Este canto é para todos os seres
A quem nunca foi oferecido um canto
E nem um canto para encostar e chorar,
Pois quem não chora não tem razão
Para cantar; este canto é um
Choro só, um chororô, um lamento,
Pois quem não é dono do vento,
Não tem motivo para cantar; quem não
Tem um morro, um monte, não tem
O que oferecer, pois quem não sai
Do rés do chão, não voa, não dá
Rasante, não faz um looping, um
Parafuso; não vence a força da
Gravidade, não voa de cabeça
Para baixo; ouça então este canto,
No coro triunfal da flora e da fauna,
Ouça então este canto que não
Tem em breviário, não existe
Em hinário e que compositor, por
Mais genial que seja, não conseguiu
Compor; é um canto feito só para
Quem sente dor, pois quem não sente
Dor, não consegue ouvi-lo; é um
Canto para os loucos das masmorras,
Não é para maluco beleza, é para
Os dementes dos calabouços, os esquecidos
Por Deus e seduzidos pelo demônio;
Este canto é para todos àqueles
Que não têm canção, não têm cantiga
E nem melodia e nem votos de
Felicidades; são para esses, este
Canto; tu já tens o teu canto,
Tens o teu santo e até o teu Deus; não
Ouvirás o canto que embala os Pirineus.
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