Não sonho para não ter que acordar
Sair do mundo onírico
Fugir do universo utópico
Então deixai-me lá
A fingir que existo nesta treva fria
A passar por um tição de fogo
Uma pira olímpica
Um archote de guerreiro
Um ânimo de gladiador
Uma disposição de soldado romano a enganar
Que este bloco de gelo
Este urso polar
Não sou eu no meu subterrâneo
Na minha caverna de homem pré-histórico
A minha ignorância só não me mata
Porque já sou um morto
Não se pode morrer duas vezes
Faço tudo o que todos os estúpidos fazem
Ajo de acordo com a unanimidade de todos os idiotas
Só quando sonho
É que posso sentir
Que sou um ser real
Livre do animalesco
Distante da selvageria
Da carnificina adiposa
Carrego nos olhos aquele medo eterno de acordar
Carrego no sangue a frieza do réptil que não sabe amar
Peço não acordeis este corpo morto
Não aticeis esta alma apagada
Este espírito pessimista
Que não vê perspectiva de otimismo em nada
Nem nos céus nem na terra
Deixai este refugiado à deriva em alto-mar
Não jogueis uma corda uma boia
Uma catraia sequer
Onde possa se agarrar
É morrer afogado nas próprias lágrimas de lamentações fim
Nada mais resta a fazer desta carcaça humana
Deus deu-lhe uma pedra
Pulverizou-a nem aproveitou a poeira
Para camuflar-se no pó virtual
É um camaleão de simulacros
Esconde-se no sono para passar a impressão que sonha
Que é vivo
Pois dizem que os sonhos nunca morrem então
Quem sonha também não morre nunca
Deixai este falsificador na sua fingida dor
Puxai as cortinas das janelas
Acobertai os aposentos
Acorrentai o sol
A lua
Os ventos
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