sexta-feira, 14 de junho de 2013

Folhas de papel que vão aparecer à minha frente, BH, 0250102000; Publicado: BH, 0140602013.

Folhas de papel que vão aparecer à minha frente,
Folhas brancas de papiros e infinitas, prontas para
Serem preenchidas por meus toscos rabiscos, como
Os deixados sobre as paredes da cavernas pelos
Meus antepassados e que também se preocupavam
Em deixar para o futuro, os fragmentos marcados além
Das paredes das grutas, nas pedras, e utensílios;
E do mesmo modo, quero deixar para o futuro,
Os meus fósseis, instrumentos rudimentares,
As minhas experiências e tentativas de deixar
Registrados nalgum lugar os meus pensamentos;
Pois, igualmente, sou um homem pré-histórico,
Sou um troglodita da idade da pedra e o
Que resta em mim, são só divagações vazias;
Talvez aprenderei da mesma maneira que o burro
Aprende ocaminho da casa do dono, ao aprender
A preencher os vazios da minha mente com
Utilidade, capacidade e competência mental;
O restante não faz mal, se não conseguir,
Resta-me pelo menos a tentativa, por saber
Ir ao encontro da diferença, dos percalços, ou
Dos empecilhos e muralhas que parecem querer
Esgotar nossa paciência, nossa reserva física,
Moral, espiritual e o que de mais poderia
Ser salvo em nossa composição genética;
Juro por Deus que só quero é pensar, escrever
O que por ventura for pensado e continuar
Na tentativa de atingir o pensamento.
Se houver necessidade dalguma outra coisa,
Ela me será acrescentada de acordo com o
Que me vier faltar para continuar a pensar;
Pode até me faltar tudo, só não quero que
Falte-me a faculdade de pensamento;
Só não quero que me falte a aura áurea do pensar,
A ânsia dum peixe fora d'água, quando me são
Retiradas as oportunidades de pensar e escrever;
Falo assim sem pieguice e sem demagogia,
Sem modéstia, por que é o que realmente
Acontece comigo e às vezes nem sei explicar,
Às vezes nem sei entender o que se passa;
No mais é só esperar o fim de cada um, e
Que quando for chegar a hora, é só ir,
Ir na calmaria duma caravela que
Deslisa à flor d'água, na bonança,
Na certeza de que vai chegar ao fim,
Sem procela, tempestade e naufrágio;
E ao meu pai quero dizer que antes
De mais nada, é preciso ter fé e paixão;
É preciso deixar o íntimo numa boa,
Sem choração e lágrimas de aflição;
Sejas na velhice o esplendor da sabedoria,
Sejas na velhice o reflexo do conhecimento,
Não percas a presença de espírito por delírios,
Por busca constante duma fé que não
Será encontrada nunca, pois é certo
Que o homem não tem fé, desde os tempos
De Jesus Cristo; e o próprio Pedro que se afundou,
Quando nadava com Jesus sobre as águas,
E negou a Cristo três vezes irracionalmente;
À minha mãe quero agradecer o amor,
O calor demonstrado e a tentativa de criar
Um filho exemplar e protótipo para todo o
Mundo; só que esse filho procurou
Justamente o submundo, o baixo e a sarjeta,
Esse filho procurou o esgoto e os chiqueiros;
E a minha formação tinha de passar por aí,
Estava escrito o que aconteceria e qual
Seria o meu destino, mesmo que 
Quisesse ir de encontro a outro;
Agora é tarde e só me resta agradecer,
Agradecer a tentativa de resgate e salvação;
E à minha mãe, e ao meu pai, desejo uma
Velhice digna do que fizeram, uma velhice sadia,
E de alegria, gargalhadas e sorrisos, contentamento;
Nada de depressão e de sofrimento e de dor,
Mágoa, e angústia sem motivos;
Nada de entregar os pontos e por fim
À continuação da vida e da felicidade;
Meus pais, eu os amo e continuarei a amá-los;
Não soube seguir os vossos passos e maneiras,
Vossos feitos e modos, porém, à minha maneira,
E os amo desde as masmorras do meu coração;
E se um dia nos encontrarmos no além,
Se eu for primeiro, ou vós fordes antes,
Mandaremos sempre mensagens uns para os outros;
Estarei sempre na expectativa da recordação,
Sempre na lembrança, e na memória
Das faces que desde menino aprendi
A apreciar e nunca demonstrar por algum motivo;
Somos assim mesmos nas nossas imperfeições,
Somos assim mesmos nas nossas decadências;
Acabamos e não atingimos os nossos objetivos,
Os nossos meios e os nossos destinos e fins;
E no fim, o fim para nós não pode ser
Simplesmente uma palavra fim, the end,
Como se fosse num filme, ou algo assim;
O fim para nós tem que ser diferente,
E temos a obrigação de fazê-lo diferente;
Temos a obrigação de mudar na última
Hora o enredo da nossa história;
E no lugar do epitáfio, colocar prólogo,
E no lugar do fim, colocar começo,
E no lugar do choro e lágrimas, músicas,
Danças e adufes, pandeiros e cânticos;
Canções e melodias, sorrisos e abraços,
Despedidas como se fossemos nos encontrar
Breve, pois tão breve é o nosso tempo,
Que nada mais, melhor do que breve,
Para nos encontrarmos brevemente.(2)

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