quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Llewellyn Medina, É difícil explicar.


                                               É  difícil explicar

                               É difícil explicar o olho cumprido do sol
                               que abarca a finitude  do olho cego do homem
                                olha em direção do nada
                               como se olhasse esperançoso para o Getsemani
                              
                               já cri na incerteza da vida
                                segue indiferente se vida não existisse
                               no embate imemorial  que a morte vence sempre
                               e vence até mesmo quando vida ainda não existe

                               espreito a vida passar anonimamente
                               vejo- a através da veneziana fechada de minha infância
                               e vejo-a com os sonhos que já tive
                               e que me deixaram vazios de mim mesmo
                               vejo-a ainda na lembrança da andorinhas
                               que escreviam concertos nos fios infindáveis
                               que ligavam postes em posição de sentido
                               mas não ouço mais os acordes daqueles sons
                               daqueles sonhos juvenis
                               não ouvi e ainda não ouço

                               a vida passa filtrada pela veneziana fechada
                               meu coração não se abriu então
                               e ainda não se abre
                               era uma vida só

                               é uma vida de solidão.

Alameda das Princesas, 756, 15; BH, 0150802012; Publicado: BH, 02601102014.

Sonho que posso dizer sem sombras de dúvidas
Penso que sem modéstia que tenho o dom da
Sabedoria o sonho é meu a boca é minha a
Cabeça é minha posso dizer o que quiser o que
Pensar o que sonhar até escrever a caneta
É minha o papel é meu então posso escrever o
Que quiser com pretensão ou sem pretensão se
Quiser pensar posso pensar chegar à conclusão
Que sou sábio sem provar nada sem saber de
Nada ter o dom da sabedoria é ser igual ao
Sócrates não gravar nada na pedra não escrever
Nada nem saber de nada é isso que me faz
Pensar que tenho o dom da sabedoria sem tese
Sem teoria sem ensaio sem poema sem poesia
Qualquer um pode pensar assim é um direito
Ninguém pode negar da mesma maneira que digo
Que sou bizarro mórbido estúpido cheio de
Aberração também posso dizer que sou sábio
Cheio de sabedoria é um princípio meu quem
Não gostar é tirar as calças pela cabeça quando
Digo que sou ignorante ninguém contesta mas
Quando digo que sou sábio sabiá cheio de
Sabedoria o mundo vem abaixo não sei é
Ganhar dinheiro não sei é ser rico empresário
Banqueiro mas sei como não deixar ninguém
Pobre nem na miséria é só ninguém ser
Banqueiro empresário empreiteiro ou é só
Ninguém querer ser rico pois para alguém ficar
Rico um grande número tem que ser pobre
Miserável sou ou não sou sábio? tenho ou não
Tenho o dom da sabedoria?

terça-feira, 25 de novembro de 2014

Alameda das Princesas, 756, 14; BH, 0150802012; Publicado: BH, 02501102014.

De olhos fechados não quero mais abrir
Os olhos de olhos fechados cadê as antigas
Paisagens? cadê as chamadas belas vistas?
Em tudo que olho vejo modernas torres
Luxuosas espigões milhares de edifícios
De olhos fechados não abrirei os olhos
Cadê a natureza os vales os rios os mares?
Para onde olho só enxergo fumaça
Esqueletos calcinados pela seca
Cemitérios de árvores vastos espaços
Para estacionamentos de automóveis de
Hoje em diante viverei de olhos fechados
Recuso-me a enxergar para não
Ver as borboletas as joaninhas os
Finados insetos que as queimadas
Causam aproveitarei que estou a ficar
Cego a cegueira é hereditária na
Família não desgrudarei mais os
Cílios das pestanas para não enxergar
Não ver nada não olhar o horizonte
Não fixar as vistas no infinito não procurar
Com os olhos as portas do firmamento
Para que olhos abertos se não se pode
Mais desfrutar do universo? não quero
Mais meus olhos abertos espanta-me o
Que vejo mete-me medo o que
Enxergo arrepia-me o que olho
Até o corpo da mulher que gostava
Tanto de apreciar parece-me estranho
Corpo de robô de gladiador de arena
Dalgo feito em clínicas de estéticas
Como as bonecas feitas em fábricas passadas
Recuso-me a andar de olhos abertos quem
Encontrar comigo por aí guia-me
Com se guiasse um cego de nascença

Alameda das Princesas, 756, 13; BH, 0150802012; Publicado: BH, 02501102014.

