terça-feira, 20 de setembro de 2011

João Cabral de Melo Neto, Rubem Braga e o homem do Farol; BH, 0200902011.

É necessário vocação
Na carreira de faroleiro.
Consta do serviço civil,
Tem obrigação e direitos.
Porém não se entra nela como
Em qualquer outra profissão:
Entrar para ser faroleiro
É como entrar em religião.
É como entrar-se para a Igreja
Numa ordem contemplativa,
Pois no alto cargo se cavalgam
Vazios propícios à mística.
Na torre só, mais: isolado
De tudo o que faz transeunte,
Habita a linha de fronteira
Onde espaço e tempo se fundem.
O mar em volta do farol
É qual relógio sem ponteiros.
O faroleiro é só em si,
Sem companhia nem do espelho.
O faroleiro é como nu,
Ser devassado por janelas
Que o cercam de todos os lados
E para o nada sempre abertas,
Sobretudo para esse nada
Que há na fronteira espaço-tempo:  
O silêncio, que abafa como
Almofada de algodão denso.
Ora o nada aberto ao redor
Leva-o à posição uterina,
Fechando-o ainda mais em si,
Habitando a moela mais íntima,
Ora dissolve o faroleiro,
Que embora desperto se anula:
As vias da contemplação,
Qualquer das duas se quer, usa.
Rubem Braga uma vez tentou
Salvá-lo do não metafísico:
Foi visitar um faroleiro
Titular de uma ilha do Rio.
Rubem Braga logo decide:
Não é homem de introspecção.
Vê que precisa de diálogo
Esse afogado em tanto não.
De volta ao Rio, nos jornais,
Lança um apelo: que doassem
Vitrolas, rádios, qualquer voz
Ao navegante sem navegagens.

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