha; Publicado: BH, 0310702020.

Margarida

Estás com fome

Ainda não almoçaste

Come-me Margarida

Come-me que sou homem

E matarei a tua fome

Tua fome de amor

E queres um homem

Rasga-me as veias

Dilacera-me as carnes fracas

Sou um homem

Vê o meu corpo

Vê o meu sangue

Que tuas unhas

Tiram em minha pele

Vê as marcas

Dos teus dentes

Em meu pescoço

Margarida

Não almoçaste

Coma alguma coisa

Mas não vás entrar

Em estado de coma

Senão não vais poder me comer

Mastigar-me do jeito

Que só tu sabes

Margarida

Estás faminta

Sou o teu pão

Sou um homem

Quero ser o teu homem

Matar a tua fome

E te sustentar

E te cobrir de beijos

E te acariciar

E te amar

Margarida

Minha querida

Vou aliviar a tua ferida

Tua ferida sedenta

Tua fenda faminta

Que quer comer

Para não morrer

Margarida

Come-me

Sou alguém

Sou gente

E sou um homem.

"Poemas Trágicos", Não nada nonada; Publicado: BH, 0300702010.

Não nada nonada

É que sou amaldiçoado

E nem sei quem foi

Que me amaldiçoou

E não sei se foi o meu batismo

E não sei se foi a minha crisma
Ou os pozinhos jogados entre os
Balbucios de rezas nas encruzilhadas 

Ou se foi o meu amor

Sei nada

Não nada

Nonada

Nada sei

Sou um estragado

E nem sei quem foi

Que me estragou

E não sei se foi a vida

E nem sei se foi o mundo

Nada sei não nada nonada

E sei nada

E não posso esperar

Por minha sorte

E posso esperar

Por minha morte

Este é o meu sonho

Que não posso alimentar

Posso não

Posso nada

E não adianta

Iludir-me

Adianta não

Não nada nonada.

"Poemas Trágicos", Cá; Publicado: BH, 0300702020.

Cá

Cadê

Cá dentro

Cadente

Cá

Cadê

Cá dentro

Cadente

Do meu coração

Cá

Cá ri

Carinho

Com minha mão

Cá

Cal

Calma

Em minh'alma

Cá

Capaz

De fazer sagaz

A paz

Cá

Calor

Com amor

Cá

Cadê

Cá dentro

Cadê

Cá.

"Poemas Trágicos", Márcia do Colégio Monteiro Lobato; Publicado: BH, 0300702020.

Márcia

Olhaste para mim

Com teus olhos coloridos

De muitas cores de olhar bonito

E ris para mim com tua boca pequena

Boca meiga

Boca educada

Com esmero

E falas o meu nome

Com voz suave

E teu corpo desenvolvido

Corpo de mulher mesmo

É o acabamento duma obra de arte

E pena que não posso ser o artista

E pena que não posso ser o dono

Dessa peça valiosa

E dessa obra-prima

E ainda olhas para mim

Com um olhar raro

Com um sorriso caro

Moldurado num ouro puro

Maciço e depurado

Mas só te vejo olhar para mim

Mas só te sinto sorrir para mim

E não te vejo vir para mim

E não te sinto ser para mim

Márcia

Acorda.

"Poemas Trágicos", E sou tão pequenino; Publicado: BH, 0300702020.

E sou tão pequenino

Tão pequenininho

Que passo folgado

No fundo duma agulha

E sou tão pobre

De ser e de espírito

E tão frágil

Que qualquer água me derrete

E sou tão leve

Que qualquer ventinho

Leva-me para longe

Para lá

E para cá

E sou tão pequenininho

E ignorante que

Minha ignorância

Vai além do horizonte

E se ignorância

Pagasse imposto

Estaria perdido

Estaria sempre

Em débito

Com o estado

E sou tão pequenino

E tão pequenininho

Que me afogo

Em qualquer

Gota de lágrima

E qualquer solidão

E qualquer saudade

Ataca-me o peito

E me mata

E sou tão pequenino

Tão pequenininho

E que devagar

Que o tempo

Passa ligeiro

E até hoje

E até agora

Não aprendi a amar.

"Poemas Trágicos", Hoje levantei com o pé esquerdo; Publicado: BH, 0300702020.