A sabedoria abre qualquer porta é a
Maior a melhor percepção a sabedoria
A sabedoria é o melhor caminho para
Se viver não matar não morrer
Quem vive com sabedoria vive com
Razão com nexo tino raciocínio
Pensamento lógico sabedoria é a
Lógica a dialética o dia em
Que o mundo chegar à conclusão de
Que a salvação do mundo é a
Sabedoria o mundo mudará radicalmente
O que é viver com sabedoria? é justamente
Ir contra o establishment atual é ir
Contra o status quo a mídia os bancos
Governos a sociedade opressora o mal
Que causa o capitalismo selvagem o
Neoliberalismo radical sabedoria é
Ir contra a ditadura das igrejas
Das seitas das religiões sabedoria é viver 
Receitas perfeitas com intuição não errar é ser
Intuitivo certo independente com
Liberdade assumir os erros quando
Errar não permanecer nos erros
Nem cometê-los mais sabedoria é saber
Usar os sentidos tirar proveito dos
Elementos preservar conservar não
Ser conservador nem retrógrado se
Colocar na cabeça que sabedoria é coisa
Velha ultrapassada para velhos que
Não se usa mais nunca se chegará
Ao berço dos sábios sabedora é a mãe
Da imaginação da inspiração da
Criatividade é obrigação colocá-la
À frente de cada passo que for dado
Nas estradas do destino das nossas vidas

Candeia - Candeia Samba da Antiga (1970)

segunda-feira, 24 de novembro de 2014

Alameda das Princesas, 756, 12; BH, 0150802012; Publicado: BH, 02401102014.

É mais fácil ganhar um salário mínimo por dia
Do que compor uma obra-prima por dia
Um soneto que seja uma obra de arte
Um poema clássico
Ou uma poesia imortal
Uma ode perpétua
Uma elegia pétrea de teor eterno
Um canto que entre para a eternidade
É mais fácil até bem mais cômodo
Ganhar um salário mínimo por dia
Qualquer um pode ganhar um salário mínimo por dia ou dois
Compor uma sinfonia de letras palavras sem sons?
Escrever um concerto aos surdos mudos cegos?
Trazer às folhas de papel papiros pergaminhos
Manuscritos que jamais o homem imaginou?
Registrar para os anais das antologias literárias
O que nunca poderá ser sondado por aparelho algum?
Isso aí anonimamente nos silêncios
Das madrugadas no olho do furacão
Nos limites do universo
Nas curvas do infinito
Isso aí no meio das procelas dos negros
Tenebrosos mares
A nadar com uma única mão
O que é mais inusitado
É que não quero ganhar um salário mínimo por dia
Não escolhi o caminho mais fácil
Procurei o submundo
O fundo dos poços
A argila sedimentada de geração em geração
Duma forma ou doutra
Levo ao meu coração sedento
A luz das estrelas que não existem mais

Alameda das Princesas, 756, 11; BH, 0130802012; Publicado: BH, 02401102014.

Meus inimigos moram todos dentro de mim nas
Minhas moradas são meus hóspedes não
Pagam aluguel meus inquilinos são
Meus adversários perturbam meu sono
Não me deixam sonhar causam-me
Mil pesadelos em cada caos que me
Habita há um universo em colisão
Mundo em tempestade não são
Simpáticos a mim quando os olho
Fazem caretas negaças moleques
Pregam-me peças não os domino como
Se estivesse de muito longe tão aqui
Perto do lado de dentro não os controlo
Personagens inquietos irritantes coadjuvantes
Protagonizam cenas de filmes de terror
De obras de horror de literaturas que
Não deixarão antologias de herança
Meus condôminos inadimplentes causam-me
Débito crise meus inimigos juntos comigo
Escravizam-me fazem o que querem
Não há escapatória não há
Alternativa tenho que hospedá-los em
Minha hospedaria são muitos exigentes
Se alimentam bebem sorvem-se
Da minh'alma sugam o meu espírito
O meu ser míngua me torno todo
Em pele osso passo pelos anos esqueleto
Enigmático anônimo irreconhecível
Entro em casas casas de cupins picumã
Teias de aranhas revolto-me com
Eles os expulso resistem rebelam-se
Mas ao primeiro raio de sol até os
Que não corriam da cruz os que
Não afugentavam-se com alho
Disparam-se desesperados pelas estradas

Alameda das Princesas, 756, 10; BH, 0130802012; Publicado: BH, 02401102014.

