terça-feira, 2 de outubro de 2018

Sinto a garganta dilacerada; Varanda da Marechal Marques Porto, 131; RJ/SD; Publicado: BH, 0130802012.

Sinto a garganta dilacerada
Cortada pela lâmina da faca
Sinto a frieza do aço
A se mexer na minha goela
Sinto o sangue escorrer
Quente úmido
Não sinto a dor do corte
Estou entorpecido
Meu esôfago foi arrancado
Por unhas sujas encardidas
Minha laringe minha glote
A faringe também
Foram lançadas na calçada
Uma posta só
De carne sangue nervos
A faca a se remexer
No corte do pescoço
A cabeça quase separada
Do restante do corpo
Quase decepada e por cair
Balançava atonitamente
Dum lado para outro
Não conseguia falar
O ar entrava desesperadamente
Pela cratera aberta
A me sufocar
Sangue ar faca
Sufocavam-me
Afobei-me
Os pulmões estouravam
Postei-me
Encostei a cabeça no cepo
A primeira paulada desceu
Pegou no meio da testa
Rachou o crânio até à base
A outra paulada pegou em cima da orelha
A esmigalhá-la a fazê-la em mil pedaços
Miolos pedaços do crânio
Ficaram espalhados rente ao cepo
Não sentia mais dor de cabeça
Sentia apenas um vazio
Um vazio de não poder sentir

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