terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Antônio Nobre, À Lisboa das Naus, Cheia de Glória; BH, 0240102012.

Lisboa à beira-mar, cheia de vistas,
Ó Lisboa das meigas Procissões!
Ó Lisboa de Irmãs e de fadistas!
Ó Lisboa dos líricos pregões...
Lisboa com o Tejo das Conquistas,
Mais os ossos prováveis de Camões!
Ó Lisboa de mármore, Lisboa!
Quem nunca te viu, não viu coisa boa...

Ai canta, canta ao luar, minha guitarra,
A Lisboa dos Poetas Cavaleiros!
Galeras doidas  por soltar a amarra,
Cidades de morenos marinheiros,
Com navios entrando e saindo a barra
De proa para países estrangeiros!
Uns pra França, acenando Adeus! Adeus!
Outros pras Índias, outros... sabe-o Deus!

Ó Lisboa das ruas misteriosas!
Da Triste Feia, de João de Deus,
Beco da Índia, Rua das Fermosas,
Beco do Fala-Só (os versos meus...)
E outra rua que eu sei de duas Rosas,
Beco do Imaginário, dos Judeus,
Travessa (julgo eu) das Isabéis,
E outras mais que eu ignoro e vós sabeis.

Luar de Lisboa! aonde o há igual no Mundo?
Lembra leite a escorrer de tetas nuas!
Luar assim tão meigo, tão profundo,
Como a cair dum céu cheio de luas!
Não deixo de o beber nem um segundo,
Mal o vejo apontar por essas ruas...
Pregoeiro gentil lá grita a espaços:
"Vai alta a lua!" de Soares de Passos.

Formosa Sintra, onde, alto, as águias pairam,
Sintra das solidões! beijo da terra!
Sintra dos noivos, que ao luar desvairam,
Que vão fazer o seu ninho na serra.
Sintra do Mar! Sintra de Lord Byron,
Meu nobre camarada de Inglaterra!
Sintra dos Moiros, com os seus adarves,
E, ao longe, em frente, o Rei dos Algarves!

Ó Lisboa vermelha das toiradas!
Nadam no Ar amores e alegrias,
Vêde os Capinhas, os gentis Espadas,
Cavaleiros, fazendo cortesias...
Que graça ingênua! farpas enfeitadas!
O Povo, ao Sol, cheirando às maresias!
Vêde a alegria que lhe vai nas almas!
Vêde a branca Rainha, dando palmas!

Ó suaves mulheres do meu desejo,
Com mãos tão brancas feitas pra carícias!
Ondinas dos Galeões! Ninfas do Tejo!
Animaizinhos cheios de delícias...
Vosso passado quão longínquo o vejo!
Vós sois Árabes, Celtas e Fenícias!
Lisboa das Varinas e Marquesas...
Que bonitas que são as Portuguesas!

Senhoras! ainda sou menino e moço,
Mas amores não tenho nem carinhos!
Vida tão triste suportar não posso.
Vós que ides à novena, aos Inglesinhos,
Senhoras, rezai por mim um Padre-Nosso,
Nessa voz que tem beijos e é de arminhos.
Rezai por mim... Vereis... Vossos pecados
(Se acaso os tendes) vos serão perdoados.

Rezai, rezai, Senhoras, por aquele
Que no Mundo sofreu todas as dores!
Ódios, traições, torturas, - que sabe ele!
Perigos de água, e ferro e fogo, horrores!
E que, hoje, aqui está, só osso e pele,
À espera que o enterrem entre as flores...
Ouvi: estão os sinos a tocar.
Senhoras de Lisboa! ide rezar.

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