Arroz, feijão, filé de frango grelhado, carne ensopada, salada, gelatina e sorvete. Para beber, só água mineral e refrigerante zero. O cardápio light do almoço no escritório combinava com o atual momento do ex-presidente Lula, totalmente recuperado do câncer da laringe, mais magro e de alto astral. "Só não vá me falar mal de ninguém...", recomendou, quando lhe disse que iria escrever sobre nosso encontro aqui no Balaio.
Nem haveria motivo. Falamos mais de planos para o futuro e das nossas famílias do que dos assuntos políticos do dia. Por falar nisso, pela primeira vez em muito tempo, ao longo da nossa conversa Lula não fez críticas à mídia, o que me chamou a atenção. Melhor assim. De bem com a vida, esperando o nascimento de mais um neto, o sétimo, o ex-presidente parece ter tirado um enorme fardo dos ombros depois de oito anos de Palácio do Planalto. E estava feliz também porque amanhã à noite vai receber mais um título de Doutor Honoris Causa, desta vez da Universidade do ABC, que ele mesmo criou em seu governo, e já conta com mais de 12 mil alunos.
À mesa da sala de almoço, só nós dois e seu fiel escudeiro Paulo Okamoto, presidente do Instituto Lula. Fazia tempo que a gente não tinha um papo assim tranquilo, desses em que se pode falar bobagem e não tem hora para acabar. Mesmo depois de ter deixado a presidência, Lula vive sempre cercado de gente, enfrentando uma agenda carregada, entre uma viagem e outra.
Na manhã desta terça-feira, ele tinha participado de uma longa reunião no pequeno auditório do Instituto Lula, com cerca de 20 representantes da Coordenação Nacional das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ), que foram convidá-lo para participar do V Encontro Nacional de Quilombos, e aproveitaram para lhe entregar uma lista de reivindicações. Lula ficou de encaminhar o documento à presidenta Dilma.
Como já acontecia antes de ser eleito presidente, Lula faz questão de manter um diálogo permanente com os movimentos sociais, uma forma de se manter informado e, ao mesmo tempo, participar de algum jeito da busca de soluções para o país. É exatamente isso que o move no momento: despertar o interesse da sociedade, em especial dos jovens, para participarem das discussões sobre os rumos do país, em vez de ficar só reclamando pelos cantos.
Já há alguns meses ele vem se reunindo com um grupo de cerca de dez ex-integrantes do seu governo para pensar o Brasil do futuro, com metas, prazos e custos, sem o imediatismo dos programas das campanhas eleitorais. Para marcar um prazo de valor simbólico, lembrei-lhe que nem falta tanto tempo para comemorarmos o bicentenário da nossa Independência, no dia 7 de setembro de 2022.
O desafio deste projeto é não se transformar numa discussão acadêmica, criando mecanismos capazes de levar o debate aos diferentes setores da sociedade, que também estão pensando em propostas para o futuro. Isto já está sendo feito.
Em termos mais imediatos, ele terá nesta quarta-feira um novo encontro com a presidenta Dilma Rousseff, que virá a São Paulo para participar da homenagem a Lula no ABC. Desta vez, certamente entrará no cardápio a reforma ministerial prevista para o início do próximo ano. É a vida que segue, sempre batalhando por um futuro melhor, que só depende de nós. Eleições à parte, é bom pensar nisso desde já.
Valeu, Lula. Foi muito bom o almoço. Até o próximo...
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