Hoje levantei com o pé esquerdo

E não escovei os dentes

E não lavei o rosto

E não tomei banho

E nem tomei café

E na saída do apartamento

Um gato preto cruzou o meu caminho

E numa calçada

No centro da cidade

Passei debaixo duma escada

E andei de costas

E pus as mãos na cabeça

E hoje foi o meu dia de azar

E na volta para a casa

Dentro do ônibus

Bateram a minha carteira

Com os meus documentos

E os trocados que tinha

E ao descer do ônibus

Quase fui atropelado

Sem café

Sem almoço

Sem dinheiro

E bem cansado

Mas logo adiante

Acontece o pior

Fui abordado

Por um policial

E convidado a me identificar

De nada adiantou

O meu argumento

A minha história

Da minha vida no dia

Sem os documentos

Fui dormir na delegacia.

"Poemas Trágicos", Espero um dia poder morrer por minha poesia; Publicado: BH, 0300702020.

Espero um dia poder morrer por minha poesia

Espero um dia poder viver por minha poesia

Espero um dia poder morrer por meu poema

Espero um dia poder viver por meu poema

Espero um dia poder viver por minha paz

E por meu amor

E espero um dia poder viver

Por meu bem

E por minha vida

E ficar sentado

Só a pensar

Só a refletir

A compôr versos

Sem pensar em mais nada

Espero um dia poder morrer por minha poesia

Espero um dia poder viver por minha poesia

E por meu poema

E por meu tudo

E por meu todo

E espero um dia poder viver

Nem que para isso

Tenha que morrer.

"Poemas Trágicos", Decoração de coração; Publicado: BH, 0280702020.

Decorarei o meu peito

Com decoração de coração

De sangue novo

E minh'alma com almas de anjos

Tudo num corpo reciclado

E decorarei meus olhos

Com um olhar de paisagem

De natureza viva da fauna e flora

E o meu ser com um amor fresco

E uma paz de firmamento celestial

E vou decorar a minha voz com uma

Canção de ninar de acalanto sem par

E vou decorar o meu ouvido com o

Som da minha canção de cantiga rara

E decorarei a minha vida com o

Perfume das flores mais ricas em olores

E vou decorar a minha noite com a luz

Dos vaga-lumes que encontrar pelos

Caminhos do meu coração de batida

Nova e pensamento de espírito de

Arco-íris em cada célula enriquecida

De pétalas das moléculas que me

Formam e decorarei a minha cabeça

E a minha boca e o meu nariz por

Beleza refletida em todo gesto meu.

"Poemas Trágicos", Amores clandestinos; Publicado: BH, 0280702020.

O padre vigário da minha igreja

Arrumou uma mulher amante e

Dia desse peguei o vigarista a

Fazer amor atrás do altar e o

Prefeito perfeito não quer

Outra coisa depois que entrou

Para a prefeitura e esqueceu o

Dever e a obrigação e só pensa

Em mulher e encheu o gabinete

De mulher bonita e nova e vistosa

E é tudo assim cheio de amores

Clandestinos e tem sempre alguém

De olho na mulher do próximo para

Fazer amor na ausência do marido

E com o dentista e com o médico e

Com o motorista ou com o advogado

E com o patrão ou com o empregado

Pois o padre da minha igreja é homem

De muita fé e não sabe rezar missa se

Não for para mulher e o prefeito da

Minha cidade é cabra valentão e

Encheu a prefeitura de mulher para

Esquecer a obrigação e agora é só

Amor e agora é só cama na igreja

E na prefeitura e em todo lugar e

Só amores clandestinos nos leitos

Alheios das mulheres alheias.

"Poemas Trágicos", E não quero ser herói; Publicado: BH, 0280702020.

E não quero ser herói

E não preciso de herói

E nem preciso ser herói

E não quero ir para a guerra

E não quero matar meus semelhantes

E nem quero morrer em vão

E não quero ser fantástico

E nem ser sensacional ou corajoso

E prefiro dar um grito para evitar

Um pranto pois não vale a pena ser

Herói e depois caem no meu couro

Comem a minha carne e me comem

A glória e não quero ser herói e

O ser criança e prefiro ser vida

E prefiro fazer amor e prefiro

Ser paz e prefiro a paz e não

Quero ser herói e não quero

Ser aclamado e não quero

Ser exaltado e não quero

Ser levantado e prefiro ir

Dormir muito bem

Acompanhado e prefiro ir

Sonhar ou pensar num bom

Pensamento mas não quero

Ser herói e perco longe como

Herói e não sirvo para ser herói

E nem nasci para ser herói e só

Desisto de ser herói e prefiro

Qualquer outra coisa menos

Ser herói e a medalha do herói

E a glória do herói é a morte precoce.