Cérebro dorminhoco letárgico preguiçoso cérebro
Inerte em repouso estacionado se procurar
Um pensamento nele não encontra
Se procurar uma ideia não acha nada
Se precisar duma ajuda uma alavanca
Uma solução fica a papar moscas
Cérebro sonolento não acorda nem
Com o barulho do vento o marulho das
Ondas do mar o farfalhar da brisa
Nas folhagens não provoca uma excitação
Uma ereção nem libera a libido
O testosterona cérebro de velho senil
Decrépito degenerado quantas vezes bati
Nele com a tábua de bater bifes não
Amolecia nunca? enervava endurecia
Ficava impróprio ao consumo quantas
Vezes fazia com ele massa de bolo de
Pão não dava ponto? o bolo pubava
O pão mirrava quantas letras procurei
Nos baús? quantas palavras nos labirintos?
Por mais que me embrenhava
Perdia-me desistia de dar vida
À esta natureza morta inventei
Engenhocas moinhos máquinas do tempo
Usinas de vinhos aríetes destruidoras de
Muralhas não engendrava estas
Paredes insondáveis quantas vezes perscrutei
No céu deste universo naves espaciais discos
Voadores? esperei em campos de pouso
A chegada dum nada de novo
Cérebro solitário perdido em órbitas
Pelo infinito errante em elipses por
Ter o campo gravitacional menor
Do que a força doutros astros cérebro
Satélite de todos os cérebros

domingo, 23 de novembro de 2014

Alameda das Princesas, 756, 9; BH, 0130802012; Publicado: BH, 02301102014.

Podeis zombar rir se quiserdes estou
Acostumado às bizarrices aberrações estupidezes
Da humanidade podeis gracejar fazer como
Os pássaros as árvores ignorar-me com
Indiferença de gelo seco ou de fumaça de
Gás não moverei um músculo do meu composto
Muscular não vibrarei uma fibra nem
Abalarei um tendão por vossas suspeições as
Vossas inquietações não são as minhas as
Minhas inquietações são os equilíbrios
Entre as estrelas as minhas inquietações
Não são mesquinhas rasteiras daninhas
Preocupo-me em materializar o universo
Na palma da minha mão quando
Passar com a minha carruagem de fogo
Minha caravana vitoriosa rumo ao monte
Não ides pensar que esnobo-vos que desprezo-vos
Pelo contrário deixarei nas areias dos
Desertos as pegadas dos elefantes dos camelos
Para que podeis seguir as trilhas em direção
Ao oásis tomais das tâmaras dos damascos
Aplacais vossas frustrações tomais do mel
Leite fresco puro das cabras nobres
Matais vossas sedes as tendas estão armadas
As odaliscas a dançar poesias árabes serão
Declamadas conhecereis as culturas
As sabedorias dos desertos dos beduínos
Suas hospitalidades exultais-vos conosco
Comeis do pão bebeis do vinho dançais com
As musas as ninfas as ninfetas dos
Sonhos das mil uma noites Sharazades
Vos esperam em vossas tendas de hóspedes
Tenhais belas noites infindáveis ternas
Madrugadas de mais doces beijos de mais
Delicioso amor sentir-vos-eis no paraíso

Alameda das Princesas, 756, 8; BH, 0110802012; Publicado: BH, 02301102014.

Recital de letras palavras para aqueles
Que salivam ao ler uma poesia
Recital de frases pensamentos estrofes
Versos versículos para aqueles que babam
Ao ler um poema é um recital
Aos que ficam bobos de encantamento
Diante dum soneto fazem reverências
Mesuras saudações à antologia poética
Aos mecanismos da inspiração aos
Filhos da imaginação às filhas
Da criatividade criaturas recital para os
Amantes das genialidades das letras
Das genealogia das palavras das
Fenomenologias das expressões idiomáticas
Recital aos cantores de odes de cânticos aos
Deuses aos aedos recitadores de
Salões nobres recital às culturas
Populares eruditas clássicas deferências
Pelos resistentes apaixonados do belo
Recital à filosofia aos gregos ao
Olimpo à dialética aos filósofos
Recital aos céus milenares eternos
Que nos observam nos lançam
Às ondas dos mares suspensos para
Mergulharmos em busca dos nossos
Tesouros recital ao firmamento
Sinônimo de garantia segurança
Confiança recital às mulheres
Especialmente às mulheres muitas
Vezes nossas vítimas recital às
Crianças aos adolescentes por
Que não recital aos velhos muitos
Poços potes moringas de sabedorias
Recital às tardes morredouras para
Dar vida às noites vindouras
Essas às madrugadas inspiradoras
Recital recital recital recital sem fim

Alameda das Princesas, 756, 7; BH, 0110802012; Publicado: BH, 02301102014.

