Vinte e dois
Amanhã farei
Vinte e dois anos de burrice
E farei amanhã
Vinte e dois anos de imundícies
E amanhã farei
Vinte e dois anos de carniça
Amanhã amanhecerei
Com vinte e dois anos sem razão
E vinte e dois anos sem causa
Vinte e dois anos
Sem nem vinte cruzeiros
Vinte e dois anos sem opinião
Vinte e dois anos de má digestão
E amanhã vomitarei
Vinte e dois anos sem paixão
E amanhã escalarei
Vinte e dois anos sem ser homem
Vinte e dois anos sem mulher
Vinte e dois anos sem ser gente
Vinte e dois anos apodrecidos
No tempo sem amor
Vinte e dois anos de doenças venéreas
Vinte e dois anos de porres cotidianos
Vinte e dois anos só a urinar
Vinte e dois anos só a retirar melecas do nariz
Vinte e dois anos só a expelir gases
Vinte e dois anos só a expelir fezes
Vinte e dois anos só a escarrar
Vinte e dois anos só a vomitar
Vinte e dois anos só a quebrar a cara
Vinte e dois anos só a entrar pelo cano
Vinte e dois anos sem dinheiro
Vinte e dois anos sem assistência
Vinte e dois anos sem compreensão
Vinte e dois anos só de números
Vinte e dois anos sem aclamação
Foi no dia dez de janeiro de mil
Novecentos e cinquenta e cinco
Que infelizmente nasci
E nem sei se nasci
E não sei de nada
Sei que se passaram os anos
Sei que se voaram os anos
E amanhã farei
Vinte e dois anos depressa
Não sei se faço
Estou em dúvidas
Amanhã farei
Vinte e dois anos sem vida
E amanhã farei
Vinte e dois anos sem fazer nada
Amanhã farei vinte e dois anos
Parabéns para mim?
Não é nada disso não
Pêsames para mim
Sentimentos para mim
Condolências para mim
Penas de mim
Lágrimas por mim
Amanhã farei
Vinte e dois anos.
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