as peles que me cobrem não são só sete peles
e são talvez até mais do que setenta vezes sete
e são couros dos meus tios negros
e epidermes das minhas tias negras
e pergaminhos escuros
e queimados de sois africanos dos meus avôs pretos
e das minhas avós pretas
que se transformaram em
papiros de manuscritos de sangramentos
escorridos de pelourinhos
e ali a história é contada ao avesso
e a cantiga antiga cantada de traz para a frente
e a saga negada
e sempre seremos os vilões
e nunca os heróis
e sempre seremos os escravos
e escravizados
e a elite
e a burguesia representantes dos colonizadores
nunca nos pedirão perdões
nunca nos darão nossas cartas de alforrias
e sofreremos escárnios
e sofreremos racismos
e sofreremos esculachos
e demais preconceitos
e sem os nossos direitos de sermos
pelo menos seres humanos
e respeitados pela humanidade como
componentes exemplos da raça humana
sem despertar suspeitas
e lustrarei minhas peles ancestrais
e engraxarei os pelos
e os cabelos
e as dermes
e as tais epidermes de tudo
dos meus antepassados
donde sou composto com organismo
e intestinos
e entranhas
e tutanos
e medula
e testosterona
e adrenalina
e libido
e óvulos
e espermas
e sangue muito sangue arterial
para escrever as linhas trilhadas
e as correntes quebradas
e os elos despedaçados
e os grilhões arregaçados
e os precipícios superados
e os temores liberados
e todas as nossas falas
e rezas
e orações
e preces
serão em nome da liberdade
das nossas gerações em gerações descendentes livres como a brisa do vento nos chama
e nos olha nos olhos de livres irmãos
BH, 030401002022; Publicado: BH, 0201202022.
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