Se há uma pessoa que tem medo
Do que escreve, sou eu, pois nunca sei
Se sou eu que escrevo, ou se escrevem
Por mim; seguro a pena, mas a mão
Que segura a pena, age como se não
Fosse minha, age como se não fosse
Eu que segurasse a pena; e não
Penso e nunca sei o que escrevo, e
Se escrevo, nunca sei o que penso;
Fantasmas saem do sobrenatural e
Vêm cochichar aos meus ouvidos
Seus delitos mais íntimos; almas
Chegam em ventanias, espíritos
Em redemoinhos, e sombras se movem
Nas névoas, depois nas salas, sentam-se
Nas cadeiras, deitam-se nos sofás, a
Quererm-me fazer de Freud; não
Dou ouvidos a mais ninguém,
Outros recantos há para soprar-vos
As vossas ladainhas, as vossas arengas
Sem nexos; não posso ficar a querer
Escrever, e ficar com medo do
Que possa aparecer; assombrações
Fora daqui, nada de oculto, e de
Esconde-esconde; nada de assustar
E de assombrar as pessoas atrás das
Portas, nas escadas, nos portais, nos
Escombros; recolher-me-ei à minha
Alcova solitária e fria, solitário;
Vinte para a meia-noite, não quero
Mais nada a não ser dormir a morte.
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