Para que pensar em pessoas que não pensam?
Melhor pensar nas palmeiras tamarindeiras
Pensar nos coqueirais nas amendoeiras
Para que falar com pessoas que não falam?
Melhor falar com as pradarias falésias
Falar com as pedreiras desfiladeiros
Para que viver com pessoas que não vivem
Esperam vida após a morte?
Melhor viver com os mortos
Viver com fantasmas espíritos,
Ectoplasmas almas
Para que teimar com quem esquece
Os princípios os provérbios
Os salmos os hinos os cânticos?
Melhor teimar com os rios
Teimar com os mares
Com os peixes que vivem neles
Para que auscultar corações que não batem
Não disparam nem reverberam?
Melhor auscultar o oculto
Sondar o insondável
Perscrutar o imperscrutável
Para que conhecer o que não é engendração?
É melhor ser um mentecapto
Um energúmeno do bem
Bom que não seja mau para ninguém
Para que torcer para o fim da maldade
Com aquele que não quer o fim da maldade
Mesmo assim inda pensa que entrará
Nos reinos dos céus os outros não?
Para que pregar o fim da estupidez ignorância
Se não queremos deixar de ser estúpidos
Não queremos deixar de ser ignorantes?
Continuamos bizarros mórbidos
Com pensamentos perversos atitudes
Comportamentos de hipócritas
Para que a luz se persistimos nas trevas?
Vou ouvir os pássaros as abelhas
Ouvir o farfalhar das folhas
Vou aprender com os urubus o mais
Elevado desprezo pelas coisas boas
Pelas carnes frescas voar bem alto

Alameda das Princesas, 756, 6; BH, 0110802012; Publicado: BH, 02301102014.

Minha mente não revela retratos não entorta
Garfos colheres nem conserta relógios
Minha mente não coloca motores para
Funcionar não faz chover nem abre
Portas minha mente não resolve problemas
Equações funções nem desvenda conjecturas
Não é uma mente brilhante de gênio
Cheia de ideias minha mente é um
Terreno baldio um depósito de ferro-velho
Um monturo de entulho o que mais
Aborrece-me é que é uma mente
Que não se fixa aqui é uma mente
Vagabunda vadia vive de vadiagem
De vagabundagem de universo em
Universo passeia de ventos em ventos
De nuvens em nuvens de horizontes
Em horizontes gosta de ver de perto
As tempestades solares os alinhamentos
Dos planetas vive de infinito em
Infinito a visitar posteridades
Eternidades imortalidades teima
Em ser uma mente perpétua conhece
Todos os mundos submundos frequenta
Subterrâneos abismos crateras
Profundas onde escondem-se as sombras
As penumbras minha mente é assim
Números não é com ela gosta é de recordações
Lembranças memórias pré-histórias passados
Épocas eras tempos detesta religiões
Minha mente é uma mente que não a
Conheço não se deixa conhecer não
Deixa vestígios nem marcas ninguém
A conhece ou a entende despreza
Todos os poderes todas as potências se
Maravilha com as forças que a atraem

Alameda das Princesas, 756, 5; BH, 090802012; Publicado: BH, 02301102014.

Os universos estão em festa os infinitos
Desses universos estão mais infinitos
Fizeste aniversário celebraste mais um
Ano de vida mas és o único astro desses
Caos que não sabes que fizeste aniversário
Foste o único que não tomaste conhecimento
Todos os astros comemoraram a data do
Teu nascimento quem és? és o que
Sou sou o que és quem és que pões
Em conflito assim a harmonia dos átomos?
Abalas as estruturas eternas quebras os
Tendões das posteridades decretas
O fim das imortalidades dos infinitos?
Quem és anjo exterminador?
Quem és predador de eras de
Épocas de tempos? quem és que me
Tens preso em teus braços arfas às
Minhas costas como um amante vigoroso
A realizar seu parceiro passivo que
Quanto mais tenta se libertar desse
Amante ativo mais se embrenha nas
Redes intrínseco um noutro
Engendrado outro num enraizados
Tornamo-nos um só genoma quem és
Fóssil vivo? anti poesia anti poema
Quem és? anti poeta? não falas nada
Apenas arfas rodopias nos redemoinhos
Balança-te embarcação nau navio
Em meio a violentas procelas bravias
Tempestades quem és boiada estourada?
Cavalos selvagens em disparada nos desfiladeiros?
Pedras desgarradas das pedreiras a rolar
Montanhas abaixo? quem és que de
Soslaio sonda-me das sombras das
Trevas do teu quarto escuro a não entender nada
Ou talvez até a entender tudo

