quinta-feira, 3 de outubro de 2013

Enquanto respirais escrevo e o mundo vive e escrevo; BH, 0301002000; Publicado: BH, 0301002013.

Enquanto respirais escrevo e o mundo vive e escrevo,
O universo existe, escrevo, a humanidade se extermina,
Escrevo a letra, a palavra, a frase, o verso, a estrofe, o
Poema; e enquanto as bombas atômicas são construídas,
Escrevo, enquanto a guerra extermina palestinos, e israelenses,
A matar homens, crianças, e mulheres, escrevo; com a
Pobreza, a miséria, a desgraça, a destruição, a fome, a
Violência, e a injustiça, escrevo; às vezes nem sei o que,
Às vezes nem leio, e tenho até vergonha; não acredito, e
Não creio, o medo é maior, e a covardia maior ainda,
Porém, penso que tenho um consolo; tenho algo na
Frieza das trevas, um ponto na calota secular polar, e
Na composição do infinito iceberg: escrevo; e não me
Mantenho à tona, vou ao fundo, estou submerso,
Sufocado, e sem poder respirar; não ouço mais os
Cantos dos pássaros, esqueci das flores, das cores, e da
Luz, e sei que independente de tudo, o Sol nascerá,
E brilhará; a Lua aparecerá, e refletirá sobre nós a luz do
Sol, e tudo será eterno enquanto existirmos; pois as
Coisas mais insignificantes permanecem, enquanto viramos
Pó levado pelo vento na poeira; sei que não penso,
Escrevo, não existo, escrevo, não sou nada, e nunca
Serei nada, não quero ser nada, e me deixeis sozinho,
E só a não querer ser nada, e a não ser nada, escrevo;
E isto é só, isto sou eu, isto era eu, e isto será eu,
Quando meu esqueleto vier, se eu tiver esqueleto; não
Quero esquife, quando minhas carnes secarem, e
Desaparecerem, se é que tenho carnes; não quero
Privilégios, os privilégios serão dos vermes, eles que as
Revolverão na ânsia, na angústia da devoração; eles que
Serão meus roedores, as minhas traças, pois sou um
Alfarrábio, sou um livro velho, antigo; sou um manuscrito,
Um inútil fragmento de gente, um pergaminho que não
Carrega a verdade; um escrito vazio de realidade, e fora
Do tempo, fora da época, da ética, da razão, sou um
Documento na torre de Tombos, nos labirintos das mais
Espetaculares bibliotecas, nos recônditos da Velha Europa;
Da Grécia , do Japão, da China com seus bilhões de eus, e
Da Índia , Paquistão, Bangla Desh, e os segredos do Egito;
Dos Maias, dos Incas, dos Astecas, dos índios, dos africanos
Dos aborígenes, e de todos os povos mais antigos da Terra ;
Enquanto é feito um parto, escrevo, a mãe amamenta, o filho
Morre, escrevo; e a natureza, desconheço a natureza, o azul
Do céu, as nuvens, o ar, meus pulmões, escrevo; a chuva,
Da chuva, o arco-íris, o calango no muro, o besouro, a
Joaninha, a borboleta, escrevo; o quê sou eu? não sei
Responder, quem não sabe fica calado, não fala, escreve; e
Quem não existe, quem não tem, quem não é nada, a não
Ser sombra projetada, escreve na penumbra, no eclipse; na
Órbita, na trajetória da elipse, quem não deixa marcas, não
Ama, não beija, não goza, não tem orgasmo, clímax, e vive
Da timidez, escreve; pois não vive, não é o viver, não sabe
Viver, não sabe escrever, não respeita a escrita, o pensamento,
O espírito, a alma, a cova, a sepultura, o profano, o sagrado, o
Sepulcro; enquanto gira a roda, escrevo, e nem sei se escrevo;
Se sonho, se vivo, ou se tenho um pesadelo: estou vivo? ou
Aquele reflexo ali é só o meu cadáver? é só o meu baú do que
Sobrou com o que não escrevi? não sei responder, nunca soube
Responder nada; não sei a solução, nunca soube solucionar
Nada, nunca matei a vontade de nada; sou só assassino
Covarde, mórbido, e hediondo, sou só um matador da beleza,
Da literatura, e da poesia, e toda cadeia é pouca para mim nas prisões.

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