Poderia gostar de poder dizer
Que herdei de Fernando Pessoa
Todas as vidas dele
De seus heterônimos
Que herdei de Marcel Proust
Toda a densidade
A complexidade
Da obra-prima que criou
Poderia gostar de poder dizer
Que sou todas as personagens
Com as quais José Saramago
Encantou a humanidade
Do mineiro que sou
Poderia gostar de poder dizer
Que trago os traços do barroco do Aleijadinho
Da Inconfidência do Tiradentes
Ou da literatura dos nossos mestres
Os quais não reverenciamos
Rosa Drummond Sabino
Gostaria de poder sentir em mim
Que sou uma ferramenta
Um Machado
Um ser alado
Um Autran Dourado
Ou um ribeirão
João Ubaldo Ribeiro
Essas bebidas preferidas pelos deuses nas libações
Esses vinhos de uvas castas
Uvas nobres
Que fazem os céus ficarem mais azul
Quando jorram em cálices de cristais
Esses manjares de acepipes
Essas carnes de cordeiros assadas
Em altares de banquetes
Essas gorduras sagradas
São muitas vezes desprezadas
Pelos que vivem em busca duma vida de saúde
De músculos de plásticos
Em templos de academias
De desenvolvimento de matérias perecíveis
Mas gostaria de herdar desses monstros santificados
Desses Sócrates
Platãos
Todos os seus deuses
Seus demônios
Para que um dia
Tenha uma poesia
Que seja também uma das pilastras
Das que sustentam o firmamento
Para que não caia em cima de nós
Tais as pilastras desse firmamento
Já sustentam todos os outros
Um nome obscuro ressurgiria no meio de tanta luz
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