"Poemas Trágicos", Ela é o meu amor; Publicado: BH, 9280702020.

Ela é o meu amor

Ela é a minha paz

Ela é a minha casa

Ela é o meu lar

Ela é a minha família

Ela é a minha mulher

Ela é a minha cama

Ela é o meu sono

Ela é o meu sonho

Ela é o meu alimento

Ela é o meu sustento

Ela é a minha vida

Ela é a minha alegria

Ela é a minha noite

Ela é a minha razão

Ela é o meu dia

Ela é o meu amanhecer

Ela é a minha causa

Ela é a minha amada

Ela é a minha amante

Ela é a minha adorada

Ela é o meu sorriso

Ela é a minha felicidade

Ela é a minha calma

Ela é a minha boca

Ela é o meu ser

Ela é a minh'alma

Ela é o meu canto

Ela é o meu céu

Ela é o meu quarto

Ela é a minha solução

Ela é a minha meta

Ela é o meu horizonte

Ela é a minha fonte

Ela é o meu rio

Ela é o meu mar

Ela é o meu vento

Ela é o meu tudo

Ela é o meu todo

Ela é minha toda

Ela é o meu amor.

"Poemas Trágicos", Um corpo nu de mulher; Publicado: BH, 0280702020.

Um corpo nu de mulher

Já faz tempo que não vejo

Um corpo nu

Já faz tempo que não toco

Um corpo nu

Já faz dias que não amo

Um corpo solto

Um corpo feminino

Um corpo leve

Um corpo bonito

Um corpo macio

Um corpo amor

Um corpo feliz

Um corpo paz

Já faz tempo que não beijo

Um corpo nu

Já faz anos que não mordo

Um corpo moreno

Já faz noites

Que não durmo

Com um corpo romântico

Já faz sonos

Que não sonho

Com um corpo de mulher

Já faz vida

Que não vivo

Um corpo qualquer

Um corpo vivo

Um corpo cheio

Um corpo sadio

Um corpo jambrado

Um corpo risonho

Já faz tempo

Que não vejo

Um corpo nu

Um corpo pelado

Um corpo perfeito de mulher.

"Poemas Trágicos", Imploro por uma alma; Publicado: BH, 0280702020.

Imploro por uma alma

Imploro por uma vida

Imploro por um ser

Imploro por uma paz

Imploro por um mundo

Imploro por um lugar

Imploro por um amor

Imploro para amar

Imploro por um corpo

Imploro por uma face

Imploro por um olho

Imploro por um olhar

Imploro por uma mulher

Imploro por uma santa

Imploro por um gesto santo

Imploro por um movimento

Imploro por um pensamento

Imploro por um momento

Imploro por um espírito

Imploro por um noite

Imploro por um dia

Imploro por uma alegria

Imploro por uma felicidade

Imploro para ser feliz

Imploro para cantar

Imploro para falar

Imploro para ser um homem

Imploro para ser humano

Imploro para sorrir

Imploro para ser livre

Imploro por um alguém

Imploro por um sexo

Imploro por um beijo

Imploro por um carinho

Imploro por uma luz

Imploro por uma cruz

Imploro por um pecado

Imploro por um céu

Imploro por um perdão

Imploro por um coração

Imploro por um peito.

"Poemas Trágicos", E sou da lua; Publicado: BH, 0280702020.

E sou da lua

E estou na lua

E estou de lua

E sou lunático

Quero luar

E sou luar

E já faz uma lua

Que não tenho amor

E já faz cem luas

Que não tenho paz

E sou da lua

E sou do luar

E estou de lua

Estou de luar

Estou luarento

E a minha lua

Não é crescente

E não é minguante

E minha lua

Não é lua nova

Minha lua

Não é lua cheia

E não sei o que

A minha lua é

Lua lunática

Lua passada

Lua maníaca

Lua visionária

Lua doida

Lua maluca

Lua boa

Lua má

Lua amor

Lua paz

Lua parada

Lua sem vida

Lua sem lua

Lua sem luar

Lua sem céu.

"Poemas Trágicos", E é a imagem macabra; Publicado: BH, 0280702020.