Alameda das Princesas, 756, 4; BH, 050802012; Publicado: BH, 02301102014.

Poesia é tudo que não é humano
Quando é humano
Não é poesia
Poesia é tudo que é inanimado
É também animado
Desde que não seja humano
Poesia é tudo que é antigo
Passado
Presente
Ultrapassado
Antiquado
Ancestral,
Antepassado
Velho
Fóssil
Pré-histórico
Doutras eras
Doutras dimensões
Poesia para ser humana
Só pode ser moderna
Estar na moda
Em evidência
Na fama.
Aí é lama

Alameda das Princesas, 756, 3; BH, 050802012; Publicado: BH, 02301102014.

Quanto tempo dura a se materializar
Numa pedra desta uma consciência
Preciosa? direis depende do rebolo do
Polidor de quem sabe manipular os dois
Tento manipular a caneta contra o
Vento as nuvens as estrelas naturalmente
Natural igual a água nascente nos morros
As que formam fontes as levam os vendavais
As que correm nas valas pradarias as das falésias
Mas não me animei fiquei por muito tempo
Estendido no varal para secar a tarde
Passou tediosa o entardecer mais lento
Fiquei triste por perder tanto tempo quanta
Luz desperdiçada quanta energia não
Utilizada mal canalizada jogada fora
Consultei oráculos xamãs pajés pais de santos
Pretos-velhos consultei magos bruxos astrólogos
Cartomantes cada um individualmente
Veio com uma mentira diferente a jurar
A querer comprovar que era verdade
Consultei almas espíritos demônios fadas
Duendes anjos cada um me apresentou uma
Solução à sua maneira derrubei a todos
Com uma resposta à minha maneira
Não acredito em nada além de mim
Como poderia receber mais bençãos mais milagres
Mais perdões salvação do que um menino da
África subsaariana? como posso merecer mais
Privilégios do que os sertanejos sem água?
As meninas prostitutas do Vale do Jequitinhonha?
Se os deuses tiverem de fazer alguma coisa não
Façam por mim façam pelas vítimas da fome
Do capitalismo das religiões dos preconceitos
Façam pelos órfãos das guerras das violências
Quando dura um raio de lucidez
Na corda da circunferência?

sexta-feira, 21 de novembro de 2014

Alameda das Princesas, 756, 2; BH, 030802012; Publicado: BH, 02101102014.

O sol do sertão queimou minhas retinas
Não viraram mar nunca inclusive
Para chorar era uma absurdidade faltava
Água para lágrimas chorava então o
Que chora todo sertão vento acompanhado
Evento com tempestade de areia espinhos de
Cactos flores de palmas raízes de mandacarus
Desertos de rios temporários rastros de cobras
Pegadas de lagartos ferrões de escorpiões
Chorava tudo que era seco como a música de
Sérgio Ricardo na trilha sonora de Deus e o
Diabo na Terra do Sol de Glauber Rocha
Chorava tal qual o enterro do sertanejo que
Não teve choro nem vela nem ladainha
Um choro de poeira de ossadas de bois
Outros bichos ressequidos nas estradas um
Choro marcado no compasso dos pés
Descalços outros calçados com alpercatas
Nas procissões pelos caminhos de terra
Batida o sol queimou as fontes d'água
Da minha fronte tive que beber suco
Gástrico pancreático bílis tive que beber
Fel felpudo arsênico cicuta não pude
Mais embriagar-me como gostava antes
O sol fez com que as minhas taquaras
Rachassem pocassem em fogos de
Artifícios sem noites de São João posso
Ficar na chuva que encha todos os oceanos
Mares posso ficar na chuva de dia de noite
O barro é tão tórrido tão denso de coeso
Que a água não penetra continuo seco
Árido sertão agora não só nos olhos
Mas em todas as moradas dos meus recônditos
Sertão no espírito na alma no ser sertão no
Corpo deserto no coração mar nunca não

quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Alameda das Princesas, 756, 1; BH, 030802012; Publicado BH, 02001102014.

