terça-feira, 23 de agosto de 2022

toda vez que surge um poeta à porta

toda vez que surge um poeta à porta
a mendigar vem logo alguém dizer
poeta menos menos poeta
e às vezes o pobre diabo do poeta nem captou
uma letra
ou compôs uma palavra
e vem ali um a reclamar poeta é tudo
menos poeta
poeta menos
menos poeta
e quando não é um pássaro desdenhar
é uma borboleta a menosprezar
ou um beija-flor a desprezar
e junto às ondas das águas antigas do mar
mas em uníssono menos poeta
poeta menos
e o desdito desiste do dito num grito
e enfia o rabo entre às pernas
e vai às encruzilhadas a fazer mandingas
a fazer pactos aos pacotes às musas
ou fazer cantigas às namoradas janeleiras
esperançosas mas aparece uma mariposa
ou uma joaninha
e lá vem menos poeta
poeta menos
e continua a ladainha
laudas
e mais laudas que terminam num laudo
depois do poeta deposto prostrado no asfalto
frustrado das grandes cidades
e as cigarras
as sirenes das fábricas
e os sons
e as buzinas
e as lamúrias
e apupos menos poeta menos

BH, 01401002021; Publicado: BH, 0230802022.

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