segunda-feira, 18 de abril de 2011

Mário Quintana, Das Metamorfoses; BH, 0180302011.

A lua, quando fica velha, todo o mundo sabe que vira lua-nova.
Mas negro velho vira macaco.
Desses macaquinhos de realejo...
Cuidado: quanto mais velhos mais vivos.
Sabem tudo.
Descobrem tudo.
Se tem algum pecado oculto, foge das suas caretas, falsamente amigas,
Dos seus olhinhos espertos e cínicos!
E os velhos jurisconsultos viram fetos... esses fetos que a gente olha,
Meio desconfiado, nos bocais de vidro...
E que, no silêncio dos laboratórios, oscilando gravemente as cabeças
Fenomenais, elucubram anteprojetos, orações de paraninfo, reformas da
Constituição...
Sempre que puderes, crava um punhal, um garfo, um prego, no miolo
Mole dos fetos.
Em compensação, as velhinhas que fazem renda viram fio...
Fio, sim senhor!
Esses fios que vagam soltos no ar... que ninguém sabe de onde vêm... e se
Prendem num galho morto... no chapéu do viajante solitário... no freio do
Seu cavalo... que se prendem, desesperadamente, lábio fresco, numa
Trança ao vento...
E os velhos que mal podem acender os cigarros, os pobres velhinhos
Trêmulos viram reflexos...
Esses reflexos que dançam no ar... que nascem no ar...
De uma vidraça... de um pára-brisa... do galo do pára-raio que volteou
De súbito... de folhas que se assustam... de mariposas tontejando... de
Uma ronda infantil sob a lua redonda...

                                           XXXX

O Milagre

Dias maravilhosos em que jornais vêm cheios de
Poesia... e do lábio do amigo brotam palavras de eterno encanto...
Dias mágicos... em que os burgueses espiam,
Através das vidraças dos escritórios, a graça gratuita das nuvens...

Nenhum comentário:

Postar um comentário