Por mais que queira apurar os sentidos perco
Os sentidos queira agir com consciência
Perco a consciência nada há em mim além
Da treva fria que habita meu ser por mais
Que queira ser moderado sou sem moderação
Ser educado sou sem educação o que
Mais há em mim é a estupidez que não
Acaba a ignorância que não me deixa
Viver por mais que queira não usar as palavras
Não há outro jeito tenho que usar as palavras
O mais imbecil de tudo é que abuso das
Letras dos verbetes abuso dos vocábulos das
Expressões idiomáticas nunca tenho nada
Para dizer o vento que não vejo o ar que respiro
A água que bebo a terra que piso o fogo que
Queima-me são os elementos que independem
Da minha existência em tudo estão inclusos
Em harmonia em mim a quebra deles
É fatal o que resulta num espírito atribulado
A alma pode nem aparentar o ser enganar
Mas a geleira milenar se um dia inda
For extinta resultará em água fria
Gelada pois por mais que queira ter algum
Sentimento afasto-me de todos até de
Deus e de todas as religiões afasto-me da
Natureza das pessoas da vida mesmo
Que um dia meu nome por algum fator
Seja gravado numa pedra da pedra não
Levo nem composição nem consciência
Mais para arenito poeira pó não finco
Estaca sobre mim nada se sustentará as
Ferrugens limo isso sim no fim me cobrirão
Como acontece com as velhas sepulturas
Abandonadas nas beiras das estradas
Esquecidas das cidades fantasmas medievais

quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Cambaleante equilibrei-me na linha do horizonte; BH, 0901202012; Publicado: BH, 01201102014.

Cambaleante equilibrei-me na linha do horizonte
Bebi mais uma depois mais outra a tremedeira
Das mãos não parou inutilmente desenhei
Algumas letras nos rostos das pedras virgens
De perfil em perfil na cordilheira dos Andes
Juntei as palavras que o vento escreveu evento
Ao léu andei descalço em paralelepípedos
Aquecidos pela luz do sol escaldante
As minhas solas ficaram presas fossilizadas
Nas faces dos paralelogramos quando foram
Encontradas no futuro cada estudioso deu
Uma versão diferente uma tese uma teoria
Um ensaio nenhum acertou no prognóstico
Mas enquanto corriam pelos asfaltos com as
Novidades estampadas nos semblantes sou o
Que lavrava arava garimpava descia pelos
Escoadouros de areia dos desertos subsaarianos
Ia mastigar areia nos subterrâneos desses
Desertos abastecia de areia as engrenagens do
Universo emperrava-o não ia mais adiante
Sem conjecturas fórmulas equações sistemas
Controlava os meandros das dimensões
Intersiderais ria dos estudiosos debochava
Dos catedráticos dos academicistas
Mangava dos ensaístas teóricos conferencistas
Quem os mandou não ter a autoridade dos
Confinados em celas invioláveis dos hospícios?

The Doors, Little Red Rooster.

Estas palavras são as palavras do pior ladrão; BH, 0901202012; Publicado BH, 01201102014.

Estas palavras são as palavras do pior ladrão
Da espécie dos ladrões o mau ladrão pois
Roubo a Deus roubo as coisas divinas
Sagradas consagradas as transformo
Em poesias profanas roubo do Senhor
O azul do céu o metamorfoseio
Em poemas promíscuos estas letras
São as piores letras do pior assaltante
Da classe dos assaltantes assalto as
Belezas universais delas componho
As minhas elegias estas linhas são
Assassinadas pelo mais sanguinário
Dos assassinos da ordem dos assassinos
Pois mato as obras que Deus criou
Não poupo fauna flora natureza
Extermino tudo anjos deuses céus
Não crio uma obra que seja catalogada
Nos anais das obras até a mais perfeita
Máquina criada a deterioro como
Pode haver salvação para poeta? como
Pode haver redenção perdão para o ser
Que se diz poeta? ao próprio Deus o poeta
Quer destruir em suas escrituras
Bate de frente com Deus blasfema protesta
Duvida exige atitudes iguais para ambos
Acaba por ser encarcerado em hospício
Só vem à tona em camisa de forças
Como pode haver sanidade em poeta?
Razão lucidez sobriedade consciência?
Quando segura uma pena com a sua mão
O poeta perde isto tudo perde a condição
De ser considerado um ser criado por Deus

Só sonho em escrever obras de arte; BH, 0901202012; Publicado: BH, 01201102014.