E é a imagem macabra

Representativa da morte

E é macabro

E acaba

E destrói

É fúnebre

É tétrico

E é um cadáver

É cadavérico

E é a imagem

Da dança do tempo

E é a dança

Que leva ao túmulo

Arrasta pessoas

Não olha idade

Nem olha sexo

Arrasta gente

Não olha físico

Nem condição

Não tem coração

E não tem amor

Vive um morto

E sem paz

E é a imagem

Que representa a morte

E é a morte

E é o grito

Do cadáver abandonado

Entre o céu

Entre a terra

Sem caminho a seguir

E é a alma

Que vaga no vácuo

Sem um corpo

Sem um espírito

Sem um ser

E é a imagem

Da santa podridão

E é aquilo

Que esqueceu de ser

E é a imaginação mórbida.

"Poemas Trágicos", Por enquanto ainda posso ouvir; Publicado: BH, 0270702020.

Por enquanto ainda posso ouvir

Por enquanto ainda posso falar

Não morri de tudo

Não me acabei de tudo

Por enquanto ainda tenho um olho

Por enquanto ainda tenho um olhar

Por enquanto ainda guardo uma lágrima

Não sequei de tudo

Não sequei de todo

Tenho algum cuspe na boca

Tenho alguma saliva na língua

Tenho algum sangue nas veias

Tenho algum pensamento na cabeça

Por enquanto ainda posso vomitar

O meu protesto

Por enquanto ainda posso escarrar a minha dor

Por enquanto ainda posso ser ainda

Por enquanto agora posso ser agora

Por enquanto ainda posso agir

Por enquanto ainda posso sorrir

Não apodreci de tudo

Ainda deve restar

Alguma carne fresca em mim

Ainda deve restar

Algum resto de comida em meu estômago

E se tiver

Divida com todo o mundo

Não é para ninguém morrer de fome

Por enquanto ainda posso ouvir

Por enquanto ainda posso cantar

Por enquanto ainda posso falar

Por enquanto ainda sobrevivi

Por enquanto ainda vivo

Por enquanto ainda vejo

Por enquanto ainda vi

Por enquanto ainda senti

Por enquanto ainda sou a causa

Por enquanto ainda sou por enquanto

Por enquanto ainda sou a razão

Por enquanto ainda sou um momento

Por enquanto ainda sou um movimento

Por enquanto ainda sou um gesto

Por enquanto ainda dou um jeito

Por enquanto ainda sou agora

Por enquanto ainda sou um segundo

Por enquanto ainda sou um tempo

Por enquanto ainda sou um sentimento

Por enquanto ainda sou uma vida negra.

"Poemas Trágicos", Escuridão; Publicado: BH, 0270702020.

Não suporto mais ficar na escuridão e

Tenho medo da escuridão

Pois me sinto tão sozinho

E me sinto tão abandonado

Que me dá vontade de chorar

E choro na escuridão 

E ninguém vê

E ninguém ouve o meu pranto

Não suporto viver no breu

Sou um frágil nas trevas

Pois não enxergo os vultos

Não posso ver as coisas

Que me metem sustos

E as sombras me metem medo

Já não tenho luz

Já sou sem luz

Já não sou a luz

E latejar ainda na escuridão

Deixa ter o prazer

De ter pelo menos

Uma luz artificial

Não suporto ficar na penumbra

Na escuridão sofro

Na escuridão sou escuridão

Na escuridão corro

Na escuridão esbarro

E me machuco ao tatear

E morro assombrado

E grito tal assombração

E grito por socorro

Mas não ouço nenhum movimento

Em minha direção

Não ouço o som de nenhum sorriso

Nem o batuque dum coração

E sinto ódio

E me sinto um defunto

E me apodreço presunto

Na escuridão cheiro mal

E não encontro a luz

Parece que não tomei banho

Não suporto ficar na escuridão

Teno medo dos fantasmas.

"Poemas Trágicos", Ainda tenho; Publicado: BH, 0270702020.

Ainda tenho

Muita coisa

Para fazer

E não será

Dum salto

Que subirei

E não será

Dum degrau

Que alcançarei o alto

E ainda tenho

Muita coisa

Para ver

Para aprender

Para estudar

E ainda tenho

Muito tempo

Para pensar

E não correrei

E não afobarei

E se não der tempo

Deixo para depois

Para outro dia

Deixo para amanhã

Deixo para lá

Ainda tenho

Muita coisa

Para falar

Mas se ninguém

Quiser ouvir

Não me importarei

Ainda tenho

Um ouvido

Para escutar

Mas se ninguém

Quiser falar

Então gritarei

Porque

Ainda resta-me

Uma boca

Resta-me uma voz

E ainda tenho

Um som na voz

E ainda tenho

Um timbre no som.