O universo está inadimplente
Comigo, o poema meu de cada dia, promete
Dar-me e está em falta comigo; e sabe
Que não sobrevivo sem uma obra-prima,
Sabe que não existo sem uma obra de arte e
De que tudo que necessito é de poesia pois,
Pão dá-me azia; pão deixa-me empanzinado,
Com a barriga cheia e a cabeça vazia; e
Cabeça vazia é vácuo, pobreza de ideia, falta
De inspiração, que fazem parar o coração; há
Os que vivem por dinheiro, por aparelhos,
Acoplados às máquinas, acorrentados aos
Sistemas dominadores, à falsa sociedade; há
Os que vivem pela hora da morte, com
Sangue nos olhos, aço no coração, pensam
Com o fígado e não se livram dos mais
Grotescos grilhões, que aprisionam o ser
Humano: a estupidez, a ignorância, a bizarrice
E a bisonhice e a escravidão hedionda; do
Universo espero as belas artes, o aprimoramento
Da essência, da percepção, dos sentidos, da
Razão; e como um banqueiro ficarei satisfeito
Sem ter um único tostão; e farei orações ao
Universo, como um devoto fiel, encherei páginas
E mais páginas de rezas e preces e quem passará
A ser inadimplente serei eu, por falta de
Agradecimentos; e no fim nós nos entenderemos,
Cantaremos umas canções, regozijaremos juntos,
Riremos como se tivéssemos bocas cheias de nacos
De carnes tenras assadas ao fogo brando e taças
Cheias de salivas e corizas de ninfas,
Ninfetas e ninfeias; e beberemos essas babas,
Como os índios bebem o cauim, feito da
Mandioca mastigada pelas meninas
Moças das aldeias e cuspida nos tachos
De fermentação e daremos glórias juntos.
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