Só sonho em escrever obras de arte
Não consigo
Sonho em escrever obras-primas
Infrutífero
Acordo para os pesadelos da realidade
Parto para o parto destes garranchos
Nesta parca folha de papel
Sem sucesso
Teimo em voltar às cavernas
Escrever nas paredes delas
As escritas rupestres
Com alguma esperança
Dalgum pesquisador de escritos antigos
Atinja as cavernas onde os escritos
Estão esquecidos nas paredes
Ledo engano
O que penso escrever então
Nesta pré-história em que vivo
Se a literatura não faz mais sentido?
Persisto nestas escrituras fossilizadas
Que nunca serão lidas
Teimo nestes escritos toscos
Que não impedirão o suicídio da humanidade
Mas enquanto não arranjar uma lápide
Para a cabeça parar de latejar
A saída é esta sangria
Como se fazia antigamente
Numa provocada hemorragia
Para o paciente não morrer
Molho a pena do meu osso no meu sangue
Na minha pele desidratada
Minha obra é registrada
Se será clássica erudita
Nem o tempo poderá dizer
Pois até ser encontrada
O tempo não existirá mais
Sem o tempo não há razão de viver

Quando o fundo do oceano rachar; BH, 0901202012; Publicado: BH, 01201102014.

Quando o fundo do oceano rachar
Toda água escoar para o vácuo
O que será do planeta Terra?
Quando na última camada da atmosfera
For feito um rombo
Todo o ar escapar para o espaço?
O que será do planeta Terra?
Vagará pela dimensão intersideral
Como um planeta perdido morto?
Quem salvará o planeta que perde
Suas matas florestas taipas tundras?
Quem evitará a extinção
Se temos as águas poluídas
Os rios assassinados
Os lagos mortos
As lagoas secas?
Quando estivermos a nos afundar
No buraco que fenderá a Terra ao meio
Não encontraremos nenhuma raiz
Para nos segurar
A destruição que causamos ao meio ambiente
É completa e insensata
Colocamos em risco os alicerces
Da nossa própria casa
Quando o fundo dos oceanos se partirem de vez
Se escoar as águas dos oceanos
Dos mares dos rios das lagoas dos lagos
Dos regatos dos riachos dos arroios das fontes
Das cachoeiras das cataratas das corredeiras
Das enxurradas dos ribeirões
Não choverá mais
Choraremos
Mas nossas lágrimas não serão suficientes
Para repor as águas escoadas
Este belo planeta
Que deveria ser o nosso orgulho
Que deveria ser o nosso maior ufanismo
Por vivermos aqui
Dará adeus às suas ilusões

segunda-feira, 10 de novembro de 2014

Llewellyn Medina, Ode ao Pau Velho.

Ode ao Pau Velho


                O Pau Velho é como um veio
vai  do coração de minha infância
até  depois de mim
minha permanência fugaz
o Pau Velho não tem fim


o Pau Velho lembrança perene
sentimento entranhado indene
compartilhado comigo mesmo
um rastro fio de Teseu
da imortalidade juvenil ao Nada
à decrepitude portal para a Grande Ceifadeira
vem lampeira  vem certeira
flecha desde sempre disparada
blasé aguardo sua chegada
o Pau Velho não tem fim


o Pau Velho casas geminadas
bulevar anseios se perdiam
principalmente se perdiam
mundo mundo mundo
pequenino vasto mundo
não tinha fim o Pau Velho
o Pau Velho não tem fim


o Pau Velho era assim
jogo de pião como se fosse agora
                pelada de futebol no campinho
papagaio empinado sozinho
o rio costurava a paisagem
testemunha silenciosa ao lado
banho nele minha mãe proibia
schitosoma mansoni ela dizia
oh! tanta proibição
tanta coisa proibida
dez são os mandamentos ou não
eram muitos mais então
o Pau Velho era assim
o Pau Velho não tem fim



o Pau Velho não tem fim
éramos eu e Miguilim
ungiu-me pela primeira vez
o oculto Deus-Sangue do Rio
afogou-me  revivi
uma torrente pulsante
daqueles dias de infante
aos dias depois de mim
o Pau Velho não tem fim.