Escrevo como um esquizofrênico que chora
Ao ver numa página de jornal a fotografia de seis homens
Negros amarrados por cordas no pescoço seguras por um policial
Numa batida em favela de grande cidade
Escrevo como um cineasta que filma o próprio
Cadáver dentro do caixão até à decomposição final
À chegada aos ossos do esqueleto
Escrevo como um político morto que cujas carnes
Imprestáveis foram rejeitadas pelos vermes
O cadáver não apodrece de tão ruim que que foi em vida
Na esquizofrenia da minha literatura esquisita
Estranha às entranhas dos princípios óbvios
Lógicos racionais éticos descubro o meu medo
Revejo a minha covardia a minha injustiça
As nódoas deixadas por mim as falhas os
Defeitos os erros os pecados os complexos os
Tabus os dogmas os preconceitos os dilemas
Os teoremas os quais não consigo vencê-los
Não consigo bani-los da alma do espírito
As segregações os desequilíbrios sociais a fome
A miséria eterna a desgraça infinita
Escrevo como o líder revolucionário que causa
A morte de milhares de civis crianças homens
Mulheres velhos espalha o terror os campos de refugiados
Flagelados as mazelas das empreitadas que
Sonha ambiciona em transformar na
Sociedade a pagar preço tão alto derramamento
De sangue tão vil insensível às vistas
Ao coração à mente sem memória pensamento
O importante de tudo não é tudo é o
Nada o não temer o não ter o que temer
Se é mais importante ter então é temer
Por ter pois se não tiver não tem o que
Temer ter o necessário para viver repartir
O que tem com o que não tem nem
O que comer nem o que vestir nem onde
Morar nem onde estudar adquirir educação
Sair da ignorância sair da obtusidade
Entrar para a história fazer história
Acreditar ter fé esperança paixão
O que as nossas crianças aprendem são só os
Abusos sexuais a prostituição infantil
O trabalho escravo o roubo o ódio a vingança a ira
A falta de amor do lar da família
Não permita Deus que morra sem
Completar meu sonho dum dia
Ver mudar a concepção da humanidade
Em relação à humanidade a concepção
Do homem em relação ao homem
À natureza ao planeta ao universo
Lamento só não poder me dissecar
Não poder pôr à mostra os meus órgãos
Internos me espalhar pela vida me
Abrir de cabo a rabo a deixar à luz do
Dia, tudo que existe dentro de mim
Transportar para o meu interior tudo
Que estiver no meu exterior para ver
Assim se transponho os abismos as dores
Os sofrimentos os temores com o tempo
Olhar-me com dignidade no espelho
Olhar-me com carácter com uma outra visão
Ultra om um outro novo olhar que evacue
Das entradas das minhas estradas as trevas
A penumbra as escuridões devoradoras
Que metem medo às crianças abandonadas
Aos órfãos esquecidos aos meninos desmembrados
Pelas minas terrestres às meninas acossadas
Pelas feras que querem desvirginá-las antes da hora
Escrevo como um boi que vai para o matadouro
Como uma galinha preste a ser degolada pela
Empregada da patroa para o almoço como a
Ovelha presa às garras do leão o passarinho
Nas presas do gavião a lebre às da águia
Escrevo como quem morre sem ressurreição
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