Repousa o mar imenso. Ele alteia e balança
As vagas em que o céu acende o seu clarão.
Derrama a luz da noite um mágico silêncio
No deslumbrante horror das águas, da amplidão.
Os dois abismos são um sorvedouro enorme,
De intenso resplendor, de paz e de tristeza:
Jazigo, catedral, ermo triste e sublime
Onde as constelações nos olham com firmeza.
Tais, o grandioso céu e as águas venerandas
Dormindo estão na luz e plena majestada,
Como se nunca até seu sonho colossal
Pudesse importunar a voz da humanidade
Esfaimado, porém, e envolto em rude pele,
O errante Malfeitor das estepes do mar,
Vem, vai, volta e, sentindo ao longe a solidão,
A maxla feroz descerra devagar.
Despreza, certamente, a imensidão azul
E as estrelas sem fim, no páramo distante:
O Cruzeiro do Sul ou o longo Escorpião
Que torce no infinito a cauda flamejante.
Sabe somente espedaçar e destruir,
E sempre acalentando o desejo sangrento,
No fundo dos golfões, em meio às águas turvas,
Passeia o seu olhar, inexpressivo e lento.
Silêncio e solidão. Nada, no fundo, à tona,
Que esteja vivo ou morto e chegue a seu alcance.
Parado, nada vê, nem o peixe pequeno
Que se achegue ligeiro e em seu dorso descanse.
Vai, monstro, vai! Não és diferente de nós,
Mais feio, mais cruel ou mais desesperado.
Sossega! Carne humana, amanhã, comerás
E, pelo homem, depois, tu serás devorado.
Eterno e justo crime é a Fome sacrossanta,
Da profundez do mar aos céus resplandecentes:
O homem e o tubarão, algoz ou condenado,
São, ó Morte, a teus pés, todos dois inocentes.
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