quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

José Saramago, Retrato do poeta quando jovem; BH, 0230202012.

Há na memória um rio onde navegam 
Os barcos da infância, em arcadas 
De ramos inquietos que despregam 
Sobre as águas as folhas recurvadas.
Há um bater de remos compassado 
No silêncio da lisa madrugada, 
Ondas brandas se afastam para o lado 
Com o rumor da seda amarrotada.
Há um nascer do sol no sítio exacto, 
À hora que mais conta duma vida, 
Um acordar dos olhos e do tacto, 
Um ansiar de sede inextinguida.
Há um retrato de água e de quebranto 
Que do fundo rompeu desta memória, 
E tudo quanto é rio abre no canto 
Que conta do retrato a velha história.

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