O milagre
II
Coda
A
palavra fez nascer vilas inteiras
magicamente
uma amendoeira
tornou-se
ela mesma um universo tão insondável
quanto
o olhar distante daquele
acaba
de divisar as bordas de Hades
mãe
generosa de suas entranhas
veio o
alimento
que
anestesiou aquela geração
canções
de protesto – a palavra me ensinou
orações
mecanicamente repetidas – a palavra me ensinou
verdades
incontestáveis
o
operário na cadeia
o
operário na cadeia de produção
“fiat
lux!” a sabedoria
a
máquina de cartão de crédito – senha “1984”
hiroshima
nagasaki fila do INSS
foi
assim
foi
assim que a palavra quase morreu
vieram
médicos paramédicos SAMU
padres
bispos filósofos vieram
vieram
deuses
veio deus
veio a
intolerância
a
palavra inventou a palavra solidão
moto
contínuo Pedra de Roseta
começa
e finda em si mesma
diz o
“You Tube”
a
palavra encerra
o fim
de todas as coisas
sustentar
a palavra
dói
tanto quanto o sol de verão
quando
entranha nos ossos
mítico/misterioso
ofício
como o
batismo da criança
da cria
um dia
andou sobre suas próprias pernas
duendes
saltitantes orfeus/eurídices
no
oriente falavam-se outras palavras
não era
o tempo de babel
hoje é
o tempo de babel
os
homens sabiam-se uns dos outros
os
homens não sabem uns dos outros
olham com
espanto o caleidoscópio
mistério
da vida
dizem
que a palavra voou
há
testemunhas desse momento
rumor
do vento monção
silenciosas
prisões
grilhões
quartos escuros
dias
sombrios
morre a
palavra
outro
ourives volta a ouvir seu silêncio
novas
chamas saltam
das
fricção das pedras.
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